Pão pra casa
Nem o barco é mais importante do que a parceria para navegar
Danilo Chagas Ribeiro
21 Nov 2009
Oito velejadores reuniram-se em uma noite de primavera para comemorar a passagem de um amigo por Porto Alegre. A maioria era de gente engravidada, ou pela Brahma ou pela Antártica.
Pão com alho, licorosa da Pharmacia Riacho Doce, linguiça calabreza da Borrússia, chopp da Heineken e carne gorda compunham a faina proposta.
Esses jaguaras se conhecem há muito tempo. Uns já desde criança. Outros de nem tanto. Foram chegando e começando a prosear e a rir espontaneamente, como sempre.
Apesar do que comem e bebem, esses encontros não podem ser mais saudáveis. Contam causos, relembram velhas histórias, dão notícias, comentam. Perguntam pelos que não vieram. Fazem planos e combinam velejadas.
Têm o mesmo nível de maturidade, e as idades são parecidas. Idade da sutileza. Da cumplicidade e da moderação. Todos são velejadores ativos.
Alguns já fizeram longas travessias.
O tema principal das conversas, claro, é vela de cruzeiro.
Uma bendita auto-censura em comum: não tentam consertar o país com o copo na mão.
Dão muitas risadas
Às vezes cantam toadas
A tônica é sempre a alegria
Azar da psiquiatria
Lá pelas tantas, um celular tocou. Era de casa. Um pedido pra comprar pão quando ele saisse de lá.
Mas sem pressão de horário.
Sem o que?...
Supermercado tem hora pra fechar.
Estratégia conhecida? Truque antigo?
Quem sabe alguém pensando precavidamente em coisas básicas para o dia de amanhã. Não cabe julgar.
Esta não foi a primeira vez que o telefone tentou arrancar alguém das risadas, mas marcou.
Logo que o assunto da ligação foi conhecido, o anfitrião foi à cozinha sem dizer nada, e voltou com um pacote de pães. Entregou sem fazer alarde. Foi tão discreto, que nem todos perceberam o feito.
Muito mais do que pão, era um convite para o amigo ficar até um pouco mais tarde.
Um gesto bonito.
Uma camaradagem.
O foco nos amigos.
Pão que não tem preço.
Pequenas coisas tão grandiosas.
Nem o barco é mais importante do que a parceria para navegar.
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Comentários recebidos
21 Nov 2009
luiz morandi
Danilo. Uma boa prosa, uma boa mesa são prioridades de bons amigos.
Os pães são realmente a prova da cumplicidade.
Abraço aos confrades.
Luiz
Chamonix
21 Nov 2009
Arilson Schwonke
Quando estive morando em Buenos Aires, aprendi, entre tantas outras que "DEVEMOS TER UM GRUPO DE PERTENENCIA", agora quanto mais passa o tempo, compreendo a importância da frase, pertenço a um Mundo de Velejadores. Assim procuro me conduzir como um deles ser aceito ou criticado, mas sempre acolhido, amparado... Os barcos são nosso elo de identificação, adorados pelo que são, e mais ainda pela companhia que nos proporcionam...
Arilson Schwonke
21 Nov 2009
Guto Vieira da Fonseca
Querido Amigo Dr.Arilson, meu psiquiatra predileto, concordo plenamente e diria mais:
"NUNCA FIZ AMIGOS TOMANDO LEITE"
Bons Ventos !!!
Guto
21 Nov 2009
Paulo Silveira
Ë por isto que são Jaguaras de primeira categoria. Companheiro é companheiro......
22 Nov 2009
Nelson
Bonita crônica Danilo.
22 Nov 2009
Emilio
Estes jaguaras são "Os Jaguaras" que eu conheço e admiro.
E mais, são todos Jaguaras com velas.
23 Nov 2009
Gustavo Geyer
Sim, isso é o mais importante num grupo de amigos, a camaradagem, o companheirismo, a informalidade. Nós, dos caiaques, somos como vcs da vela, apenas mudamos o tipo de embarcação, mas a bagunça, as piadas, os churrascos são todos iguais, motivados por alegria e aquela vontade louca de estar entre amigos que partilham a mesma paixão por navegar, seja ela de veleiro, de caiaque, de lancha, de canoa ou de....
23 Nov 2009
Marcio Carlos Poisl
não conheço ninguem, mas li e achei o máximo, sou velejador sem barco e sem vela, moro em cima da serra (são chico), tive um lago a muito tempo, lá naveguei com om leisersinho, pra brincar.. e vi que é bom, senti o vento, e peguei ele na mão... bha, como seria bom pegar ele denovo... feliz voces, comendo esta carne gorda e a cervejinha,.. abraço gente boa...
23 Nov 2009
renato fernandes
A palavra companheiro veio do latim vulgar companio, que nasceu do latim
clássico cum, "com", e panis, "pão". Portanto, companheiro é aquele que divide conosco o pão.
25 Nov 2009
Fernando Maciel
"Amigo é coisa pra se guardar...".
Já dizia o poeta. Maravilhoso texto mestre Danilo.
Abraços a todos os nossos amigos.
Fernando Maciel
Veleiro Planeta Água
26 Nov 2009
Eduardo Fattore
Bela crônica Danilo. Remete a lembranças especiais. Assim como o amigo lá de São Chico, também sou velejador sem vela, a muito tempo na região das Missões, navegando na lembrança de inesquecíveis velejadas no Guaíba na companhia do grande amigo Comparsi, parceria dos tempos do Projeto Rondon. Abraço a todos.
11 Fev 2010
Andreas
...o pão nosso de cada dia nos dá hoje... com churrasco e cerveja. Hummm... acho que Jesus velejava. Abraço, parceirada amiga.
Andreas / Canibal
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