O New York Yacht Club e a escuna America
Deslocando 170ton, a escuna americana venceu barco inglês de 47ton em 1851
José Campello

Quem vai para Nova York pensando em assunto de vela, deve contentar-se com histórias da áurea época dos ricaços proprietários de embarcações, seus desafios, suas ostentações, entre outros feitos, detentores da saga da America´s Cup. Resiste nos museus uma forte tradição de histórias de marinheiros orgulhosos do alcance de sua fama.

O advento da aviação, o apreender da utilização do espaço aéreo pelo homem deixou profundas marcas de esvaziamento no espaço marítimo, como verificamos no museu espacial de Washington, visitado posteriormente. O produto alavancador do crescimento foi radicalmente desviado de um meio de transporte para outro. Quanto maior o porto, maior a dor pela desativação e redirecionamento de seus equipamentos. Nova York não fugiu de suas conseqüências. Porém, nesta época já havia ocorrido a autofagia que a máquina a vapor impôs sobre a propulsão à vela dentro do mesmo segmento. Isto faz parte da saga da humanidade na sua trajetória de conquista do Universo com uso crescente de novas tecnologias. Coube ao esporte o papel de resgatar este prazer aprimorando arte e técnica otimizando cada vez mais o proveito desta manifestação espontânea da natureza.

Para se ter idéia, ficamos sabendo depois, o famoso New York Yatch Club fundado em 1844 a bordo de uma escuna, hoje possui sua sede próximo a Quinta Avenida, longe da água. Apesar de contar com sócios famosos no mundo, a sede é composta apenas da administração, museu, sala de modelos, biblioteca, ficando sem guarda de barcos nem trapiche. Seus sócios devem atracar seus barcos em outros clubes.

Entre as histórias do NYYC a mais famosa é da origem da America´s Cup que resumo abaixo:

Em 1851, o Sr.John Cox Stephens, comodoro do Yatch Club da cidade e representante das famílias bem sucedidas, empreendedoras de negócios, juntou-se a outros 5 amigos influentes visando desafiar a superioridade e tecnologia Inglesa espalhada aos 4 cantos do globo. Mandaram construir a escuna América de 170 tonelagem (a origem da palavra vem da capacidade de transportar tonéis de vinho) utilizando os melhores recursos e técnicas da época em nosso continente por US$ 20.000,00 (foto do museu). Após atravessarem o Atlântico apresentaram-se ao Royal Yatch Squadron, encabeçado pelo Lord Wilton em Coves na Inglaterra.

O desafio não tardou a aparecer envolvendo o contorno da ilha Wight. A premiação era uma taça de prata no valor de 100 Guinéus, que vem trocando de mãos apenas recentemente, hoje em poder da Suíça.

Apresentaram-se 14 dos mais modernos veleiros de diversos tamanhos tipos e tonelagens.

Após a largada, uma série de contratempos prejudicou os barcos ingleses, colisão, encalhes, calmaria, permitindo que o América no final vencesse com a diferença de apenas 8 minutos para um barco inglês de apenas 47 ton. Como não havia rating, a vitória não pode ser contestada.

De volta para a pátria com a mão na taça, o Sindicato determinou que a taça ficaria de posse transitória, podendo ser conquistada por qualquer desafiante.

Com a morte do idealizador Sr. John Cox Stephens seis anos após, o clube YCNY, remeteu correspondência aos principais clubes do mundo regulamentando o evento entre embarcações de 30 a 300 ton, dando início à saga da America´s Cup.

Dos desafiantes, um Inglês de nome Sir Thomas Lipton tentou incansavelmente através da série de embarcações construídas ao longo de 30 anos com o nome de Shamrock de 1 a 5 reaver o troféu, sem sucesso. O início destes desafios começou em 1899 e estenderam-se até o ano de 1930. Neste ano, justamente as regatas começaram a ser realizadas em Newport, quando Sir Thomas já tinha 80 anos e ainda persistia. Devido a isto após sua morte foi reconhecido pela sua tenacidade como o mais nobre de todos os desafiantes perdedores, até hoje.

A transferência da regata para Newport explica a existência do museu nesta cidade que abraçando a tradição dividida com o YCNY, passou a cultuar como amor estes barcos, justificando a existência de tantas jóias remanescentes destes desafios na região, adquiridas e mantidas por empresas ou particulares. Chegamos a conferir alguns deles por ocasião da visita (fotos). Os passeios turísticos na alta temporada são realizados sobre algumas destas preciosas embarcações em excelente estado de conservação.


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