Agulha
de alidade do Navio-Veleiro Cisne Branco
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04 Abr 2005
Recebi
uma ligação às 8h da manhã de um sábado.
Isso não se faz a quem é alérgico ao amanhecer.
Não conheço a pessoa nem imagino onde obteve o número
do meu celular. Era um visitante do site que queria informações
sobre declinação magnética e sobre que datum deveria
usar no GPS. Informar o datum por telefone é fácil, mas
falar sobre declinação magnética, não.
Considerando a mais
conhecida frase de Saint Exupéry*, aí
vai a abordagem prometida sobre declinação magnética.
GPS x Bússola
O GPS é um aparelho portátil, moderno e de baixo custo
que, recebendo dados de satélites, informa com boa precisão
as coordenadas da posição e indica rumos a seguir. Apesar
disso, hoje em dia a bússola é ainda largamente utilizada
na navegação. O uso da bússola implica compulsoriamente
no conhecimento da Declinação Magnética local.
É o que este artigo pretende abordar.
Quando a variação
varia
Via de regra a agulha da bússola não aponta para o
Norte porque sofre um desvio chamado Declinação Magnética.
Este desvio, que é um ângulo,
varia de um local para outro e, em geral, varia constantemente ao longo
do tempo. Segundo a carta 2109 da Marinha, de 1.990, a declinação
em Porto Alegre, por exemplo, é de 16º 30'W e aumenta 12
minutos/ano. Em parte do Nordeste brasileiro é 22º, mas
não varia com o tempo.
Quando um navegador
determina o rumo que deve navegar através da leitura de uma carta
náutica, não pode passar a orientar-se pela bússola
antes de considerar a declinação magnética. O rumo
lido na carta é o Rumo Verdadeiro, orientado pelo Norte Verdadeiro,
ou seja, pelo Pólo Norte. Este Norte, simplesmente indicado com
a letra N em qualquer mapa, não é o mesmo norte indicado
pela bússola, apesar das exceções.
Nivelando: Rumo é
a direção, em graus, do destino a seguir. Pode variar
de 0º a 359º. Rumo norte é 000º. Rumo leste é
090º, Rumo sul é 180º e Rumo oeste é 270º.
Completando-se os 360º da rosa dos ventos chegamos ao 0º novamente.
Veja a rosa dos ventos mais abaixo.
Distorções
Para utilizar-se a bússola, o Rumo Verdadeiro precisa ser convertido
em Rumo Magnético, que é regido pelo Norte Magnético, e que não
está exatamente no pólo Norte. E só a título
de curiosidade, saiba que o Norte Magnético "anda".
Mas estas diferenças entre o Norte verdadeiro e o magnético
não são relevantes.
O mais importante é que a indicação da bússola
sofre influências magnéticas diferentes de um lugar para
outro e estão sempre variando ao longo do tempo. Esta variação
ou defasagem é a Declinação Magnética (DM),
que pode ser positiva ou negativa. Ela é positiva quando a agulha
é desviada para Leste, e negativa quando a agulha aponta mais
a Oeste, como no Brasil. Mas isso pode confundir. Recomendo que esqueça
isso de desvio pra cá e desvio pra lá. Volto a falar nisso
especificamente, logo adiante.
A Declinação Magnética no planeta
A
faixa branca, p. exemplo, indica que a DM varia de 20ºW a 30ºW
Utilização
da Declinação Magnética
O valor da declinação magnética pode ser relevante
na conversão de rumos verdadeiros em rumos magnéticos,
e vice-versa. Desconhecendo-se o valor da DM, podemos cometer erros
grosseiros de navegação.
A equação
simplificada para conversão de rumos, para uso no Brasil, é:
RM
= RV + DM**
|
RV = RM
- DM
|
RM = Rumo Magnético;
RV = Rumo Verdadeiro; DM = Declinação Magnética.
Válido para declinações Oeste, como ocorre em todo
o Brasil. Se a DM fosse leste, seria RM=RV-DM**
Exemplo: Vê-se
na carta náutica que o ponto que se quer alcançar está
no rumo verdadeiro de 45º. Que rumo deverá ser perseguido
ao utilizar-se a bússola, sabendo-se que a DM na região
é de 16ºW?
Para manter um rumo verdadeiro de 45º com uma declinação
de 16ºW é preciso seguir um Rumo Magnético de 61º
(45 + 16). Seguindo-se o RM 61, na verdade se está em um rumo
45 (RV).
Obs.: caso a soma de RV + DM seja superior a 360, diminua
360: Ex.: sendo RV=350º e DM=20º (370º - 360º) RM=10º.
Esqueça
isso de "mais à direita" ou "mais à esquerda"
A declinação pode ser Leste ou Oeste, como vimos. Não associe Oeste à esquerda e Leste à direita.
Não pense que a declinação vai jogar o rumo "mais
pra esquerda" ou "mais para a direita", porque isso vai
dar confusão. Porque a declinação é Oeste, não quer dizer que vai puxar a agulha para Oeste ou para
Leste: se o rumo for 20º, p.ex., somando-se uma declinação
qualquer, o novo rumo vai apontar mais para Leste ("mais à
direita"). Já se o rumo for de 200º, somando a DM vai
indicar mais a Oeste ("mais à esquerda"). Pense matematicamente,
portanto. Pense na adição apenas.
"Adiantando
o relógio"
Mas se insistir mesmo em associar com algo visual, pense que acrescentar
a DM ao RV é como adiantar o ponteiro do relógio (agulha).
Adianta-se o ponteiro girando-o no sentido horário. É
isso que se faz com a agulha ao acrescentar a DM ao RV (no Brasil!).
Rumo Magnético é o Rumo Verdadeiro "adiantado".
Pense rápido: O navegador lá dentro da cabine, cheirando
a neurônio queimado, grita: RV30. Você lá no timão
sabe que a declinação é 15. Você dá
leme até a bússola marcar quanto? (1)
Linhas Isogônicas
Assim como as curvas de nível unem pontos de mesma altura, e
as linhas isobatimétricas unem os pontos de mesma profundidade,
as linhas isogônicas interligam pontos de mesma declinação
magnética. Talvez esta tenha sido a primeira e a última
vez na vida que V. leu algo sobre linha isogônica. Guarde-a em
sua memória junto ao logaritmo neperiano, aos protozoários
flagelados e aos afluentes
do Amazonas.
Linhas
de mesma declinação magnética são chamadas
Isogônicas
No
Golfo do México a declinação varia de +6 a -3º,
contendo assim a linha de declinação zero.
Isso significa que ali, dependendo da longitude, soma-se ou subtrai-se
a DM.
Determinando a
Declinação
O
Comandante Geraldo Knippling obtém a declinação
magnética do local, no momento, diretamente do GPS, dispensando
a verificação na carta e o cálculo para atualizar
a declinação publicada.
As cartas náuticas
costumam apresentar informações sobre a Declinação
Magnética na Rosa dos Ventos.
No exemplo ao lado (carta
2109 de 1.990), em 1985 a declinação era de 12º 30'W
e o aumento é de 12 minutos por ano.
Como estamos em 2005, precisamos
somar 240' (20anos X 12'/ano), ou seja 4º (240' / 60'). Considera-se
portanto a Declinação na região da carta (de Porto
Alegre) como sendo 16º 30' W (12º 30' + 4º).
Discrepâncias
Nas informações gráficas apresentadas mais
abaixo nesta página, coletadas do site de um Instituto de Meteorologia
da Finlândia, vê-se que há discordância de
valores em relação à carta da Marinha do Brasil.
Meu GPS informa que a DM de P. Alegre é 15º (não
informa casas decimais). Sigo o Mestre, preferindo utilizar a informação
do GPS.
Erro apreciável
Para ter uma noção do que significa desconsiderar
uma declinação magnética de 14º (como na Lagoa
dos Patos), observe na ilustração abaixo, a título
de exemplo, o resultado aproximado após percorrer 30mn.
Aferição
A bússola pode apresentar informações imprecisas
devido à proximidade de peças de ferro a bordo, devendo ser aferida quando da sua instalação.
Dentro do piloto automático há uma bússola, sob
forma de chip eletrônico. No piloto automático para roda
de leme, a bússola que o controla pode ficar longe do leme, como
dentro da cabine. Me contou um comandante amigo, que meses depois da
instalação do piloto, mandou instalar um CD player e caixas
de som. Custou muito a descobrir porque o piloto não funcionava
mais direito. Uma caixa de som foi fixada ao lado da bússola
do piloto e o imã do autofalante a desviava.
O Comandante Geraldo
Knippling contou uma história interessante na navegada ao Porto
do Barquinho, mostrando como uma lata de Coca-Cola bagunçou o
rumo, anos atrás. Veja em Navegando
com o Mestre, no sub-título Histórias
do mestre.
Cristóvão
Colombo
A declinação magnética teria sido descoberta por
Cristóvão Colombo, ao perceber em suas navegadas que a
agulha nem sempre apontava para a Estrela Polar, que sempre está
muito próxima do Norte.
Invenção
da bússola
Considerada a invenção tecnológica mais importante
depois da roda, a bússola foi inventada na China, no século
I, e aperfeiçoada para a navegação na Europa no
século XIII, permitindo a descoberta do caminho marítimo
para as Índias. Até então a sondagem de profundidade
e a observação astronômica eram utilizadas na determinação
dos rumos. A bússola giroscópica foi inventada por um
americano.
Comentários
do Mestre
Velejando com o Mestre Knippling, ídolo dos navegadores gaúchos,
observei que utiliza Rumos Magnéticos em vez dos verdadeiros.
Sempre que ele se refere a um rumo, cita as letras RM antes. Por exemplo,
RM173º. Geraldo Knippling, que voou 40.000 horas no comando de
aviões da Varig mundo afora, e foi agraciado com a Ordem do Mérito
da Aeronáutica, sabe muito bem o que diz.
Um GPS pode ser configurado
para apresentar rumos verdadeiros ou magnéticos. O GPS do Mestre
mostra rumos magnéticos. E ele explica o porquê:
Rumos magnéticos
no GPS
Pessoalmente,
argumento o seguinte, em favor do uso de rumos magnéticos no
GPS, quando navegando: Infelizmente os rumos que usamos nas nossas bússolas
são magnéticos.
É
mais fácil e lógico, ao consultarmos os rumos para navegação
ou mesmo quando seguindo uma rota com vários waypoints inseridos
no aparelho, que estes rumos sejam compatíveis com a bússola
que nos orienta. Em outras palavras, as informações de
rumo do GPS podem ser diretamente aplicadas à bússola,
sem a necessidade de considerar a declinação e fazer um
cálculo intermediário para então ser aplicado.
Na
hora de um "sufoco" o cidadão está sujeito a
esquecer de fazer a correção. É assim na Aeronáutica
em todo o mundo. Também a Marinha moderna está seguindo
este esquema. Antigamente, no tempo da navegação astronômica,
tudo se desenrolava vagarosamente e não fazia diferença
trabalhar com rumos verdadeiros, considerando a declinação
mais tarde.
Todas
as cartas da Aeronáutica usadas em todo o mundo (Jeppsen, por
exemplo), são em rumos magnéticos. Uma aeronave ou mesmo
uma lancha fazendo uma aproximação ou mesmo navegando
numa rota onde os waypoints se sucedem rapidamente, consultando a carta
continuamente, não pode assumir o risco de ter que fazer uma
interpretação momentânea entre rumos verdadeiros
ou magnéticos. O piloto ou navegador quer aplicar na bússola
aquilo que está vendo na carta no momento.
Nas
nossas cartas da Marinha os rumos são verdadeiros porque são
de séculos passados. Não havia GPS nem bússolas
de precisão.
Isto tudo poderia ser diferente se tivéssemos uma bússola
em rumos verdadeiros, que já existe: é acoplada ao GPS
e a um giroscópio, mas está fora do nosso alcance no momento.
Bússola
do GPS
Usando a "bússola" do GPS, tanto em rumo verdadeiro
quanto em rumo magnético, acontece o seguinte:
Na navegação, qualquer navegação, que implique
em manter, corrigir ou mudar um determinado rumo, o navegador observa
atentamente a bússola, que lhe dá uma indicação
imediata da modificação que houve ou está havendo
no rumo. Se por exemplo deseja ir do rumo 80° ao rumo 60° aplica
o leme para a esquerda e quando vai chegando no rumo desejado de 60°
desfaz a deflexão do leme e segue em frente. Muito simples.
No caso de usar a bússola do GPS, acontece que esta (nos nossos
GPSs) não dá uma indicação imediata. A mudança
no rumo é computada e apresentada segundos mais tarde. Quando
o cidadão aplica o leme, inicialmente nada acontece no GPS e
a tendência é aplicar mais leme. Mas o barco já
estava mudando de rumo desde o início e já estará
lá pelo rumo 20° quando a bússola do GPS apresentar
nova indicação. A esta altura o cidadão xinga o
GPS e faz uma violenta correção para o outro lado e nunca
mais se acerta. A não ser que tenha a calma necessária
para manter um rumo fixo por algum tempo e daí, em pequenos incrementos,
fazer pequenas correções, de tempo em tempo, para voltar
ao rumo desejado.
Em outras palavras: a "bússola" do GPS é muito
útil para indicar uma direção. Pode ser usada como
um gônio, mas jamais como substituta da bússola magnética.
Aliás, isto é verdadeiro para todas as funções
do GPS. As indicações são em raw data e
sempre apresentadas com algum retardo que precisa ser considerado.
Geraldo.
-o-
A Declinação Magnética no Brasil
Na
região costeira do Brasil, a declinação magnética
varia de -12º na Lagoa Mirim, a -24º no litoral da Bahia.
Variação
da Declinação Magnética ao longo do tempo
(em graus por ano)
Para desenhar outros
gráficos como estes:
http://www.ava.fmi.fi/MAGN/igrf/applet.html
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