Quase R$1 bilhão para melhorar a água do Rio Guaíba
Projeto foi apresentado na Sociedade de Engenharia do RS
Danilo Chagas Ribeiro

24 Jul 2009
Na noite desta quinta-feira, 23 de julho de 2009, quando a temperatura em Porto Alegre caiu para 5ºC, o Engº José Homero Finamor Pinto fez o ambiente esquentar na Sociedade de Engenharia do RGS. Engenheiro da CORSAN, membro da Câmara Especializada de Engenharia Civil do CREA-RS, e expert em abastecimento de água e saneamento, Finamor apresentou dados sobre a região metropolitana de Porto Alegre e descreveu o Projeto PISA, a ser implantado na capital gaúcha pelo DMAE - Departamento Municipal de Águas e Esgoto de Porto Alegre. Trata-se de uma grande obra, orçada em 850 milhões de reais, que aumentará a capacidade de tratamento do esgoto de Porto Alegre de 27 para 77%, daqui a 2 anos.

Década do Esgoto
Nos últimos governos da Prefeitura de Porto Alegre, nenhum centavo foi investido em saneamento.
Como é que, de repente, aparece quase 1 bilhão de reais para investir em tratamento de esgoto? "Estamos na década do esgoto", respondeu Finamor. O súbito direcionamento das linhas de financiamento para saneamento tem ocorrido em virtude da pressão ambiental.

Alguns dados apresentados causaram grande espanto na platéia formada, na maioria, por velejadores do Rio Guaíba. O engº Finamor foi sabatinado com questões diversas, tendo respondido a todas com muita firmeza e muita paciência.
Do total de quase 1 milhão de economias (moradias) da região metropolitana de Porto Alegre, apenas 224 mil têm esgoto tratado. O resto vai in natura  para o Guaíba. O mais impressionante disso é que um considerável número dessas economias têm rede de esgoto passando na frente. A rede não é utilizada porque representaria um aumento de aproximadamente R$20 na conta mensal dos proprietários. A concessionária de saneamento não tem poder para obrigar a instalação do esgoto. Segundo Finamor, é necessário que o Ministério Público manifeste-se, propondo ação penal de crime ambiental. Só assim as economias serão ligadas à rede de esgoto.

4,5 milhões de litros de esgoto por segundo
Das quase 600 mil economias de Porto Alegre, aproximadamente 160 mil têm esgoto tratado. Engana-se redondamente quem pensar que as mais de 400.000 economias que têm seus esgotos jogados diretamente no Guaíba estão na periferia. Este esgoto vem dos bairros mais movimentados da cidade. São 4,5 milhões de litros de esgoto por segundo jogados no rio sem tratamento algum. Em torno de 40% desta vazão é jogado na Ponta da Cadeia, nas proximidades da Usina do Gasômetro. O resto alcança o rio através do Arroio Dilúvio e de outros pontos.

Como o projeto PISA reduzirá o volume de esgoto, de 4,5 para 1,7 milhões de litros por segundo?
Partindo da Ponta da Cadeia, uma tubulação subterrânea com 1,6m de diâmetro interno será implantada na cidade, indo até as proximidades do portão do hipódromo, na av. Diário de Notícias, bairro Cristal. No outro lado da avenida, próximo à margem do rio, será construída uma estação que bombeará o esgoto através de tubulação sob o leito do Guaíba (veja croquis ao lado) até uma Estação de Tratamento de Esgoto (ETE), a ser construída no bairro Serraria, na zona sul de Porto Alegre.

"Almoxarifado Flutuante"
Entre a preparação e o posicionamento efetivo do emissário subaquático de aproximadamente 10km de extensão, poderá decorrer em torno de um ano de obras no rio. O emissário será montado com tubulações de PEAD, um tipo de plástico, com 170m de comprimento, 1,8m de diâmetro externo e 10cm de parede. Os tubos serão unidos de 3 em 3, formando tramos de 500m. A montagem dos tramps se dará na costa norte da Ponta Grossa, nas proximidades do "Tranquilo", em um "Almoxarifado Flutuante" apoitado no rio (imagem abaixo). Os tramos serão arranjados em formações de 2.000m de extensão e levados para a posição por rebocadores de 500HP. Para evitar que as tubulações flutuem, "poitas" no formato de braçadeiras, pesando 5 toneladas cada uma, serão posicionadas ao longo da tubulação, a cada 5m.
As tubulações com 2km de extensão serão baixadas até a posição definitiva através da abertura de válvulas nas extremidades tamponadas. Na medida em que o ar for sendo expulso pela água, a tubulação irá mergulhando no rio. Uma draga abrirá um canal de forma que o emissário seja posicionado a 1 metro abaixo do leito do rio.

Obra histórica
A execução desta obra será uma façanha memorável da Prefeitura Municipal de Porto Alegre e do DMAE, trazendo significativos benefícios ambientais, especialmente ao Rio Guaíba e, por tabela, aos navegadores. A magnitude dos benefícios com certeza compensará os eventuais transtornos provenientes de uma obra deste porte.

Questionamento e histórico das obras do DMAE no Guaíba
A implantação de um emissário sob o leito de um curso d'água não é novidade tecnológica. É tecnologia dominada. No entanto, as obras executadas pelo DMAE no Rio Guaíba nos últimos anos têm deixado a desejar, se não pelo risco que representam à navegação de recreio, pela sinalização aquaviária extremamente precária. As bóias utilizadas na sinalização da adutora implantada em frente ao Veleiros do Sul, é um exemplo. Das 3 bóias que demarcam a adutora, duas são minúsculas. A bóia plástica que sinaliza a torre submersa na extremidade da adutora já garrou mais de uma vez por falha de fixação adequada à poita. Em uma das vezes, apareceu encalhada nos molhes do Iate Clube Guaíba após vento um pouco mais forte do quadrante Oeste. Nenhuma das bóias foi refletorizada. A refletorização existente atualmente foi executada por navegadores.

Na verdade, a má sinalização é apenas um apêndice diante do incoerente projeto que cravou a torre submersa com o topo quase aflorando quando o rio está baixo. Isto representa um seríssimo obstáculo à navegação de recreio, trazendo risco enorme ao tráfego aquaviário, principalmente das lanchas. Não é porque a adutora beneficia a população de todo um bairro, que se justifica a execução de uma obra sem o mínimo respeito ao tráfego. Mas uma vez consumado o projeto infeliz, no mínimo deveria ser implantada uma bóia luminosa nas dimensões das bóias comumente utilizadas no Rio Guaíba. A situação precária em que se encontra a sinalização da torre é de total irresponsabilidade. Se uma lancha abalroar a torre em velocidade de cruzeiro, a ocorrência de acidente com vítimas fatais não será nenhuma surpresa. Em caso de deficiência de sinalização, seja por a bóia ter garrado, ou à noite, por não ser luminosa, o abalroamento ao obstáculo submerso poderá fazer naufragar uma lancha. A sinalização, como está, é, no mínimo, inconsequente.

A bóia que sinaliza a extremidade da tubulação nas proximidades da Ponta do Arado Velho é outra irresponsabilidade do DMAE. Além de minúscula, a bóia lá implantada tem no tope o tradicional "X" indicando "Perigo Isolado". Por ser minúscula, um mínimo de vento faz a bóia balançar tanto, que o tope com as lâminas projeta-se para os lados freneticamente, oferecendo grande risco de perfuração do casco de embarcações. A bóia é praticamente imperceptível quando o rio faz ondas. À noite, então, a bóia é uma verdadeira armadilha. A tal "foice no escuro" já causou acidentes.

Tanto na implantação da tubulação em frente ao Veleiros do Sul quanto na da Ponta do Arado Velho, houve erros de execução. Poucas semanas após a implantação, parte da tubulação (nas duas obras) apareceu à deriva no Guaíba, representando perigosos obstáculos à navegação. Apenas uma pequena parte da tubulação à deriva podia ser avistada sobre a superfície do rio. Segundo informou um dos presentes à apresentação, a adutora em frente ao Veleiros do Sul estava apoitada e enterrada sob o leito do Guaíba, e mesmo assim apareceu boiando.

Isso posto, são pertinentes as preocupações manifestadas pelos presentes quanto à realização da obra do PISA pelo DMAE:

- Sinalização adequada da obra, com bóias luminosas, no tamanho padrão do canal de navegação do Guaíba.

- Condições de acesso aos clubes náuticos durante a realização da obra.

- Espalhamento do material dragado para a implantação do emissário, evitando elevações submersas que poderão causar encalhes de veleiros, como ocorre em alguns pontos junto à borda do canal de navegação do Guaíba. A draga deve depositar o material dragado em regiões de maior profundidade nas imediações da obra, e não a uma mesma distância da vala aberta, para evitar a formação de obstruções submersas.

- Terá o DMAE condições de fiscalizar a empreiteira executora da obra?

- Estará a Marinha ciente do projeto?

Créditos e agradecimentos
A apresentação promovida pelo Popa.com.br foi proposta pelo Comandante Jorge Albrecht Filho (foto acima), coordenador da Câmara Especializada de Engenharia Civil do CREA-RS, e acolhida pela Sociedade de Engenharia do RGS, presidida pelo Comandante Cylon Rosa Neto.

Parabéns ao Engº José Homero Finamor Pinto pela apresentação impecável, e pela forma serena com que soube conduzir a apresentação durante duas horas, crivada de perguntas e de comentários de uma platéia eclética, crítica e muito ansiosa.

O Popa.com.br agradece aos participantes que prestigiaram o evento, ao Engº Finamor, ao Comandante Engº Jorge Albrecht Filho, pela bela iniciativa da apresentação, e ao Comandante Engº Cylon Rosa Neto, Presidente da Sociedade de Engenharia do RGS, pela calorosa acolhida com fogo na lareira. Agradecimentos também ao CREA/RS pelo empréstimo do equipamento necessário à apresentação.

Programa Integrado Socioambiental - PISA

Comentários recebidos:

28 Jul 2009
Tau Golin

Parabéns Danilo por fazer-nos entender a complexidade do "projeto".
Apenas uma frase: "vai ser o caos!"
O papel aceita tudo. Imaginem uma obra desta abandonada, ou sem manutenção, posteriormente.
Se o critério for proteger o meio ambiente e manter o Guaíba preservado para obras futuras vocacionadas ao rio, será um desastre.
A tendência é inutilizar a área entre a tubulação e a costa. O Guaíba vai diminuir, de novo...
Alguém poderia informar qual o lado da tubulação que vai assorear...
[Popa]: Tau, segundo informações recebidas na Apresentação, o emissário será posicionado 1 metro abaixo do leito. Será que mesmo assim vai gerar assoreamento?

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