Navegando de Brasília a Buenos Aires
De caiaque
André Issi

Diário a partir de Brasília, até Assunção


Sucuri ao lado do Caiaque

Aqueles que estão nela considero meus amigos e por isto quero dividir com voces as emoções de uma aventura pelo interior de nossa America.Como já não estou mais 0 km e cheio de fraturas, hernia de disco e pedras no rim não posso garantir que vou longe, pois essa aventura pode durar apenas um dia ou seis meses.O plano é sair de Brasília pelo rio S. Bartolomeu, que não tenho a mínima idéia de como é, se tem corredeiras, cachoeiras, cobras ou lagartos.Para complicar, seguirei com um caiaque de 5,20 m, imprópio para corredeiras, aliado ao fato de mais uns 40 kg de carga, o que vai impossibilitar o transporte por terra, então terei que me virar fazendo rapel e cruzando os obstáculos como puder à medida que surgirem.Bueno, eu só queria dividir as alegrias e as tristezas com vocês.Dia 16/06 estarei seguindo 1700km até Brasilia com o Aldo e talvez com o Robson e dali inicia mais uma aventura entre tantas outras.Acho que nosso destino já vem escrito e por isto o nome do barco ficou sendo MAKTUB (já estava escrito, em árabe).Serão 3.555 km até B.Aires pela bacia do R. Paraná e Prata; dali mais de 1.500 km pelos mares do sul até Porto Alegre e dali para Florianopolis, um total de mais de 5.000 km.Tem tudo para dar errado, as cachoeiras, corredeiras, represas, doenças, cobras venenosas, sucuris, jacarés e piranhas, além de traficantes e ladrões.Depois de tudo isto terei o mar gelado do sul e as ondas onde terei meu batismo pois nunca naveguei pelo mar com este caiaque argentino, dos meus "irmãos" de Rosário.Acontece que as pessoas idealizam sonhos, correm atrás de horizontes e se tornam infelizes se abdicam das coisas sem tentar.Eu sou apenas mais um, se não der, paciência!Bueno, se eu estiver realizando o sonho de alguém e conseguir transmitir um pouco de luz no dia a dia dos que ficam, terá valido a pena.Um abraço forte a todos e espero que voltemos a nos rever além de terras e através do sempre.Hasta la vista.

Olá amigos, estou em Pires do Rio, Goias. Parece que passou um mes, estou cheio de cortes, contusôes, o caiaque está todo trincado, arranhado, de leme partido mas eu ainda nâo entreguei os pontos. Como se diz lá no Rio Grande " não está morto quem peleia ". Eu quase morri por tres vezes, a primeira quando quase cai em uma cachoeira depois de uma curva de rio, a segunda quando o caiaque, ao descer em uma forte corredeira não fez a curva e sumiu por baixo de uma rocha comigo junto.Tu fica preso nele de cabeça para baixo com a violenta turbulência desorientando tentando achar a alça que te libera do caiaque, descobrir para que lado fica a superfície e tirar tu e o caiaque das pedras.A pior foi a terceira quando entrei em um longo canyon de uns quatro metros de largura e o caiaque entrou de lado nas rochas negras e virou.Puxei a alça, ejetei do caiaque e fui sugado pelo redemoinho e fiquei girando como um louco com colete e tudo sem saber para que lado ficava a superfície. Os pulmões pareciam estourar e só pensava:- Vou morrer, vou morrer!Quando tudo parecia perdido fui levado para a superfície onde respirei e mergulhava de novo quando meu braço esquerdo encontrou o caiaque enquanto o redemoinho nos levava de volta para o lugar onde afundara.Chutei as rochas com força para sair dali e depois fomos arrastados até chegar em um remanso.Teve outra corredeira em que fui rolando nas rochas virando um monte e batendo nas pedras por cerca de trezentos metros.O rio São Bartolomeu quase me matou por tres vezes mas o máximo que ele fez foi roubar minha auto confiança.É um rio que ainda tem sucuris, mas não vi nenhuma. Apenas capivaras, ariranhas e tucanos, entre outros bichos.Estou com um arsenal de punhais nos antebraços, facas e facões na coberta do caiaque. Sucuri nenhuma vai me pegar sem levar o troco.Passei por inúmeras situações de perigo real, não tem como recuar.Aprendi a pedir a Deus para me ajudar a cada corredeira mais violenta que tenho que enfrentar.Passei por muitas balsas que retiram água do rio para os Garimpos.O rio São Bartolomeu foi uma corredeira só, muitos perigos, na Garganta do Diabo dei de cara numa rocha e jogou a cabeça para trás, acho que ali foi o início do problema pelo qual vou fazer uma radiografia daqui a pouco no hospital da cidade.Estou detonado mas não estou morto, como diziam no filme Gladiador:- " Ainda não é a hora"! Depois de seis dias cheguei no Rio Corumbá, logo ao lado de um imenso viaduto de trem.Saldo até aqui: diveras escoriações nas mãos, "ovos" nas canelas, panturrilha da perna direita e nas costas.Caiaque: várias trincas no casco, leme despedaçado, inúmeros riscos nas rochas mas ele é valente acima de tudo, até agora não está fazendo água.Ele é um caiaque oceânico, de 5,20 m de comprimento, difícilimo de manobrar em corredeiras estreitas e curvas mas o nosso destino final é o mar e é para lá o nosso caminho.Eu sabia que seria difícil no começo, mas está duro demais, espero sobreviver até o mar.Tive que aprender na hora a manobrar pela primeira vez em corredeires, pela primeira vez utilizando o caiaque com seus 50 kg de carga e sem conhecer absolutamente nada sobre os rios por onde vou passar, apenas dirigi o carro por 2000 km com meu amigo Aldo, achamos o local para iniciar durante a noite colocamos o barco n´água e parti sem saber o que me esperava. Seguindo pelo rio Corumbá o rio começou a serpentear entre milhares de rochas negras, com corredeiras mais fáceis a princípio.A coisa foi piorando, o rio estreitando até chegar numa pavorosa garganta de apenas quatro metros de largura.O meu instinto de auto preservação, pavor e medo chegou no limite, eu sabia que entrando ali o caiaque seria jogado de lado nas rochas, viraria e o resto...Foi aí que comecei a falar com Deus, eu não tinha como voltar e não havia ninguém para me ajudar.Quando decidi que deveria seguir em frente, entrar naquele caiaque e me dirigir para a garganta vendo a violenta turbulência se aproximando foi a coisa mais difícil do mundo.Aquilo é como a vida, os problemas nos esperam e não adianta querer contorná-los, para superá-los, devemos enfrentar de frente o que vier.O caiaque virou, puxei a alça, ejetei mas permaneci agarrado ao barco.Se ele afunda, afundo junto, mas nunca mais vou abandoná-lo.Não morri e assim como esta passei muitas outras mais. Na verdade, dizer que passei por centenas de corredeiras taslvez seja pouco.Dois dias depois parei para pedir informações e quando fui passar por outra corredeira alguma coisa deslocou na coluna vertebral e fiquei quase paralisado de dor nas costas. Parecia haver uma faca cravada entre as vértebras.Fiquei dois dias acampado na beira do rio, tomando anti inflamatório até que consegui carona num pequeno vagão de reparo de linha férrea que segue paralela ao rio.Cheguei ontem a noite e daqui vou no hospital fazer o rx e conversar com o médico.Em princípio vou continuar, a não ser por impedimento médico.Eu passei por muita coisa, limite fisico e moral mas se depender de mim vou em frente. Ainda tem cachoeiras e corredeiras pela frente, mas se esse rios pensam ver um soldado se curvar, o máximo que ouvirão é um guerreiro suspirar.Tirando fora os "probleminhas" com corredeiras e cachoeiras o que fica são as imagens de um por de sol por detrás da mata, do vôo dos tucanos, do chiado das ariranhas e do latido das capivaras;Para tudo eu digo:


Sucuri

Lá longe, onde brilha o sol,Estão minhas supremas esperanças.Talvez não as alcance, mas posso ver sua beleza,Crer naquilo que elas representamE tratar de seguir o caminho que me ensinam.

A vida chegou até minhas mãos por um breve instante,Como uma tocha esplêndidaE eu quero fazê-la arder com o maior brilho possívelAntes de entregár-laÀs próximas gerações.

É isso aí meus amigos, vou em frente nesta batalha e a luz pode se apagar a qualquer instante, mas que enquanto durar ela brilhe com nunca mais!Um baita abraço do amigo André.

Depois de ficar o dia todo no Hospital ficou constatado pelas radiografias que não houve nenhum deslocamento de vértebra, deve ter sido uma forte distensão. O dr. Renato receitou anti-inflamatório mas isto eu já vinha tomando.Decidi que partiria no dia seguinte, mesmo com dores, pois o medo maior era ter deslocado algo.A dor eu posso suportar.É o décimo segundo dia de viagem, estou nervoso, vou enfrentar corredeiras de novo sem saber se consigo superar a dor. Dormi dois dias na segurança de uma casa e agora me vejo de frente para o rio Corumbá sem saber o que vai ser .Me despeço dos amigos que carregaram o caiaque para mim até a beira do rio, coloco o colete as luvas, engulo em seco e me despeço dos amigos.Pois é seu André, agora é só tu e Deus de novo.E lá se vai nosso herói estropiado: perseguindo horizontes ou moinhos de vento?Logo se aproxima a primeira corredeira, o barulho alto da água vai se aproximando, tu tentas ver por onde é o melhor caminho, mas só percebe nos instantes finais. Tento desviar das rochas mas não dá para fazer força e acabo raspando o fundo.-Merda!Acho que estou ficando bom, pois já estou reinando.Aprendi a não lutar com o rio, deixo o caiaque escolher por onde ir, ele segue por onde a correnteza é mais forte, mas o meu instinto de auto preservação quer evitar estes locais.Antes de chegar nas pedras o rio forma um "v" invertido, é ali onde devo colocar a proa, por ali passa sem bater nas rochas e, ao longo do dia, assim vou seguindo.Tu passas uma corredeira e já começa a ouvir o som da próxima, é agoniante!Passei por três pontes que ligam Pires do Rio e vou seguindo.As corredeiras estão cada vez piores, é uma colada na outra, está difícil de escolher o caminho certo, por enquanto vou me dando bem. Só dá uma fisgada mais forte quando forço um pouco mais o remo.Às 13h sou obrigado a parar, o estrondo é forte demais, meu coração bate rápido, ainda não superei o pavor de quase morrer duas vezes nos redemoinhos.Há uma torrente de água que se afunila numa garganta entre as rochas e se torce com força, não dá para ver se ali no meio tem rochas pois se entrar ali, naquela velocidade, despedaça o caiaque e eu junto.Paro num remanso, procuro um caminho alternativo, não tem.Carregar o caiaque sobre as rochas é impossível para mim sozinho.A princípio estou calmo, mas o pavor vai crescendo quando eu começo a falar para mim mesmo:-Cara, não tem jeito, tu vais ter que subir o rio contra a correnteza, fazer a volta e descer pelo meio daquela violência, tem que entrar lá do outro lado, bem junto das rochas do lado direito para ter uma chance de não bater nas rochas da esquerda.- Eu não acredito que tu vais fazer isto comigo!- Sinto muito brody, é por ali!- Deus me ajude!Faço sinal da Cruz, Deus é minha única companhia, peço seguidas vezes que me ajude enquanto sigo para o caiaque.Encho um flutuador dentro da mochila da proa para que o caiaque não afunde se virar. E lá se vai o condenado, senta no caiaque, posiciona a capa e se prepara para subir o rio e fazer a volta antes de entrar na correnteza.- Pronto virei, e agora?-Tenta levar ele bem pela direita e não deixa entrar de lado, pelo amor de Deus!A velocidade aumenta pavorosamente, não tem mais volta.- Trava bombordo seu desgraçado, trava!Travo com todas minhas forças, o bico endireita, esto quase batendo nas rochas da direita. Acho que meus olhos estão vidrados, só vejo a espuma e as ondas revoltas onde vou cair em segundos e aquelas malditas rochas da esquerda que podem sugar eu e o caiaque para uma viagem sem volta para o fundo.- DEUS ME AJUDA, DEUS ME AJU D A !O caiaque mergulha de bico, as ordens são para puxar a alça ejetar do caiaque e dar um jeito de agarrá-lo ao mesmo tempo.Tudo passa por cima o caiaque pula como um cavalo doido, as rochas da esquerda se aproximam.- TRAVA BORESTE, REMA BOMBORDO, RÁPIDO!Eu nem tenho tempo para pensar,apenas grito comigo mesmo:- REMA DESGRAÇADO, SAI DAI SEU MERDA!Estou de lado, vou bater, mas uma corrente salvadora me tira dali, o caiaque rodopia e gira ali no meio, parece se desviar sozinho das rochas, remo quando dá, mas o mais incrível acontece, não virou!- NÃO VIROU, OBRIGADO SENHOR!Cara é muito stress, que adrenalina!Sigo em frente, mas as corredeiras se sucedem, passo por várias, lugares belíssimos e algumas ilhas.Depois de 4 h de viagem escuto um estrondo forte demais.- Cara! Parece uma cachoeira, sai dai tu estas entrando na corredeira final.Que dor nas costas que nada, tenho que salvar minha vida. Faço uma força incrível e entro num remanso bem ao lado da mais pavorosa corredeira gigante ou cachoeira até aqui.Desço e vou filmar o local, é apavorante!Uma força descomunal de água, rochas ponteagudas bem no meio da torrente. Entrar ali é suicidio, pois é imprevisível e tem tudo para despedaçar o caiaque ou rachar a cabeça se virar e bater nas rochas.- Mas e se for por ali?-Vai te fuder, quer me matar seu corno?- Nem pensar, nem tente pensar em passar por ali.- Tô ficando com raiva de ti!Tudo bem, por terra não dava, havia casas rio acima, só que do outro lado.Teria que subir o rio contra a corrente e dar um jeito de atravessá-lo sem cair na corrente.Tentei no remo, mas a corrente foi mais forte e ele veio com tudo na direção da queda:- NÃO DEIXA VIRAR, NÃO DEIXA VIRAR!- REMA DESGRAÇADO, REMA VAI PARA O REMANSO!Ainda estou tremendo, só me resta subir por dentro dágua arrastando o caiaque com uma corda.A correnteza é muito forte, estou num ponto crítico enfiando os dedos em saliências nas rochas com a mão direita e a corda na esquerda.Se soltar a corda agora o caiaque se vai na queda.Não é que escorreguei?Não podendo soltar as mãos de jeito nenhum, fui obrigado a aparar a queda com a testa na rocha.Resultado: um tremendo "ovo" na testa, mas felizmente não cortou e não larguei nem a corda nem a saliência.Consegui passar dali e finalmente subi o rio fazendo o sinal da cruz entrando na corredeira de lado e fui atravessando ao mesmo tempo que descia para a cachoeira. Se o caiaque vira ali não se salva nenhum dos dois.Cheguei do outro lado e subi para chegar na casa, atravessei outra corrente mas não havia ninguém. resolvi descer o rio de novo até a cabeceira da queda, só que agora pela margem direita.Não é que o corno virou ao passr na corredeira que eu já tinha cruzado?O corno já se foi entrando para a cachoeira, alcancei-o com a mão esquerda e meti a mão direita numa saliência de rocha.- Não seu desgraçado!Acabei esmagando a unha do dedo da mão direita.Consegui descer até a cabeceira, arrastei o caiaque para cima e armei a barraca, era cedo mas dali não dava mais para seguir.- Ufa que dureza! Isto é que eu chamo de tratamento intensivo para a coluna detonada!Liguei o radinho, escutei o Brasil meter 4 x 1 na Argentina pela decisão da copa das Confederações, he, he!Como é doce o sabor da vingança!Lo siento mis amigos Argentinos pero este fué el vuelto de Buenos Aires!Levei todo o dia seguinte fazendo idas e vindas com a carga do caiaque sobre pedras e capim alto e tive a ajuda de um amigo na parte final.Acampei na praia, de frente para o final da cachoeira e conheci os donos do local.Ele pegou duas sucuris na rede que estendeu por ali.E eu achando que não havia mais...Esta noite que passou foi linda, vendo a corredeira, escutando as capivaras, os morcegos e os grilos.Amanheceu com neblina e o visual foi incrível quando ela subia e a cascata aparecia ao fundo.Acho que mais dois dias e acabam as corredeiras, este era o último grande obstáculo, ainda bem, pois estou no meu limite psicológico.No dia seguinte sigo meu destino, rumo a uma série de corredeiras e depois a do " Cavalo Russo" . Utilizei a minha tática "Kamikaze" .Depois a coisa foi ficando linda demais, o rio mais largo, uma paz que não tive até então, beleza indescritível.Seguidas vezes cruzo com capivaras, algumas fazem estardalhaço, outras entram devagar no rio com seus filhotes.Fiquei nervoso ao final do dia e tive que entrar por um pequeno afluente entre os galhos com lama acima do joelho e quase escuro. Facão e punhal na mão, lugar perigoso.Abri uma clareira e armei a barraca.Tu não consegue ficar muito tempo tranquilo.Acordo com muita cerração, gritos de seriemas e curicacas se destacam.Sigo em frente e o rio está quase sem forças, acabaram as corredeiras.- ALELUIA!Árvores enormes se debruçam sobre o rio, passo sob elas para fugir do sol forte, mas sempre olhando para cima, pois as sucuris gostam de ficar sobre os galhos...Vou em frente, o sol atrapalha para ver as margens, passo pela entrada do rio do Peixe e depois tudo começa a ficar largo demais, está difícil para me orientar, sem a bússola e apenas com o mapa rodoviário sou obrigado a utilizar o GPS (grupo de pessoas simpáticas). Acontece que informam(quando encontro alguém) muito por cima e começo a ter muitas dificuldades.Coloquei a bússola na proa, mas não dá para confiar nela, o rio faz muitas curvas e não tem uma direção geral.Comecei a passar por muitas florestas submersas pelo lago que se formou pela barragem depois de Caldas Novas.Dormi 1 km antes de chegar na ponte a comi uma carne com o pessoal que deixou acampar ali.Dia seguinte, local lindíssimo, cruzo com uma infinidade de tucanos, araras e até um urubu-rei, lindíssimo.O lugar é de cinema, papagaios cruzam o rio quase lago.Chego numa parte larga, vejo uma cidade, é Caldas novas.Vejo duas lanchas fundeadas e vou para lá pedir informações. Mal consigo olhar para os caras pois está cheio de prendas de biquini. Eles dizem:- Rapaiz, ocê tá muito animado!Chega o final do dia, não acho lugar para acampar então vejo uma casa flutuante que os pescadores deixam às margens do lago e monto acampamento ali, sobre a balsa.Amanhece o 17 dia e os bichos não me vêem, filmo um bando de macacos pregos e um enorme pica-pau de cabeça vermelha dando comida para os filhotes no ôco da árvore submersa bem na minha frente. Show de bola!Sigo em frente, seguidas vezes tomando o rumo errado encontro um cara louvando a Deus dentro do mato e quando pergunto par onde fica a barragem, ele manda eu ter paciência e começa a falar de Deus e das maravilhas daqui.Bueno, como diz meu irmão: - Tens que exercitar a tolerância!Finalmente chego na barragem, é cedo ainda.Deixo o caiaque junto às pedras, caminho o longo "s" da estrada até lá embaixo, junto a saída das turbinas onde está o prédio da administração.Apresento-me como " oficial da reserva do corpo de saúde Da Marinha do Brasil" o que não deixa de ser verdade.- O senhor nem deveria ter vindo aqui! É local proibido!- Não vi nenhuma placa!- É mas deveria ter percebido!- Eu não sou adivinho!Bueno, aquele papo não ia me ajudar e mudei o rumo da prosa, ele entrou no predio e não disse nada.Quando eu já estava pensando em descer o caiaque de rapel, ele autorizou uma camionete e três funcionários a pegar o caiaque lá em cima e me largaram ao lado das turbinas aqui em baixo.De brabo, fiquei tri feliz! Eram mais de 50 m de altura ia levar mais de 2 dias para cruzar sozinho. Segui adinte peguei água numa cascata ao lado do rio, passei por dragas de areia e fui em frente, passando por muitas florestas de gameleiras inundadas mas ainda vivas.

Acampei numa elevação entre elas e resolvi consertar as partes mais feias do caiaque com durepoxi.

18 dia - Parti meio tarde e logo adiante chego em uma ponte que está exatamente ao nível do rio. Sigo até a extrema, arrsto o caiaque por terra e sigo meu caminho. Passo pela ponte nova e de novo o rio se abre num lago com cinco ou seis direções a tomar.

Errando e acertando vou em frente, passando por belas sedes de fazendas até acampar em uma curva do lago, depois de girar sem rumo por mais de uma hora.

19 dia - Segui pela bússola o rumo W - SW vou por mim os caras só me dão informações erradas.Remo cerca de quatro horas, estou perdido de novo, vou numa direção e ouço sons de outro lado. Vejo uma balsa de transporte dew veículos e finalmente descubro onde estou no mapa.Sigo até onde é o terminal e ali fica próximo de Corumbá Azul.Um senhor me dá o rumo a seguir o lago tem uns 10 a 15 km de largura.Não é que o corno me manda seguir em direção de uma ilha no meio do lago enquanto eu deveria acompanhar a costa no rumo SW?Uma lancha passou perto fiz sinais e parei numa ilha, o mal poderia ter sido maior.

Aqui já é a foz do rio Corumbá e este imenso lago se forma com a junção do Rio Paranaiba, que faz a divisa entre Goias e Minas Gerais.

20 dia - Amanhece com um tremendo vento contra, cheio de carneirinhos, sou obrigado a deixar o bom senso prevalecer e ficar na ilha, estou puto da vida, se aquele cara não desse informação errada estaria perto do continente. poderia ter avisado a família( estou há 12 dias sem dar notícias) e talvez ter seguido em frente.Faço umas excursões a pé, descubro que estou na ilha Tancredo e louco de impaciência, vejo o dia passar. É muito triste e agoniante ficar assim.

Lá estava ele, sir Lancelot Issi em seu belo cavalo Maktub.Chegara no reino da Ilha Tancredo nem sabe como.Foram muitas batalhas e nosso herói sentia a necessidade de deixar um herdeiro neste reino para que governasse com justiça essa terra de ninguém.Foi enganado pela feiticeira Morgana que assumiu o corpo de sua jovem amada. Era apenas uma forte atração física e não levaria a nada. Seguiu batalhando pelo reino das Sucuris e se tornou lorde nas distantes terras de Santa Capivara.Esteve nas terras do Além, nas profundezas das Morredeiras( corredeiras), onde conheceu a Iara que quase o enfeitiçou.Andou por muitos lugares, pela terra dos Gladiadores. Quando achava que ia morrer seu amigo, um tal de Spartacus, lhe dizia:- AINDA NÃO É A SUA HORA!Perdido em pensamentos, conheceu a futura mãe de seu filho, mas ela estava prometida para o rei. Eles tiveram um filho, Vinicius, mas os anos se passaram e nosso herói, um High Lander das terras altas do Planalto Central não envelhecia.Sua bela amada ficou gorda e feia e nada mais lhe restou senão partir em busca de novas aventuras.Ele es teve nas Legiões ( Marinha), foi condenado a trabalhos forçados (consultório) mas conseguiu se libertar e fundar dois reinos, o da Lagoa da Conceição e o de Maktub, na Guarda do Embaú.Viu muitas vidas passarem e agora segue seu destino em busca de horizontes na direção do mar...

21 dia - Decidido a partir de qualquer jeito, parti com um forte vento se iniciando mas favorável.Fui em direção do último ponto de terra que podia ver para SW e que fosse do lado de Goias.Mais uma vez fiquei nervoso, tensão total pois não conheço direito este caiaque e estou fazendo uma travessia de 15 a 20 km com vento forte que forma carneirinhos. Para pegar e sair assim " tem que ter farinha no saco",pois a partir do momento que tu sais, sabes que não dá para voltar.Se der uma zebra de o caiaque virar fica na água por um dia ou dois.Sozinho com Deus vou me acalmando à medida que as horas passam e percebendo que o caiaque é muito bom, ele anda bem de qualquer jeito, tanto com ondas de proa como de través, que passam por cima mas não o desestabilizam.Fiquei feliz quando três horas depois cheguei na ponta que queria no maior pau de vento.Almocei a reversa do vento e depois segui para outra travessia de duas horas, agora mais consciente do que o caiaque é capaz de fazer.Cheguei na represa de Itumbiara e o pessoal foi legal demais e mais uma vez veio um baita dum caminhão que me transportou até a parte de baixo da usina.Eram 16:30 h quando sai dali e fui num pau violento até chegar em Itumbiara já noite.O pessoal do corpo de bombeiros me alojou depois de apresentar a declaração da Capitania dos Portos de SC (obrigado amigos) e minha identidade militar, está me ajudando muito a passar por barragens.Hoje vim para o centro da city e estou há quatro horas no computador.Os bombeiros falaram que existem muitas sucuris enormes aqui mesmo e mais para adiante, mas eu vou em frente, em busca do meu destino.Vou agradeçendo a Deus e a todos meus amigos que torcem por mim.Ao escrever estas linhas me sinto mais forte e feliz de dividir as aventuras com voces.A primeira parte foi muito mais violenta mas eu não tive muito tempo para esvrever.Um baita abraço a todos e até um novo despertar.André!

Olá amigos, parti de Itumbiara no dia 10/07 pronto para enfrentar um rio repleto de sucuris, com punhal no antebraço e fé em Deus.Parei num bar e falei com o dono e ele explicou que tem sucuris enormes mesmo, mas que não tem notícias de que elas atacam.Explicou que elas tem tocas nas barrancas (onde eu durmo) mas que elas saem a noite.Então fica assim: eu com o rio de dia elas com ele de noite.As margens são tomadas por um capim muito alto e impenetrável (capim de sucuri), florestas e campos mais ao fundo.Comecei uma rotina de remar tres horas, para, almoça, rema mais duas horas, descansa, duas horas e procura lugar para acampar.Finalmente achei uma clareira no capim de sucuri e armei a barraca em campo aberto, dormindo como bicho pronto pra reagir se atacado.Aqui na natureza é assim: muita beleza mas sempre alerta, tem que permanecer vivo.No dia seguinte o rio alarga, vento mais ou menos favorável, chego na barragem de cachoeira Dourada, os caras são legais e arrumam um caminhão caçamba para me largar abaixo das turbinas.Os caras acham que é muita coragem dormir nas barrancas junto as sucuris, mas botei na cabeça que elas não atacam de dia, é melhor pensar assim.Final de dia e nada de lugar para dormir, cruzo com um bando de macacos prego, papagaios e outros bichos.Achei lugar no alto de um barranco que desmoronou, o caiaque ficou lá embaixo.Estou dormindo e escuto barulho de folhas na árvore ao lado.- Fica aqui seu metido! Vai me arrumar confusão!- Cara pode ser macacos fazendo seu ninho na árvore, vai lá filmar com o infra vermelho.-Que cara desgraciado, não me deixa dormir e fica procurando sarna.Ao sair da barraca no escuro e me encaminhar para a árvore do barulho, sinto bater de asas e vento no rosto. Ligo a lanterna e vejo dezenas de morcegos passando na frente do facho da lanterna.-Pronto, satisfeito seu metido?No dia seguintre remo por sete horas, encontro um acampamento abandonado e uma floresta escura, é meio baixo astral mas que fazer.Chega um pescadore, ele diz que o nacampamento era dele, mas que parou de vir aqui porque uma enorme jararacuçu (uma enorme jararaca do banhado de uns 2 a 2,5m) muito agressiva lhe atacou duas vezes e que em outra oportunidade quase morreu queimado quando a lamparina virou e ele estava dormindo...-Legal, que belas informações ele me dá com a barraca já montada e anoitecendo.Diz ele que uns 15 min para frente há um terminal de balsa e que lá tem luz, banheiro e água...Gozado, apesar de jararacuçus e sucuris fico mais a vontade no mato.Agradeço e digo que vou ficar.No dia seguinte começam as longas travessias de 2 a 3 horas, chega numa ponta outra travessia.Muitas consultas no meu mapa rodoviário e na bússola, assim vou seguindo no rumo W-SW.É meio difícil, mas no geral estou acertando o rumo, às vezes, consulto com o binóculo.Parti na manhã do dia 14/07 escutando as caturritas e os papagaios, longas travessias, brigas histéricas com o caiaque que teima em mudar o curso por causa das ondas e do vento:_ Não é pra lá seu corno é pra onde eu quero que tu vás!E remava furiosamente, percebendo que cada vez mais a dor nas costas diminui.O tempo passa, tu ali passando as horas sozinho começa a viajar em pensamentos, lembrando das pessoas que se foram, dos amigos, de passagens alegres e tristews e começa a rir sozinho, ou de repente, começa a remar furiosamente quando lembra coisas que te deixam brabo.Isto sempre acontece, seja de bicicleta nos Andes, de moto pela América ou de Windsurf pela llLagoa dos Patos ou de Caiaque pelo mar.Depois de tres horas descanso msob a sombra de uma frondosa gameleira que envolveu um pé de bacuri.Sigo em frente e encontro um pessoal acampado com uma estrutura de dar inveja: Três possantes lanchas, caminhão baú, gerador mesas e tudo o mais.Ney, Èzio, Walter, João, Conceição, Wesley, Maurício, Cesar e Didi me convidam para chegar.Almoço com eles, são gente boa demais. Vamos de lancha pescar tucunarés, bebemos muita cerveja e de noite churrasco de picanha e linguiça.Muito legal mesmo, um pessoal bom e amigo demais.Hoje vim com o Ney e o Wesley até aqui, São Simão para mandar notícias, de lancha demorou 50 min, mas para vir de caiaque vou demorar uns dois dias, talvez um, fica quase ao lado da represa de São Simão.É isso aí, um baita abraço amigos e até a próxima, André!

Olá amigos, a viagem está meio doida. Muita coisa aconteceu e está acontecendo, enquanto a veia da foice não chega eu vou seguindo meu destino. Este é um resumo do diáro:

Bueno, no dia 15/07 fui de lancha com o Ney até S. Simão e no final do dia retornamos de lancha para o acampamento e passamos o resto do dia comendo e bebendo. O Cesar preparou o tucunaré ensopado e estava uma delícia.Que pessoal mais amigo e hospitaleiro, se eu não me sirvo, logo tem um colocando comida ou cerveja, aí eu fico pensando naqueles que acham que isto é " idiotice", pego um copo de cerveja, olho para as estrelas sobre a copa da gameleira, num lugar especial na beira do rio e "concordo" plenamente com estas pessoas.Agora devem estar assistindo a uma novela de vaqueiros, curtindo dramas alheios ou ouvindo os noticiários das "novelas" de Brasília.Há uma turma que vai caçar capivaras e eu resolvi encarar.Ligam o som, toca uma música do Bruno e Marronei que diz:- Que pescar que nada eu vou para a noite beijar na boca e deixar a mulherada toda louca...Fomos abrindo porteiras e andando a 100 km/h numa estrada de terra cheia de buracos e mata burros.Um deles recebe a ligação da mulher, motor desligado, silêncio pessoal! Já estamos em Santa Vitória, passa uma carreata para uma festa com fogos e som enquanto ele fala. O cara tem sangue frio!Chegamos no local da caçada, capturamos duas, mas o resto está perdido pelo mato.Na hora de matar e comer alguém lembra que capivaras tem carrapato...É melhor soltar as pobres, eram muito petiças e o odor não era dos melhores...Como a gente riu, que caçada mais divertida. O mais legal era cada um contando os "causos" de porque atirou ou não atirou.

Posso dizer que foi bom demais e que ninguém se feriu.

16/07 Acordei disposto a partir mas eles querem que eu fique mais um dia, tem sempre um conversando e bebendo cerveja, até me sinto mal querendo partir, mas eu tenho o meu caminho.Acabo almoçando e partindo só às 3 h da tarde. Adeus amigos, foi bom demais, obrigado por tudo mesmo!Parti às 15:10 h, com o intuito de remar direto para o último pontal que vejo. Calculei mal e chego na costa só 10 min antes de o sol se por.

Armei a barraca junto a um barranco, quase ao nível d´água e sem abrigo para o vento. Noite estrelada e o barulho das ondas.

17/07 Trigésimo dia DomingoQuando cheguei ontem, tomei banho de sabonete no escuro, não estava tão frio. Acordo com o vento médio e as ondas batendo. Arrumo tudo e sigo em frente, cruzando ora para GO, ora para MG, conforme uma linha reta que determinei quando passei aqui de lancha. Pelo menos uma vez eu já sei por onde ir.São várias travessias de hora e meia, tu vais de uma ponta a outra e dali atravessa de novo. O Ney estaria em S. Simão até às 13 h e cheguei na última ponta antes de atravessar ao meio dia.Daria tempo remando forte, mas entrou um fortíssimo vento de rajadascompletamente contra. Parei um pouco antes no remanso. Encosta um barco de pesca a coisa ficou difícil.Mierda, deixei de cruzar e encontrar meu amigo por causa de uma mísera hora. Agora levaria duas ou tres e aí o Ney não estaria mais por lá, tive que desistir.Fico ali sentado no sol, em segurança, talvez esperando que o vento diminua:- E aí cara, vai ficar que nem galinha velha tomando sol?-O que tu queres que eu faça?Pega este caiaque e testa ele contra as ondas e o vento, é uma maneira de treinares para quando chegares no mar.-Pô, tá o maior pau de vento, só tem carneirinhos...-Seu bunda mole; não me faz te pegar nojo. Arruma as coisas e vai, comeste demais, agora transforma isto em energia.E lá se vai o condenado, uma onda explode no meu peitoe me dá um banho.Adeus sol e segurança. Vamos nós corcoveando entre as ondas furiosas, subindo e descendo.Apesar de tudo o caiaque segue para a frente, lentamente, mas segue.Com o meu antigo estaria andando como caranguejo. Esse caiaque é muito bom mesmo, faz coisas que eu não tinha noção que pudesse fazer.Vejo uma ilha para a frente, o plano era seguir a costa, mas o espírito resolve me intranquilizar de novo.- Segura peão, vamos em frente, quero ver se tu és macho mesmo ou se tem medo de capivara.Estou encharcado, o vento só faz aumentar, mas tenho o domínio da situação assim assim!Se virar ali a coisa vai complicar para o meu lado, mas até que é divertido se eu não me der mal.O vento aumentando e as nuvens se aproximando me colocam na real:-Cara, faz força, acho que estamos nos encrencando!-Ahá, agora tu aperta,né?Após uma hora consigo chegar ao abrigo da ilha. Na verdade são tres; há casas lindas, parece uma pousada na outra.Encosto, Haroldo trabalha ali, é uma pousada de luxo, linda.Há faisões soltos, peixes empalhados , todo tipo de mordomia.Falo com meu irmão e a mãe de um telefone público.Chega Luis, o dono. Ele oferece hospedagem, mas o jumento, imbecil e outros bichos do espírito resolve dar uma de bacana e prefere seguir mais uns 15 min, para outra ilha e acampar debaixo de uma gameleira.- Eu não acredito que fizestes isto comigo! Tu és um animal!- Cara dormir debaixo de uma gameleira...- Dar uma surra de relho é pouco...A solução é achar que fiz o certo, que assim partirei mais cedo amanhã para a represa.

Então vou a pé olhar o por do sol e escrever o diário entre as pedras...

18/07 Segunda-feira dia 31Hoje faz um mes que me despedi de meu amigo Aldo lá no rio S. Bartolomeu e agora me dirijo para a maior represa de todas, tem 127 m de altura, 7 km de extensão, as águas são muito profundas.Encosto na barreira de pedras:- Que queres aqui, seu metido?- Tire esta casquinha de noz antes que eu me incomode!- Venho beijando boca de china e aparando guampa de macho mas não quero pelear, apenas seguir meu destino...Antes de eu viajar de bicicleta para Machu Pichu, a mãe me deu um cartão onde havia um menino plantando uma árvore com os dizeres:- Nunca te sintas pequeno para realizar um grande sonho!É assim que eu devo enfrentar estas coisas que aparecem diante de nós e que parecem intransponíveis.Pego minhas coisas e vou caminhando na direção da base onde fica a central.Logo um segurança vem de carro e me intercepta, ele chama outro que também vem de carro.Weder é legal, mas Antônio, o chefe, é um cara limitado que não sabe repassar para os outros(por rádio) o tipo de viagem que estou fazendo.Faz frio, estou só de calção e camiseta, mas eles me deixam quarando ali no vento enquanto vão falar com os responsáveis.Antonio vai e volta duas vezes, não me deixa falar com ninguém e diz que "infelizmente" não poderei passar, falo que se existisse boa vontade daria.A cada argumentação ele só responde com "infelizmente".Weder está indignado com o chefe ele tem poder para resolver, mas é um limitado e sinto que terei que forçar uma situação que não sei como vai terminar.- Retroceder nunca, render-se jamais!- Pois é seu Antônio, mas eu vou ter que passar, nem que seja carregando e leve três dias...- Aqui o sr. não passa!- Então o Sr. terá que chamar a polícia para me prender, talvez venha a imprensa, não é uma boa política para a empresa.- Estou pedindo tão pouco e o sr. se recusa a ajudar...Ele se vai de novo e volta depois de 30 min dizendo que chamou a polícia.- Então eu não vou ficar aqui passando frio esperando sua ajuda.Weder me leva para cima puto com o chefe, diz que vai ligar para um amigo que me pega no garimpo do outro lado e me atravessa.Vou no caiaque e enquanto almoço o salamito, aparece o "traira" do Antonio e fica puxando conversa.Acho que se julga esperto, pois está me vigiando e eu finjo que acredito.Chega a viatura, as pedras vão rolar.- Antonio se antecipa e diz que eu iria invadir...Imagino como ele distorceu tudo.Explico para os militares o que quero e o cara se surpreede:-Só isto?Antes que a coisa vá mais adiante, aparece o sr. Ivo, gente fina e que faz serviços para a represa.-Eu vou transportá-lo em meu carro. Ele se penalizou e resolveu a questão. Antoninho teve que ficar assistindo, he,he!Todo mundo quer me levar, inclusive os guardas, mas preferi seguir com Weder a quem considero amigo.Não sei como o caiaque coube no carro.Vamos até a parte de baixo, ao lado das turbinas nem sei como agradecer ao seu Ivo que ainda me oferece seu almoço na frente do trira que não ofereceu sequer um copo de água.Saldo: Amigos 8 x 1 traira.Filmo todos e fotografo, é claro que excluo o traira da foto que faz pose meio sem graça, he, he!É brabo, que custa ajudar?Ainda bem que eu já tenho o espírito preparado para este tipo de situação.A represa estava fechada, o rio forma um imenso canal de altas paredes de rocha, há terminais graneleiros para carregar enormens barcos empurrados por rebocadores. Daqui para a frente o rio é navegável.Sigo contra as ondas e o vento forte e frio, tenho que colocar o casaco de chuva para atacar o vento, é o que tenho para o frio.Após umas tres horas, paro em uma casa ribeirinha para pedir água; eles são legais e dão um pastel que guardo para comer mais tarde.Passo por um bando de macacos prego que pula nos galhos, me observa alvoroçado enquanto sigo.Antes era tudo largo, indefinido, agora mata fechada de novo e muitos bichos, inclusive ela, a sucuri...Foi uma longa reta para SW e poucas curvas.Às 17 horas eu paro em um braço de rio, parece meio abrigado, pescadores dali oferecem pouso, mas eles tem gatos o terreno é muito inclinado e acho que ali o vento vai pegar de frente.Resolvo atravessar e procurar local mais adequado.Monto a barraca dentro do mato, sinto que viorá chuva forte.

Não deu outra, chuva muito forte e vento, felizmente estou abrigado, meio torcido sobre as raízes mas seco.

19/07 dia 32 terçaContinua o vento parou de chover.Estou no mato e vejo uns vinte quatis vindo na minha direção, volto para a barraca e consigo filmá-los.Eles me vêem e sobem nas árvores de onde me observam emitindo grunhidos de aviso.Sigo contra o vento, escolhendo o lado menos pior no rumo W-SW, hoje o tempo está nublado e feio, já é o terceiro dia de vento contra.Remo por 3h seguidas almoço, remo mais duas descanso e remo de novo até o final do dia, passando por muitas florestas submersas.Encontro outro braço de rio, desembarco e abro uma clareira no mato com o facão, pode chover e ventar de novo e tenho que estar abrigado.Welton e Aporé aparecem de lancha oferecendo para que vá para seu acampamento. Agradeço, mas não gosto de deixar meu equipamento, eles voltaram de uma caçada de capivaras; felizmente não as encontraram.Durante a noite escuto risadas, está animado lá para o acampamento deles.

Parece que estou próximo da foz do Rio Aporé, que faz a divisa entre GO e MS.

20/07/05 dia 33 quartaTchê! Que noite mais fria! Amanhece gelado, mas sem vento, preparo o kinojo para esquentar dentro da barraca.O sol aparece fugazmente, o suficiente para mostrar a beleza do lugar. Vejo os ferozes tucunarés dando saltos atrás dos peixes menores e um bando de araras amarelas e azuis.(O sol se foi fica uma espécie de neblina, viajo com o casaco d chuva para manter o calor do corpo. De cara vejo uma capivara que mergulha assustada ao me ver.Com o auxílio da bússola e do mapa ora ia na direção de Go e desta ponta seguia para outra em MG, eram travessias longas e eu não me sentia confortável com essse tempo esquisito. Eram travessias entre 1 e 2 h, chegava num lado que não dava para desembarcar por causa da vegetação de capins . Encosto em uma bóia de sinalização de bombordo(vermelha) para tirar fotos e filmarFinalmente avisto com nitidez a foz do rio Aporé, tenho diante de mim tres estados: para a direita, Goiás de quem me despeço agora, terra de gente boa e onde permaneci por mais de trinta dias. Do outro lado Mato Grosso do Sul que vai me acompanhar até o Paraguai. Para a esquerda fica Minas Gerais.Sigo para MG, estou no caiaque direto remando por 3:40h, suado e cansado.Parei na sombra de uma gameleira que tem as raízes submersas e tenho que descer ali mesmo, dentro d´água. Almoço em pé, assistindo aos milhares de peixinhos nadando ao lado do Maktub que flutua sobre as raízes. Ficou frio, desisto do banho, ainda mais que sou atacado por marimbondos.Um corno me acertou mas matei uns sete e fiquei ali até comer tudo, não vou ser expulso por uns veadinhos.Atravesso de um estado para outro, o final da tarde se aproxima e começo a ficar nervoso, São tavessias longas que se sucedem e vou seguindo sobre os troncos perigosamente perto da superfície e que quando vejo, já passei.Na última travessia sou interceptado por uma lancha que passa entre os troncos, são antonio e Marcos e me oferecem um revigorante café que aceito com muita alegria!Foram mais quatro horas dentro do caiaque, passo por uma pequena ilhota e avisto uma enorme ponte ao loge com dois arcos.Passo ao lado de um barranco avermelhado e o sol projeta minha imagem e a do caique no barranco, que legal, é a primeira vez que me vejo remando.Paro do lado mineiro são quase oito horas remando hoje.O local é de cinema, uma floresta de bacuris e gameleiras, água espelhada e o sol se pondo, show!As folhagens se mexem, é um bando de macacos que se retira e fica me olhando do alto.Agora são 5:30, estou escrevendo desde às 4:48h, não tem vento, armei a barraca sobre fundo de cascalho, mas dá para encarar.Cara, que espetáculo! Fui lá na rua e a lua cheia quase no horizonte formou um reflexo prateado desde o outro lado até encostar no caiaque aqui na beira.

Está amanhecendo, o café está pronto, as corujas, morcegos, grilos e outros cedem espaço para os bichos do dia.

21/07/05 dia 34 quintaParti e segui até a ponte. Desço para pegar água e descubro que ela foi inaugurada em 2003, pelo Presidente Lula.Segui em frente, cansado de ontem, a moral da tropa está baixa. Nestas situações o comando deve tomar medidas drásticas para reverter o quadro:- Tenente Issi!- Sim senhor!- Encoste naquele barranco, tome um banho e faça a barba!- Senhor, hoje é quintq...- Sem contestações, ninguém na companhia aguenta mais o seu cheiro. aproveite e lave estas roupas de viagem.- Sim senhor!E assim, de banho tomado sigo em frente, uma longa reta de mais de 10 km, menos mal que o vento está favorável. Nem vejo onde é o fim.Vejo uma torre ao longe, do lado de MS. Enquanto sigo para lá, nestas longas travessias, entro em alfa, deixo o corpo remando e viajo pelo tempo, passado, presente e futuro.Passo por uma fazenda lindíssima e mais tarde chego na torre. Desço para descansar e leio a placa da frente com o binóculo:- Farol de FormigasNão iria cruzar mais hoje, mas não vejo local adequado e sou obrigado a cruzar no final do dia.Então sou obrigado a remar com muita força a~´e chegar em MG, num mato alto e Escuro enquanto o sol swe põem,Mais de sete horas de remo e sempre remando forte no fim. Achar local a partir das 17 h está complicado.Escurece, um bicho late próximo da barraca, deve ser graxaim. Uma coruja berra estridentemente. Pelas minhas contas hoje é o último dia em MG, amanh~chego na foz do Paranaiba, junto com a foz do Rio Grande, terei andado entre 850 e 900 km. O R. Paraná tem 2736 km até B. Aires, depois é só subir o mar por mais 1500 km...

Tudo isto dá perto de 5000 km, que Deus me ajude!

22/07/05 sexta dia 35Saí e logo ao cruzar a ponta vejo ao longe uma ponte que não tem no ,meu mapa.A solução é tocar reto pelo meio do rio. Passam 4 lanchas próximas da marge, elas vêm próximo da margem.É chato tu veres um objetivo de longe, remar por horas e nunca chegar.Depois de quase duas horas encosto em uma ponta onde tem uma casa no alto de um barranco. Vejo gente, desembarco para pedir água mas os bugres se escondem.Vou em frente assim mesmo e quando vejo, um enorme fila se aproxima. Para piorar há um canil com um baita rotweiler. Pior, o portão está aberto e ele sai e vem na minha direção.Estou sem o punhal, olho para a casa para ver se alguém chama as feras, nada.- Te vira cara!O fila não parece tão feroz, então desvio meu olhar X-45 para o rotweiler que rosna mas não se aproxima muito.Fiquei invocado com os donos que me deixaram para ser devorado e vou até a área encho as garrafas com água e volto na direção dos bichos.Cruzo pelo fila o rotweiler entra no canil e avança lá de dentro, acho que quis mostrar serviço.Depois de passar pela foz dos dois rios, tem o bico de MG onde tem outro farol em forma de torre, o km Zero e um barco de turismo encostado ali.Agora as divisas são SP à esquerda e MS à direita. O vento está forte agora, a ponte liga SP a Aparecida do Tabuado. Ela é rodoferroviária sendo que o trem passa na parte inferior. Foram tres horas de viagem. Encosto em um restaurante rodeado de coqueiros, peço um belo prato a base de carne para comemorar a chegada no R.Paraná.É o bar arara azul, muito lindo e rústico. Converso com João e Benê enquanto devoro a carne e tomo tres águas de coco para arrematar.Fiquei parado por tres horas, mas valeu a pena.Parto às 15h e vou remando forte, passo por uma ponta, vou em direção de outra passando pela sede de uma imponente fazenda cuja sede é um sobrado enorme e envidraçado um pouco mais adiante.Tem uns caras pescando tucunarés, falo com eles e não acho local abrigado. Avanço sobre capins flutuantes e arrasto o caiaque até a margem. Armo a barraca sob um solitário pé de goiaba. Os caras chegam depois, pescaram um enorme tucunaré.

Escurece e vejo a lua nascendo lá do lado de SP, parece uma bola de fogo que projeta o reflexo desde o outro lado. Que coisa linda!

23/07/05 sábado dia 36Parece que vai chover, amanheceu com muito vento contra que balança a barraca. Aqui está abrigado, acho que não vou partir:- O quê?- Não descende o fraco do forte, filho do Rio Grande não és!- Chorastes diante da morte?- Não, Senhor!- Então vai a luta!É verdade, ficar que nem galinha, chocando os ovos, não é comigo.Agora eu tenho um caiaque que anda contra o vento e as ondas. É ruim eu sei, mais esforço, menos avanço, mas é bem melhor que ficar esperando no campo embaixo de um pé de goiaba o tempo mudar.Parti às 8:55h, seguindo paralelo a costa desabrigada, uma neblina parecendo tempo nublado, ondas e vento contra. Tudo mais ou menos, até que chego numa ponta e tenho que fazer um travessia que vai durar uma ou duas horas.O vento cada vez mais forte e ondas gigantes:- Soldados!- Sim General Bento gonçalves!- Primeiro eu quero dizer que é uma honra lutar ao lado de homens com tamanha valentia- O campo de batalha está aí em frente. Não há testemunhas, esta será uma luta solitária.- Apenas peço dignidade na hora da morte, pois a bravura é esta medalha que vocês tem dentro do peito, forjada a ferro e a fogo nos pampas do Rio Grande- É fácil a missão de comandar homens livres, basta ensinar-lhes o caminho do dever!Dito isto os homens encheram o peito de orgulho e uma batalha épica se travou nas águas do Mato Grosso.O soldado Maktub, guerreiro gaúcho com alma castelhana, lançava sua proa tal qual uma lança contra os inimigos.O tenente Issi recebia no peito o sangue do inimigo perfurado e comandava o cabo Remo. A legião de inimigos se perdia no horizonte e o vento assassino fustigava nossos heróis que avançavam mesmo assim.Os soldados Bíceps e Peitoral garantiam a vanguarda enquanto que Tríceps e Trapézio garantiam a retaguarda. Foi uma peleia bruta e feia, tão braba que muito homem calejado virava o rosto de lado.As ondas se torciam, mudavam de forma mas os tauras gaúchos ginetearam e pelearam como nunca e atravessaram o campo de batalha em duas horas e tomaram a colina que havia do outro lado.- Muito bem homens, vamos em frente!Fui seguindo agora paralelo a outro campo e tive que parar para filmar cinco emas entre um rebanho de cavalos.Alguns cavalos vieram até a beira e batiam a pata, desafiadoramente.- Calma amigos, venho em paz. Estou cansado de batalhas e vocês não estão no meu caminho.Agora tem outras travessias, mas menores.Depois de quase oito horas remando, parei junto a uma gigantesca árvore cuja copa deve ter mais de 10 m de circunferência.A noite toda o vento balançou forte a barraca, ele virou, agora vem de SE, antes vinha de SW.Talvez amanhã seja pior que hoje, mas meus soldados estão preparados para a peleia.

Não podemos entregar pros homens, amigo e companheiros, pois não está morto quem peleia.

24/07/05 domingo dia 37Parti só às 9:40 h e resolvo tocar direto para a barragem de ilha Solteira.É um misto de barragem e ponte. Chego lá quase duas horas depois, encosto próximo das turbinas, desço e vou a pé na direção da guarita. O segurança vem e me intercepta de moto. Está surpreso de como cheguei aqui.- De barco!- Que barco?Aí ele vê o caiaque entre as pedras, é gente boa e quer me ajudar.Hoje é domingo, não tem caminhão, Zezinho disse para eu cruzar para uma praia do lado de SP. - E as turbinas?- Pode passar, estão desligadas.Estou chateado, acho que apenas fui "despachado" com a estória do domingo.Chego na praia, mal desembarco, dosi soldados dos bombeiros já me esperam com viatura e reboque, nem acredito!Eles me levam para o porto depois da usina.

Pessoal, estou há cinco horas e vinte digitando, tenho que partir amanhã, desculpem mas escrevo mais na próxima.Um abraço.André

Buenas pessoal, acabei de chegar em Guaíra depois de remar por cinco horas consecutivas. A barra anda meio pesada por causa dos bichos e da região de tráfico e contrabando.Tenho dormido direto de punhal na mão, instinto de sobrevivência em nível máximo, mas faz parte.

Saí de Presidente Epitácio no Domingo, dia 31/07/05 depois de uma noite fria num conteiner de aço. DePaula e Da Silva ajudaram a colocar o barco na água. Manhã muito linda, vou seguindo os altos barrancos protegidos por concreto. Vou remando por 3 h até que passo da city e começo a navegar rumo a pontais que se sucedem.São travessias longas e monótonas pois não vejo quase os bichos e fico pensando nos amigos e parentes.O vento aumenta, as ondas começam a passar por cima mas peguei uma confiança bem grande no caiaque e nem chegam a preocupar, apenas incomoda para manter a rota.Campos e mais campos e margens desmatadas, as únicas árvores preservadas são aquelas que a barragem deixou submersas.Passa o dia e acampo embaixo de uma solitária árvore ao lado de uma enorme que tombou no rio.

Recuperei o sono, mas fiquei muio cansado.

01/08/05 dia 45Havia um pouseiro de anus(eles dormem um ao lado do outro para se aquecerem) e os corninhos cagaram a noite toda em cima da barraca...Agora tenho uma barraca camuflada... de bosta!Parti com vento de través no sentido N-NW.A exemplo de ontem, vejo muitas tartarugas descansando sobre troncos ou mesmo em troncos submersos. Depois enormes cascudos que estão na areia ou em galhos com limo. Tentei voltar para fotografá-los, mas é claro que eles não ficam esperando sorridentes para as fotos. Desisti!Quando vejo os bichos já estou passando, é muito difícil.Depois de muito tempo vendo campos, entro numa região de muita mata e vejo um bando de bugios.Pego a filmadora e deixo o caiaque a deriva enquanto filmo. O macho é bem preto e as fêmeas são marrom esbranquiçadas e todos tem uma barbicha.Um estrondo, o caiaque bate num tronco e quase deixo a filmadora cair, solto um palavrão e os macacos se vão.Um pouco adiante paro sob a árvore onde um macho come as frutas e não me vê. Na hora de filmar o caiaque passa com a corrente e preciso remar, acabo fazendo barulho, ele me vê e se vai, mierda!As primeiras três horas de remo são suportáveis, depois do almoço divido de duas em duas, mas acho que o ombro esquerdo está indo pro pau, incomoda muito. O sol forte obriga a molhar a camiseta para refrescar. Vou rumando de pontal em pontal, já não sei mais onde estou, passei por muitas entradas de riachos. Meu negócio é remar minhas sete horas, dormir e fazer o mesmo no dia seguinte, não adianta saber onde estou.Na última hora sou obrigado a colocar o boné com mosquiteiro, pois os insetos vêm no rosto.Quando chega no fim do dia penetro em zona de floresta fechada, difícil de acampar. Encontro Davi e Carlos que indicam um local que eu não teria visto da água. Valeu!

Armo a barraca no alto do barranco, vejo o final do dia e as luzes de uma city, deve ser Anaurilândia em MS, é minha única referência.

02/08/05 terça dia 46Hoje a Angela, minha irmã, está de aniversário, parabéns!Estou ao pé de uma enorme árvore que em breve vai cair no rio, como outra enorme que já caiu. Os papagaios parecem conversar e jogam as cascas bem em cima da barraca enquanto os filmo, são uns folgados!Parti só às 9:10 h, desisti de chegar hoje na barragem, pois se estou de frente para Anaurilândia, devem restar uns 60 km até a barragem de Porto Primavera onde tem eclusa.Uma hora depois entra um vento NE de forte a médio e meu rumo é de W-SW e isto muda tudo. Resolvo tocar direto as três horas de sempre e ver o que acontece. Traço linhas as mais retas possíveis, sempre longe da costa.As ondas já beiram um metro, algumas passam por cima, principalmente ao me aproximar dos pontais onde as ondas retornam e onde fica mais raso e elas ficam mais fortes.Segura peão! Tu não pretendes enfrentar o mar?Paro para almoçar depois de um pontal, queria ver o que havia do outro lado, vejo apenas pontas e mais pontas ao longe.Não me conformo, pego o binóculo, escalo o barranco e olho adiante.Agora consigo ver uma estranha formação ao longe, só pode ser a represa, para cruzá-la, tenho que chegar lá até às 18 h.- Brody, acho que dá para encarar. É só remar sem descanso até chegar.Com esse vento é possível.Volto pro caiaque com um plano: 1h para chegar na primeira ponta, a segunda hora até um mato verde claro e a terceira até a represa.Parto às 13 h sem vacilar, o ombro que me desculpe.As ondas estão cada vez mais fortes e irritam ao forçar o caiaque a mudar de rumo, parece de propósito e isto causa ataques de fúria galopante e sobra pro caiaque:- Não é pra lá, seu corno!- É pra lá! Tu tens que ir pra onde eu quero e não onde tu queres!E remava com fúria para corrigir o curso; aí vinha uma sequência forte de ondas de través e eu ficava quase enlouquecido, remando e gritando palavrões aos berros contra as ondas e o caiaque.Passam 2:30 h, estou cansado mas vejo a represa cada vez mais perto, quero descansar, mas o espírito diz:- Vamos cara, é só mais uma hora, estás perto, lá tu descansas!Não vejo a eclusa, então vou direto para o centro da represa que está contra o sol.- Cara, toma cuidado! Se entrares na correnteza das turbinas vais te dar mal. O engenheiro de Jupiá falou que nem barco com dois motores sai de lá.Então vou mudar de tática, seguirei as bóias de sinalização, embora elas sigam para o centro da represa. Quando chego numa, consigo ver a próxima.Passo por uma de bombordo e vejo a próxima, mas não dá para ver a cor, pode ser uma de advertência.Como há o refluxo das ondas que voltam da represa, enormes ondulações vêm em sentido contrário. Chego na bóia seguinte, é uma de boreste(verde), mas não vejo a eclusa. Olho para os lados e vejo as próximas, estão próximas da margem de SP, bombordo e boreste, acompanhadas de uma amarela, de advertência.Entro no canal de acesso(16:30 h) depois de remar quase direto por 6:30 h.Há um rebuliço enorme de ondas mas consigo encostar junto a umas pedras ao lado do portão da eclusa.Mal encosto e já vem um segurança; é Eudes, super camarada que ajuda a puxar o caiaque. Falo ao telefone com José dos Santos, ele opera a eclusa e diz que é mais fácil eu passar pela eclusa do que arranjar um transporte.Legal, vai mudar a rotina de novo. Show!Fico a deriva por uns 20 min enquanto enche a eclusa. Finalmente desce o portão de acesso. Recebo ordens de entrar. Remo até o meio da eclusa e amarro o caiaque na lateral da eclusa, onde têm bóias móveis que sobem e descem por trilhos nas laterais da eclusa.Estou maravilhado! Agora as águas começam a escorrer das paredes e a baixar. Vou filmando e fotografando enquanto descemos longos 17 metros...A sensação que dá é que tu vais sendo baixado numa cova bem profunda, he, he!O José olha lá de cima da torre de contrôle, ele anotou meus dados, orígem e destino, balança a cabeça, não acredita naquele inseto de barco na eclusa:- Tu és louco!Aceno para ele e Eudes, são 18 h. Em 10 min. vai se por o sol. Terei de viajar no escuro at´e uma praia há 7 km que Eudes indicou ou achar um local antes.O portão de saída sobe, barulho de água escorrendo, o rio surge na minha frente, estou livre das ondas.Vou saindo entre as paredes de concreto e sigo por barrancos cobertos de cimento com centenas de canos de drenagem, parece um paliteiro...- Há local para acampar ali...-Não, aqui tem muito barulho.Saio do canal, entro no rio, há barcos grandes na margem. Ouço um latido peculiar, é uma capivara só de cabeça de fora enquanto me observa.Nuvens de mosquitos infernizam. Escurece de vez, as margens se tornam borrões, deixei de parar em dois bons lugares:-Saquei o teu lance, seu palhaço, tu queres fazer o máximo de kms e eu que me rale remando...Quebrei o pacto de não andar de noite, nem pensar de encostar, estou sem lanterna que ficou no compartimento da proa. Agora só enxergo o rio e um farol na ponta da ilha que demarca a entrada.Chego na tal ponta onde deveria haver a praia mas tudo está escuro como um breu, noite sem lua.- Viu? Eu te avisei! De castigo, vais remar a noite inteira pelo meio do rio, pois filho de meu pai não encosta em floresta de sucuri à noite.Vejo uma luz fraca ao longe, mas logo se apaga. Ando mais um pouco e finalmente vejo luzes.Paro junto de uma forte, peço licença para o morador e monto a barraca ao lado da rampa de barcos.Aparece Gabriel, seu aparecido e Aldo, eles querem que eu và para sua casa, mas prefiro ficar ali, aceito o convite para um banho quente, janta deliciosa. Aldo e Gabriel caçam enormes jaús de arpão. Eles mostram fotos onde aparecem mais de oito enormes jaús de mais de 50 kg, maiores do que um homem.03/08/05 quarta dia 47 Agora de dia vejo como é bonito o local onde parei. É um canal que se forma entre a ilha em frente e as casas lado a lado ao longo dele. Tem pescador que não acaba mais. Agradeço aos amigos e sigo pelo canal. O caiaque desliza rápido na forte correnteza de águas límpidas e rasas. Fico impressionado com a velocidade, pois vejo o fundo passando muito rápido há uns 30 a 40 cm por uns 1000 m, depois afunda para 3 m e acaba a ilhota. Surge um fraco vento de popa e fica covardia. As bóias das cevas demonstram a força da correnteza favorável. Às 9:50 h estou passando pela bela praia da cidade de Rosana. Às 11:30 h chego na foz do Rio Paranapanema, que faz a divisa de São Paulo e Paraná, para boreste fica o MS.Tenho que parar em uma pequena ilhota que há ali para filmar e fotografar, pois o vento e a correnteza estão muito fortes.Ilhas, muitas ilhas. Ora sigo junto a elas ora pelo meio do rio.Estou cansado de remar 7:30 h ontem, mas só vou parar às 13h, 3:30 horas depois de ter saido.Sol forte, já passei por porto S. José e resolvo atravessar o rio e parar em porto Rico para dar notícias para meu pessoal.Um picolé, um suco de laranja e sigo por mais uma hora parando antes, pois só vejo florestas densas para a frente.Acampo numa parte inclinada, arrasto com esforço o caiaque para cima. O mato ficou fechado, sinto perigo no ar, meu instinto de bicho se aguça.Armo a barraca com meu chapéu de legionário com mosquiteiro, pois hordas de moscas, mosquitos e borrachudos infernizam enquanto armo.Tudo pronto, sento no barranco e fico olhando o sol se por do outro lado do rio.Muitos peixes saltam atrás dos frutos que caem de uma figueira, bandos de garças sobrevoam as águas em busca de lugar para passar a noite.Cara! É lindo demais!Entro na barraca, vejo o final do dia através da tela enquanto os mosquitos tentam entrar.Só de ruim, espero eles pousarem na tela e dou "petelecos" bem na barriga deles.- Esse não faz sexo por pelo menos uma semana!Como é bom ser mau! He, he...Aqui é selvagem, não estou seguro. Resolvo dormir por fora do saco de dormir com o punhal na mão!Estou me sentindo tal qual um alpinista neste terreno inclinado.Deito, escorrego, subo um pouco; até o final da noite terei feito o equivalente do acampamento 1 até o topo do Everest...Pelas 3 h acordo com passos quase ao lado da barraca:- E aí, seu bunda mole? - Vai só ficar escutando a noite toda como fez com o chupa cabra?É verdade, chega de ficar me preocupando a noite toda. Acho qa lanterna e dirijo o foco na direção do barulho.É uma enorme capivara, um macho. Nunca vi u m tão grande, ele fica desorientado com a luz em seus olhos.

Como é que um bicho destes (uns 70 a 80 kg) faz tão pouco barulho? O maldito tatu fazia um barulho dos diabos.

04/08/05 quinta dia 48Sigo pelas 9:30 entre centenas de ilhas, ouço o ronco dos bugios, bem-te-vis e outros.Remo sem camisa e com o boné de legionário para proteger os ombros.- Tu não levas protetor solar?Gaúcho que se preza morre de cancer de pele mas não usa protetor, creminhos e outras frescuras...Há um princípio de motim a bordo, mas é punição por ter saído tarde.Paro só às 13h, início de uma ilha e fim de outra. Água límpida, sol forte, urubus e muita mata virgem. Remo mais 4 h, nada de local para acampar. Parece haver uma praia ao longe, é Porto Natal, lugar lindo e bucólico. Sou bem recebido por todos janto e acabo dormindo ao lado da rampa.

Sr. Deleo, Tião, Marlene e Edson são muito bons e amigos.

05/08/05 sexta dia 49Cedo já tem muita gente em roda, estou atraindo curiosos...Arrumo tudo, tomo um café e me vou.Seu Tião fala dos ataques de tamanduá, diz que ele abraça a pessoa de frente, enfia a língua pela boca ou nariz para sufocar e que suas garras são como navalhas.-Meu amigo perdeu um braço e ficou com as tripas de fora quando o tamanduá lhe atacou.- Por isto ele não fugiu quando te viu, ele não tem medo......E eu quase desci do caiaque para filmar mais de perto aquele que encontrei no MS...Fala das sucuris, de uma de 8 m que mataram e de uma que matou um homem...Despeço-me e vou em frente:Estou me sentindo bem, sem dores e a manhã está linda:- Tenente Issi!- O que é isto?- Isto aqui está parecendo uma gôndola de Veneza! Só falta uma camisa listrada.- Que cantoria é esta?- Euforia, senhor!- Recomponha-se!Vejo pássaros, estou viajando em pensamentos quando, de repente, um pouco para trás, duas capivaras entram aos gritos no rio...Eu até já havia passado por elas...Tomei um susto dos diabos, carajo!- Vão pro diabo! -Vai dar susto na tua vó!São umas histéricas, eu até já havia passado por elas....Passo por muitas capivaras.Ao meio dia estou passando por porto Camargo, disseram que eu não chegaria ali hoje...Estou há 1 km de cada margem e passo sobre um banco de areia , a água fica super rasa, quero descer mas a corrente é forte, então só filmo e fotografo. Remei direto por 4 h, hoje quero remar oito...Entro por um estreito canal onde tem muitas casas de taquaras, plástico e palha. Tudo fica para trás, apenas matas a perder de vista, não vejo mais ninguém. Passam as horas, sinto que estou em fria.Estou há meros 3m dq margem quando vejo um enorme jacaré na base de um barranco. Faço a volta contra a forte correnteza e tento me aproximar o máximo possível para fotografá-lo. Ele deve ter mais de 3m.- Cara, não estás muito perto?Dá para ver os dentes dele. Ele me cuida e quando quase passo uma folhagem para tirar a foto ele vem para a água.Aí eu caio na real:- E se ele vem pra cima de mim?- Te manda brody!Travo o caiaque e deixo a correnteza me levar, fiquei impressionado!Desisto de achar lugar na margem.- Tenta as ilhas!Na margem desisti de achar local, atravesso e vou até as ilhas, pelo menos os barrancos são mais baixos.Encosto desesperado, abro uma picada com o facão para o caiaque, subo e abro outra para a barraca. Estou no sufoco, inseguro, local barra pesada.A noite será longa.E foi, vários bichos rondaram a barraca e a mão chegava a dar cãimbras de tanto apertar o cabo do punhal.Eu não tenho para onde fugir, seja o bicho que for, terei que enfrentá-lo aqui Cochilo às vezes, me vejo esfaqueando sucuris, tenho que enfiar o punhal entre as escamas ou na boca, são os pontos frágeis.Vários já disseram que facão não corta ela, ela parece um pneu de carro, porisso o punhal, só uma ponta afiada para penetrar entre as escamas, é minha única chance...

Eu nunca vou estar em segurança até que chegue o último dia.

06/08/05 Sábado dia 50Amanhece nublado, praticamente não dormi. Parti às 9:30h e meia hora depois surge uma lancha. É da polícia florestal:- De onde tu vens?- De Brasília!- Não, onde tu colocou o barco?- Em Brasília!Custa a cair a ficha, ele não entende a princípio, depois abre um largo sorriso.Diz que estou penetrando em zona perigosa, que o perigo são os homens.Tem coisas que ele não falou e que ficarei sabendo só depois, como ele disse:-Vai pela margem que é mais seguro!Sigo em frente, mais adiante a lancha se aproxima de novo, agora tem umas seis pessoas. Todos de uniforme camuflado, aqui é um parque nacional.O mais velho deles e que parece ser o chefe tira fotos de mim, diz que é para mostrar para os amigos...Após 3 h encosto em um rancho abandonado na ponta de uma ilha. Almoço ao lado da cabana, espio pelas frestas, é3 de chão batido, beliches, um fogão rústico. Há uma clareira ao redor e um arremedo de roça de batatas com cinza de fogão por cima.Não mexo em nada.Escuto passos de bichos mas não se aproximam. O Brejo é muito alto; estou sempre com o punhal na mão, esse lugar não dá confiança.Sob um mormaço vou desanimado até encontrar um barco de pesca e descobrir que estou há menos de 40 km de Guaíra. Fiquei muito feliz, pensei que estivesse há dois dias de lá chegar. Este caiaque deve estar voando. Deve ter dia que andei próximo dos 60 km, ante3s fazia uma média de 30 km/dia...Às 15:30 horas chego em porto Brington (braiton), há uma rampa, muita gente de lancha.Logo o pessoal fica sabendo de onde venho e tira fotos de mim e do caiaque, virei atração turística.Resolvo almoçar por ali,e vou ficando. Seu Dinho é muito legal e conta que nestas ilhas tem onça a dar com um pau.- Nas ilhas? E tem o que elas comerem?- Tem muita capivara!Ele prepara um peixe a milaneza, arroz, feijão, salada e uma carne de porco deliciosa.- Essa eu peguei com 70 kg e tinha 139 kg quando matei...Ele vem com a mesma estória das sucuris, só ataca quando têm fome...- Elementar, meu caro Watson!E eu dormindo nas ilhas...Seu Dinho brinca dizendo que os passos que ouvi esta noite talvez não fossem de capivar...Por isto o guarda falou que no continente era mais seguro...Como pretendo parar em Guaira e só faltam 30 km, não fará diferença seguir mais um pouco, melhor dormir em um local seguro, estou precisando descansar. Estas últimas noites não foram das melhores.A noite chega, seu Dinho me chama num canto:- Tá vendo aqueles dois caras de moto?- Não d´confiança para eles, o cara vive na cadeia...- Pô, eu até tirei foto deles com o senhor.Pior, seu Dinho não fica aqui, ele vai para a cidade e pede que eu cuide aqui...Vai todo mundo embora, inclusive ele. Os caras subiram a e3strada, certamente vão voltar, pois não temsaída. Resolvo não montar a barraca enquantoeles não passarem de volta, não quero que saibam que fiquei por aqui.- Mierda!Chegam os últimos pescadores que estão fora. Marcos me dá uma cerveja, pão e presunto. Ele insiste e eu aceito. Vejo os caras da moto passarem, nem me viram. Armo a barraca e vou ditar.AScordo, algum bicho está em roda. Durmo.Lá pelas tantas surge um cara de carro, ele desce ao lado da rampa e fica ali, super estranho.Fico espiando pela fresta, surge um barco na escuridão, o cara esperava por eles. Desembarcam 4 fardos pesados e levam para o carro. Depois todo mundo vai embora, acho que são capivaras mortas.Ou não me viram ou ficaram na deles.- E aí seu André! Sentiu o que terás pela frente?- Gostou da "noite segura?"

Pois é já é meia noite e não dormi direito, ainda tem bichos em roda, irritei-me e fui lá no caiaque pegar a lanterna.

07/08/05 Domingo dia 51Arrumei tudo cedo, tomei um café com seu Dinho e partí às 8:30 h.Fiz a travessia passando por porto Irara e fui costeando a ilha Grande ou Sete Quedas, a ilha cheia de Onças.Vejo algo ao longe, uma hora depois.Parece um tronco claro, mas é cheio de pintas circulares.- Cara, aquilo é uma Sucuri!Está entre os galhos, paro de remar, pego a filmadora, tiro fotos...-Volta e desce o rio mais perto dela!Meu coração está aceleradíssimo o bicho é enorme!Eu nunca tinha visto uma é simplesmente descomunal.- Tenente Issi, temos que nos aproximar mais...- Tá louco?- Ela está na superfície, deve ter comido algo e não vai te atacar!- Merda! Eu estou todo cagado e tu queres que eu vá lá perto neste rio cheio de correnteza para fotografar aquele monstro mais de perto?- Afirmativo, positivo, operante!- Bosta!Se esse caiaque virar vou nadar até Guaira em cinco minutos.Subo o rio de novo e deixo o caiaque ao sabor da correnteza e desço fotografando e filmandoEla deve ter uns 4 a 5 m, quase do tamanho do caiaque, dá pavor e medo ao mesmo tempo. Sinto um cheiro de podre, ela está morta.Fiquei macho, subo e encosto no bicho, tiro fotos com o punhal no couro dela.- Tenente Issi, vamos registrar que ela morreu de medo ao cruzar com nossa patrulha Farroupilha!E me vou, remando pr cinco horas direto até cruzar com a ponte de Guaíra, acabou Mato Grosso do Sul. Agora estou entre o Brasil e o Paraguai, muitas aventuras pela frente. Que Deus me ajude!

É isto aí meus amigos, deixei o caiaque numa marina e escrevi até agora(22:14h). UM ABRAÇO PARA TODOS E ATÉ A PRÓXIMA.

Oi, fui tomar um sorvete e como não sei quando vou acessar de novo resolvi terminar até hoje.

Os soldados me deixam na rampa e se vão. Resolvo almoçar no restaurante ao lado. Está ventando forte e tem muitas ondas, já estou acostumado.Alguns vêm perguntar de onde venho e outros, como Bilu e Cabelo vão mais além. Eles me presenteiam com uma gorra de lã e dão boas dicas de como será para a frente.Parti só às 15:35h, depois de ter falado com os sobrinhos, a cunhada, o brody e a mãe.Fui orientado a seguir pelo lado paulista. Logo ao partir, passo por uma pequena ilhota cheia de garças que se abrigam do vento.Sigo em frente, a barra não está fácil, vento de rajadas contra e aumentando.À medida que avanço a situação piora, pois além das ondas e do vento muito fortes, percebo que estou entrando em uma região de mata muito fechada que se debruça sobre as águas e não permite desembarque, é uma trama de galhos que não deixam ver terra firme.A ilha da ferradura que eles indicaram está muito longe e no contravento, acho que não chego lá de dia.0- Cara, na próxima brecha que achares no mato entra, pois a coisa está ficando feia pro teu lado e vai piorar!Duas lanchas avançam com muita dificuldade e isto que elas vêm a favor do vento e das ondas. Está cheio de mulheres e crianças, algumas gritam de medo, dá para ver que todos estão tensos e o piloto manda as crianças abanarem para mim. Todos abanam, quebra a tensão deles por uns momentos.Está próximo das 17 h e não achei brecha nenhuma se forçar para entrar entre os galhos certamente irei virar com a força das ondas.É melhor nem tentar. É muito estressante!- Acho que terás que cruzar para a ilha neste mar, pois lá tem rancho de pesca.Vejo um bambuzal e uma pequena brecha que permite ver que entre eles dá para montar a barraca.- É ali, é tua única chance!Concordo plenamente, aproximo, mas está brabo, recuo e tento mais duas vezes. Coloco o bico da proa entre um tronco e uma barra de ferro próxima do barranco e consigo.Ali é raso e consigo descer e puxar o caiaque antes que as ondas o inudem.Felizmente foi tudo perfeito, nem acredito que deu certo, estou em segurança.

Agradeço a Deus, estava em situação muito difícil, bem agoniado.

25/07/05 segunda dia 38Que noite fria, não foi fácil. Fui lá fora e vi uma cotia passando devagar a menos de 10 m. Parece uma capivara em miniatura, um pouco maior que um gato mas sem o rabo.Meio preguiçoso, fui arrumando devagar e apressei quando ouvi trovoadas.Parti às 9:30 horas cruzando próximo da ilha da Ferradura para o MS, pois do outro lado estava menos pior.Fui o mais rente possível da margem, seguindo entre plantas aquáticas e juncos enormes. Havia muitos troncos submersos, algus , para fora d´água funcionavam como vasos e algumas plantas cresciam neles.Gaviões caramujeiros de patas vermelhas davam grasnados enquanto me aproximava.Pelo menos continuo avançando em mais um dia muito ruim de vento contra. Por aqui a distância é bem maior mas do outro lado iria pegar as ondas com toda sua força.- Bela decisão tenente, parece que estás aprendendo sobre táticas de guerrilha, se o inimigo é mais forte, tem que usar de astúcia.Fui aproveitando e vendo todo tipo de garças, frangos d´água, marrecas piadeiras, patos, papagaios e araras.Um pouco mais adiante vi uma ariranha demarcando seu território sobre uma balsa de pescadores entre os juncos.Ela urinava por tudo e foi para a água quando me aproximei.Ela segui na minha frente enquanto eu costeava os juncos gigantes. Filmei um casal de araras numa árvore próxima.- E aí soldado Maktub, virou "aparador de junco" ?- Mazelas da guerra, senhor!Após 3:20 h paro para almoçar e vejo chuva para mo lado de onde eu vim; ainda dá para ver a represa e a cidade de Ilha Solteira.É o quarto dia de vento contra, estou cansado e começo a fazer musiquinhas idolatrando o vento e seus "progenitores".Atravesso a foz do R. São Marcos e vejo um tamanduá a menos de dez metros bem na beira. Ele não me viu, deu tempo de filmá-lo e fotografá-lo.Procurei local para dormir na boca de um riacho, mas o capim era muito alto:- Quem tem medo de sucuri?Lembrei dos três porquinhos...Paro adiante num barranco, tiro as coisas rápido, pois choveu durante a vinda e ameaça chover de novo. Armo a barraca longe do caiaque dentro de um mato mais abrigado enquanto um pica pau de cabeça vermelha batuca nos troncos. Vejo pegadas diferentes, parecem de onça...

Anoitece e chove, está bem frio de novo e a noite se torna longa.

26/07/05 terça dia 39Daqui já posso ver a represa de Jupiá, umas 3 ou 4 h de viagem.- Senhor!- Fale cabo!- Lamento informar, mas o cabo PH se foi...- E o sargento bujão? Disseram que ele não passaria de hoje!- Está firme senhor, preparando a refeição da tropa.- Este merece uma medalha de bravura. Trinta e nove dias...Parti às 9:45 h, sigo pela margem quando vejo um mutum (todo preto e com melecas amarelas em volta do bico).Aproveito a parada para o almoço e tomo um banho e faço a barba, tenho que chegar meio apresentável na barragem.Atravesso a foz do rio Sucuriu que deve ter uns 5 km de largura e depois toco direto para a represa tentando descobrei onde fica a eclusa. Chego lá às 14:20 h desço e vou falar com o segurança Fernando.Sou bem atendido por todos, os engenheiros explicam que nãao dá para passar pela eclusa, explico que só quero que um caminhão me deixe do outro lado. Ser da marinha e ter uma carta de ciência pela capitania dos portos de Florianópolis está ajudando demais.Fernando fala que pegaram uma gibóia aqui na frente e que uma sucuri atacou seu amigo dentro d´água e de dia...Ele só se salvou porque seu amigo foi ajudá-lo e conseguiram matá-la.Que merda, eu nestava tranquilo e agora essa da sucuri atacar de dia...Punhal no punho de novo seu André!Seu Teixeira resolve o problema e providencia um caminhão. Eles me transportam para baixo, o pessoal é muito legal. Já passa de 17 h, apenas tenho tempo de comprar algo no buteco da vila do lado de MS e desço uns poucos metros apenas para passar a noite. Um barranco cheio de mosquitos uma fábrica atrás do mato e o barulho de trem que passa um pouco acima.

Outra noite ruim e a perda da tranquilidade lembrando os detalhes do ataque da sucuri. Já é o segundo caso que ouço.

27/07/05 quarta dia 40Acordo com o barulho de um casal de papagaios ao lado.Parti quase 10 h, fraco vento contra e boa correnteza a favor.Uma hora depois chego na ilha Comprida e minhas preces foram atendidas.Há um canal entre a ilha, a paisagem é linda, está tudo espelhado e vou passando por diferentes linhas de barcos de pesca apoitados perto das cevas.Cheguei a filmar e fotografar cerca de dez barcos apoitados em linha.Sigo em frente, passando por diversos bandos de bugios bem pretos entre a densa vegetação da bela ilha. Há bandos de macacos prego.Depois de duas horas chego no fim da ilha e vejo, no lado de SP uma pousada que serve refeições, bem na minha hora de parada...Isto é um sinal dos deuses, é melhor não contrariá-los e almoçar.Almoço, converso com o pessoal, a família do Gino e uma gatinha tri bonitinha, mas eu tenho meu caminho. Ela perturbou minha alma de pecador. Passo por dezenas de pescadores apoitados no sol, que dureza!Agora tem muitas casas flutuantes,balsas e bugios.Num determinado momento cruzei com nove, depois onze e numa terceira linha sete barcos apoitados lado a lado. Depois de seis horas remando, estou com o ombro esquerdo incomodando e já começo a pensar em acampar. Aqui tem muito mais ilhas que no meu mapa, paro uma lancha que passa e acampo em uma ilha bem pequena, num barranco atrás de um rancho flutuante. O local é lindo demais, tem bancos e muito lixo mas está arrumado dentro de sacos.Armo a barraca assisto ao por de sol e vou para a barraca para escapar dos mosquitos.Acordo mais tarde, está bem escuro, lembro que esqueci a capa de chuva no caiaque e vou lá fora.Estou ali com a lanterna ligada quando um bicho vem amassando os galhos espalhafatosamente na minha direção. Não consigo vê-lo e corro para a barraca para pegar o punhal. Entro de chinelo e tudo, fecho o zíper e o bicho vem atrás. A lanterna não acho mais e de punhal em riste escuto sua respiração ao lado da barraca, penso em onça..Estou às escuras dentro da barraca, com o bicho ao lado e tateio sem achar a maldita lanterna... Merda!Quase espetei a barraca e acendo o bujão de gás, talvez o fogo o afaste.O fogareiro acende e acaba o gás. Fico no escuro de novo, nem dá de ficar brabo, estou como um bicho acuado dentro da barraca.O chupa cabra se afasta um pouco e acho a lanterna .Foco na direção do barulho e não consigo ver nada, mas ele retorna e se afasta quando encosto na lona.Sinto que será uma longa noite, não posso sair no escuro e a ilha é muito pequena. Certamente ele voltará.Basta eu pegar no sono e lá vem o barulho de folhas. Pelas 4 h da manhã, invocado, abro o ziper e ilumino em volta.Consegui focar o chupa cabra; era um maldito tatu...Vai se ....- Seu merda, com é que vai ter onça numa ilha tão pequena?- Ela pode vir nadando...Ouço alguns grunhidos, os tatus volta e meia retornam. Não fico tranquilo dormindo ao lado da água sabendo que tem sucuris. Durmo com o punhal na mão e brabo comigo por não ter reativado o aparelho de choque.

Estas noites estão muito longas. Parei de tossir vou tentar dormir mais um pouco.

28/07/05 quinta dia 41 - Senhor! Durante a refrega com o chupa cabra o sargento Bujão teve uma parada, ainda respira mas já não pode mais fazer o rancho da tropa.- Substituam-no pelo soldado foguinho. Preparem o funeral do sargento com honras de herói; ele merece.- Esta campanha será longa e terá muitas baixas, teremos que recrutar mais soldados.Parti deixando a pequena ilha como uma noite diferente, fui deslizando entre várias ilhas, passando por canais até chegar numa barcaça de areia uma hora depois.Fotografo a barcaça que é controlada por dois caras legais, André e Fabio, do barco Paulluci.O canal parece terminar, estou saindo por um valo lateral, os caras da barcaça sinalizam para seguir em frente. Aposto corrida com eles por uns 500 m e depois se vão. Sigo em frente até chegar numa ponte em construção que ligará a cidade de Paulicéia ao MS. Paro para almoçar depois da ponte e sigo em frente, já passando da cidade de Panorama.Uma lancha vem na minha direção é André e Fábio, eles perguntam se eu levo um motor escondido pois dizem que estou andando muito.Fiquei super feliz. Eles me dão água e nos despedimos pela terceira vez.Uma hora depois de Panorama penetro sobre uma floresta inundada. Como a água é transparente, parece que o caiaque está sobrevoando a floresta que posso ver até uns seis metros de profundidade. Vejo os galhos das copas daqs árvores, os galhos e os troncos, só que em vez de folhas, agora o limo e as plantas aquáticas se unem aos galhos agora mortos.Às vezes o terreno sobe, antigos morros, a profundidade cai para poucos metros e muitas árvores mortas estão semi submersas formando paisagens surrealistas onde o Maktub vai deslizando sem fazer barulho.Remo por mais de 4 h seguida e sou obrigado a remar com força, pois o local que escolhi de longe não é bom.Acabo contornando um pontal até achar uma enorme árvore tombada no rio e uma pequena ao lado de um trilho de vaca.

O campo é de grama baixa e creio que vá passar uma noite tranquila.

29/07/05 sexta dia 42Que sacanagem, aqui era pouseiro de anus, eles dormem um ao lado do outro e cagaram quase toda a barraca.Parti todo dolorido de ontem, estou remando, em média acima de 7 h.Sigo entre florestas, pergunto a dois pescadores legais onde estou e dizem que é a foz do rio do Peixe. No meu mapa era uma linha reta, agora um imenso lago com quase 10 km de extensão. Eu estava indo para o lado errado. Paro para almoçar em outra ponta, um local lindíssimo. Remo mais duas horas paro para tomar banho e fazer a barba. Estou exausto. Pergunto para dois pescadores e eles apontam numa direçao que pensei ser o MS.Não posso vacilar e me vou para uma travessia que pensei que fosse durar 2 h e durou quatro.Quando chego na costa, falo com uns garotos e, para minha surpresa descubro que cheguei em Pres. Epitácio.Falo com um pessoal de um estaleiro e descubro que aqui tem uma sede da Capitania dos Portos.Encosto na rampa próximo de uma ponte deste rio.O marinheir Ribeiro e Fábio ajudam a colocar o caiaque no galpão. Ele liga para o comandante Abrahão que manda o sargento Gomes verificar e ver se não me falta nada.

Pô cara, que legal, como é bom ser bem recebido!

30/07/05 sábado dia 43Hoje saí de manhã, fui agradecer na Capitania a gentileza, super e comprei roupas. Não vão acreditar,, fiquei escrevendo por mais de oito horas. São 23 h, vou retornar para a capitania e partir amanhã de manhã.É isso aí meus amigos aqui foi mais um pouco de aventureas, amanhã a viagem continua. Dos 5000 km, já fiz pelo menos 1000 km.Um baita abraço!

Olá amigos !Saí tarde da Lan house e soprava um vento fortíssimo e gelado. Seguir a noite e a pé até o porto com risco de chuva...Ninguém merece!Paro em um hotel e descubro que a diária não é tão cara e resolvo dormir por aqui. É muito tarde, ligo para a marina avisando que vou dormir por aqui.Depois de 51 dias de viagem, vou dormir numa cama com lençóis, tv e banheiro. Estou feliz, vou dormir em segurança.Agora são 3:04 h da madrugada, assisto a um filme de Jack o estripador enquanto escrevo o diário. Não preciso dormir, apenas estar deitado em uma cama assistindo tv é o suficiente.Hoje, 8/8/05 a batalha continuará; entrarei em território diferente, sem ilhas, zona de tráfico e contrabando e sem proteção contra as ondas que as ilhas davam.

O local onde quase deixei o caiaque antes era barra pesadíssima, quase entrei em fria, mas acho que agora está tudo bem, pois o local onde deixei tem acesso restrito e a guarda municipal vigia 24 h.

8/08/05 Segunda dia 52Cara, entrou uma frente fria e ventou a noite toda. Em Porto Alegre a temperatura baixou 20 graus em um dia...Tomo um café reforçado no hotel e vou até o museu agradecer a Nilza que me deu um toque sobre o lugar onde eu havia deixado o caiaque. Talvez não houvesse nada quando eu retornasse da internet...Que frio dos diabos!Eu só de camiseta. Filmo os bichos empalhados do museu e vejo fotos da city antes da represa.Sigo para a marina e lá encontro seu Aguiar que é major da reserva e agora é o chefe da Guarda Municipal. Ele é super simpático e me convida para tomar um café. Estou tremendo, nariz pingando e espirrando.O rio está que é um mar, mas tenho que seguir, não adianta querer ficar quentinho.O pessoal vem assistir a partida, mas ali fora o vento gelado está terrível e eles vão desistindo enquanto eu arrumo as coisas.Que dureza!É um vento cortante e as ondas me esperam. Parto só às 11:20 h, ondas furiosas me atacam assim que saio da marina, algumas pessoas que estão por ali correm para ver o caiaque ir de encontro às ondas mais fortes que pegarei ao passar por um navio atracado e pegar o vento de frente.Ondas furiosas e desencontradas que batem no porto e se chocam com as que vem.O caiaque parece um cavalo xucro e pula enlouquecido enquanto o vento gelado empurra os respingos para cima de mim, muito esforço para pouco avanço.Os dedos, já congelados, puxam firme o remo e seguimos na direção de uma pequena ilhota onde há uma torre de alta tensão.Há muito capim flutuante, as ondas pegam de proa e vou congelando aos poucos. Passo por este pontal e vou parar só às 12:50 h no fundo de uma enseada junto a uns barcos onde tem uma clareira no capinzal. Tenho que comer rápido, pois só de calção é melhor ficar no caiaque onde a capa protege as pernas do vento.O vento parece ficar mais furioso e frio. Apesar de tudo,vou em frente. Tenho que parar mais cedo. No lado paraguaio estaria mais abrigado mas a margem é tomada de selva sem possibilidade de parar para descansar. Passo por vilas de pescadores, um deles pergunta se vou seguir com "este mar" .Tchê! Como está frio! O vento contra e as ondas não dão folga, tentei acampar em vários lugares, mas está difícil de achar um que de abrigo contra o vento e que pareça bom.Chego em um pontal e faço uma longa travessia, o vento está tão forte que levanta a água do rio e forma tipo uma neblina que parece fumaça correndo rápida sobre as ondas.Para o sul, o céu ficou azulado e roxo, parece que vem chuva e temporal.Avisto umas casas ao fundo de uma enseada e lá parece ser abrigado do vento. Não tenho escolha, sigo para lá!Muitas ondas depois chego lá às 16:30 h, é a colônia Águas brancas e tem um cara de moto. É o Negrão (que é branco) e fala para eu descer. Chega seu Chicão, peço licença para acampar por ali. Principia a chuva e espero parar para armar a barraca. Estou tremendo e gelando, mas ficamos conversando. Pelo menos é mais abrigado do vento.Depois que para, limpo o terreno e vou armar a barraca, será uma noite muito difícil. Seu Chicão vem até mim e diz para esperar, ele cuida de um barraco cujo dono não está, ele e Negrão abrem o barraco que parece estar fechado há muito tempo. Ali tem dois quartos beliche e colchões que poderei usar, fora o fato de que não dormirei no chão gelado e livre do vento, fora o temporal que se aproxima.Deixo as coisas ali e vou para o barraco de Chicão, onde ele e negão assistem tv e tomam um chá quente.Coloquei o abrigo e fiquei um pouco melhor, mas já estou gelado e demora para aquecer. Ainda mais que estou com as roupas que vou dormir molhadas.O pessoal é gente boa demais, não tenho como agradecer. Chega Dárcio, Nezinho e Veinho. Assisto as notícias e vou para o meu barraco.Faço um mingau misturado com um pacote de sopa, pelo menos aquece um pouco. Tem um morcego pendurado no madeirame, mas logo ele deverá sair para comer. Ao lado do beliche tem um enorme rato em decomposição, mas ele está no chão e parece que não vai sair dali tão cedo. Deito no colchão, tapando a cabeça e a chuva chega forte mas não dura muito, que sensação gostosa estar ali, abrigado! Apesar de tudo, consegui andar por cinco horas e uns 20 km. Nada mal para um dia destes e por ter saido tarde de Guaira.Estou andando praticamente direto todos estes dias mas estou conseguindo suportar. De outra forma não conseguirei fazer os 5000 km em seis meses, ainda tenho que abrir a pousada no verão.

9/08/05 Terça dia 53Atenção, escurece, são 18:15 h acampei no Paraguai em uma estrada suspeita no meio da selva. Tem pegadas de onça onde deixei o caiaque; estava no sufoco, não tive escolha!

Acordo cedo, faço o kinojo sob um frio dos diabos, deve estar uns 10 graus. Aqui na colonia Águas Brancas tem vários ranchos de pescadores espalhados no mato de leucenas. São bem pequenas, mal cabe a cama e as tralhas de pesca. Esta onde estou é até grande, pois tem cozinha, dois quartos e é bem montada. A colônia cria Pacus em viveiros com bóias amarelas cedidas pela Itaipu binacional, parecido com a criação de ostras e mariscos em Floripa.O sol aparece de quando em vez, os bichos se deitam e procuram se aquecer, os cachorros tremem.Vou no ranchinho de seu Chicão, é o mais modesto de todos, feito de bambus abertos e sobrepostos. Ele vive aqui há 17 anos, tem uma pequena tv, a cama e só. Fico com pena ele é uma pessoa boa, divide a comida que tem com os gatos cachorros e uma galinha garnizé com seus nove pintinhos recém nascidos, uma graça os bichinhos. Vou no caiaque e dou duas barras de chocolate para ele e o Negão, são gente boa demais e não fosse eles, teria passado uma péssima noite.Tomo um chá mate quente e ajuda a aquecer. Vamos para a rua tomar sol onde os outros pescadores já estão lagarteando como dizemos no sul.Todos dizem para eu ficar, o tempo que eu quiser, o vento parece mais forte que ontem.Acontece que eu não vim até aqui para ficar em segurança; é muito bom o conforto. Mesmo com o vento tão ou mais forte que ontem, cheio de ondas geladas e com as cristas espirradas com as rajadas, resolvo partir às 10:15 h.- Tu vais partir com este "mar" gelado? Tem que ter muita coragem...Agradeço de coração ao pessoal tão hospitaleiro, obrigado!E lá vamos nós,só de calção mas com casaco de chuva para atacar o vento e touca de neoprene. A capa do barco protege as pernas, embora por dentro esteja molhado.Ao sair ainda estou abrigado, mas logo pego as ondas e o vento de rajadas no peito. Elas passam por cima, mas eu peguei o jeito do caiaque. É um SW e pelo lado paraguaio parece estar mais abrigado. O ponto crítico é a travessia, ondas de " cabeça branca" como eles dizem por aqui, carneirinos no sul.Faço a travessia até um mato submerso com ondas de través e viro de frente para o vento de rajadas.- Senhor, estamos invadindo o Paraguai!- Dizem que aí roubam, matam, que tem traficantes e contrabandistas, que comem criancinhas...- Soldado, somos um destacamento e estamos em missão secreta.- Não existe fronteiras!- Mas e o ditador Solano López?Ele que vá colocando as barbas de molho, vamos nos encontrar com o Almirante Tamandaré num local chamado Riachuelo...O lado paraguaio é bem selvagem, florestas virgens com uma altura entre 40 a 50 m, no brasileiro não passa de 20 m; pior, existe um "mar" de troncos submersos quase a linha d´água e o maktub está se chocando com eles direto.É um inferno: ondas contra, vento de rajadas, choque com os troncos e um mar de aguapés que me obriga a afastar da margem e ficar a mercê do vento mais forte.Os dedos estão congelando, os braços formigam, mas não posso parar para descansar por falta de lugar abrigado.- Sargento! Trouxeram a dexa-metazona?- Senhor, ficou naquela bolsa que esquecemos no pico do Everest...- Seu "apagadão"!- "Paga" dez!- Flexões, senhor?- "Paga" vinte...

Vejo um barquinho com motor de rabeta entre os troncos, quase o acompanho no remo.Lá vêm os chatos dos quero-queros paraguaios:- Quiero-quiero!Após 2h chego na parte abrigada e paro junto a uns troncos para descansar e almoçar.Brody, aqui não dará para acampar, é selva pura, não achei uma brecha que fosse na mata. É um emaranhado de vegetação, árvores e malhas de bambu, fora esta "selva" submersa.O pior será se encontrar polícia ou militares, entramos ilegalmente e eles podem "confiscar" tudo...Como dizia o Roberto Carlos:- São tantas as emoções!- É isso aí brody, temos que manter os índices de audiência e jogar a vida ao destino tem sido uma constante; vamos ver no que vai dar...Creio que se encontrar contrabandistas ou traficantes cada um vai ficar na sua, como foi de bicicleta na selva do Peru e Colombia ou na selva da Bolívia, na viagem de moto.Sigo em frente, falta pouco para chegar na parte abrigada.- Cabo, vamos dividir o inimigo, eles estão muito fortes!- Como, senhor?Encoste naqueles aguapés de mierda que tomaram conta das margens e quase tudo por ali; assim não teremos ondas, apenas este corno de vento de rajadas.É verdade, o vento quer impedir que eu chegue em local abrigado e as rajadas se tornam cada vez mais fortes.Parece incrível, mas eu tenho que fazer força para levar a pá do remo para a frente, fora d´água.- Sopra, seu corno, aqui o furo é mais embaixo e tu não vais me impedir de avançar... Seu peido mal dado!E ele parecia enfurecido com meus xingamentos e chegava a balançar o caiaque, querendo nos virar à força!- Corno, desgraçao, agora é que eu vou para a frente!Vento filha da Santa, só fazia eu remar com mais força ainda.O problema é que as forças vão acabando e não tem onde parar.Finalmente chegamos na parte abrigada, assim consigo avançar um pouco, do lado brasileiro seria muito pior.O certo seria esperar o tempo melhorar, como disseram os pescadores, mas eu não consigo ficar parado, talvez se estivess chovendo, talvez nem assim...Vou em frente, o caiaque "acavalou" em um tronco submerso, o local é profundo; remo de tudo que é jeito mas não sai.- Merda!Terei de saltar, mas uma sequência de ondas e muito balanço de corpo e ele se liberta do tronco que perdeu alguns pedaços na peleia.Já estou nervoso, pois não tem onde acampar e atravessar vai me deixar desabrigado. Vou seguindo e após uma curva me deparo com uma clareira, vejo casas, uma pequena tumba azul e um local onde está hasteada a bandeira do Paraguai:- Fudeu!- E agora? Atravesso, sigo em frente, será que vão me deter?- Se eles chamarem não pare, estamos dentro d´água!Tiro uma foto, estou muito perto, eles me viram.Aparece um cara, tipo atl´rtico, coturnos, calça verde e camiseta preta, é militar, deve ser uma base na selva.- E agora tenente, que fazemos?- Acene, finja que é turista, mas não pare.Ele acena de volta, nem olho mais, ele pode me chamar.- Encostamos, senhor?- Nem pensar, na agua estamos donos da situação, em terra seremos invasores, estaremos aos caprichos dele, mesmo que pareça amigo.- Vamos em frente!E assim seguimos, chocando com os troncos e levando sustos, pelo menos o vento diminui aqui.Não tem as ondas violentas que vejo do outro lado.Já são 16 h, não sei o que faço, se cruzo para dormir, se tento achar lugar aqui na selva, abrigado do vento.O problema é que não encontro uma brecha que seja, praias que vejo são apenas troncos caidos quando me aproximo, ou mesmo barrancos que não passam de capins mais amarelados entre outros que flutuam.- Cara, faz algo!- Porra, tu não estás vendo que estou procurando há horas?- Aceito sugestões...É verdade, atravessar agora, às 17 h e achar lugar em poucos minutos com o vento que faz por lá pode ser pior e a merda é que está para escurecer e eu não acho o mínimo de brecha que seja na selva, so malhas de bambu e vegetação entrelaçada.- Acho que vamos nos ferrar brody!Cacete! O pior é que é verdade, vai escurecer em seguida, vejo nuvens... Só falta chover.Tento remar mais rápido e vou me chocando com os troncos submersos, estou agoniado, me sentindo em perigo e os galhos só fazem piorar.Pronto, já descarrego meu arsenal de xingamentos contra os galos e o caiaque que quase vira ao bater nos desgraciados:Estou perdendo o controle da situação, fico nervoso e não sei o que faço, chego numa ponta, olho, nada! Assim vai se repetindo, terei de passar a noite n´água.Sempre a esperança que acharei um lugar, mas a verdade é que é selva.- Cara vai só até aquela ponta e atravessa por pior que seja lá deve ser melhor que aqui.Já estou meio que me afastando quando vejo uma canoa de madeira, pintada de verde escondida no meio da vegetação. Chego perto, mas não vejo nada.Passo dela e sigo um pouco, vejo uma pequena praia de areia e uma brecha entre o bambuzal.- Tem que ser aqui cara, tem que ser!Vejo uma estrada, tipo picada, quase não se vê do rio, é larga o suficiente e a grama é baixa.- Estou salvo!Coloco o caiaque sobre o barranco, armo a barraca meio escondido.Um bando de macacos prego grita e me observa, estou invadindo sua área de passar a noite.- Lamento meus amigos, mas estou no sufoco, amanhã a mata será de vocês!Estou super bem abrigado do vento SW, só que é selva, tinha pegadas de onça ali onde deixei o caiaque.Pior é se vierem atravessar coisas para o Brasil e me virem acampado bem em cima da área de manobra.O que pode acontecer é uma incógnita e se eu sentir que a barra vai pesar levo um chifrudo comigo. Pego o aparelho de choque, o punhal e o facão e já fico bolando planos para o caso de ouvir um carro na selva.- Deixa de ser boiola, quem é louco de atravessar o rio de noite com este mar e entre os troncos?Igual durmo com o punhal fora da bainha e o aparelho de choque ao lado do braço.Coloco roupa seca, escuto rádio.De repente um dos macacos grita desesperado, mas para em seguida, deve ter levado uns petelecos do chefe:- Ôh vocês aí do andar de cima, nunca ouviram falar na lei do silêncio?

10/08/05 Quarta dia 54Amanheceu com sol, os bambus estralaram a noite toda com o vendaval, mas aqui ficou super abrigado.Agora são 8:35 h, escutei um cachorro é melhor sair antes que chegue alguém, evita encrencas.Amanheceu com sol, o vento continua sul, sempre que entra frente fria ele fica assim por 3 a 5 dias.Hoje faz três meses que o pai faleceu, vou lembrar do "veinho"!Parti só às 9:50 h e fui até a primeira ponta. Vi que teria que cruzar para o Brasil, pois dali há 10 km teria uma curva para bombordo; com vento SW ficarei mais protegido por lá. Inicio a travessia, vento contra e ondas de través, mas mais fraco q2ue ontem, pelo menos não é de rajadas.Vou remando na moral, é quase estafa, o esforço de ontem exauriu minhas forças; nem consigo xingar direito o caiaque quando ele muda de curso, estou "podre"!Passo pelo porto de Vila Nova (acho) termino a travessia em diagonal e encosto às 11:35, nem deu 2 h, mas preciso descansar. Aproveito e almoço. Para minha surpresa, encontro uns pés de amora, algumas estavam maduras.Lembrei dos tempos de guri, na Vila Nova em Porto Alegre.Ao lado do chiqueiro de porcos havia uns pés de amora e a gente ficava com dedos e boca manchados de tanto comer as frutas.Parti às 12:35 cruzei outra ponta e avistei Porto Mendes. Fiz uma linha reta até lá. Tinha uma bela praia com rampa, barcos que cruzam para o Paraguai, bares e gramados bem cuidados.Fui no bar do Lauro onde D. Gorette fez duas enormes porções de frango e batatas fritas.Cheguei a cogitar de dormir ali, teria chuveiro, segurança, mas não protegeria contra o vento sul. Resolvo partir para o pontal em frente onde tb tem rampa chuveiro, etc..Passo dali, eu quero um lugar calmo e sem ninguém. Abro uma clareira entre um mato adiante puxo o caiaque sobre os troncos.Agora são 18:15 h, o sol acaba de se por, estou sobre um colchão de folhas e super abrigado do vento sul que passa pelo pontal com ondas grandes. Aqui não mexe nem a lona. Será uma noite boa, preciso descansar, estou podre de remar 3 dias contra vento de rajadas e ondas.Ali em Porto Mendes, Cristian, que faz transporte de passageiros para o Paraguai, ficou sem fazer a travessia nestes dois últimos dias pela força do vento e das ondas. Ficou surpreso que eu segui viagem mesmo assim.

Bem ou mal, fiz 50 km em mais de 15 horas remadas desde segunda, mas se fosse esperar, nem teria saído de Guaíra, são 50 km que já se foram.

11/08/05 Quinta dia 55

São 1:36 h da manhã, tive que escrever agora:Estávamos todos em casa e quando vimos, o pai tinha retornado.Estava deitado na cama e ninguém sabia explicar.Tudo tinha voltado ao normal em nossas vidas.Ele falou que explicaria mais tarde que tinha feito parecer que tinha morrido mas que fez isto para nos proteger.Daí eu estava na sala da casa antiga com meu primo Clóvis, comentando o que haqvia ocorrido.Bom, não conseguimos explicar.Um belo dia fomos passear de moto. O pai (com uma velha moto que tinha), eu, meu irmão e meu tio João, acho.A moto dele falhava, saímos do asfalto e seguimos por uma estrada de areião. Meu irmão e meu tio na frente, eles fizeram uma curva difícil numa descida.Não consegui fazer e passei reto. Vi o pai cair e fui ajudá-lo.Quando cheguei perto vi que ele estava com partes da pele meio azuladas, parecia inchado.Ligamos para um padre (deveria ser um médico). Ele começa com aquelas ladainhas dos caminhos de Deus, uma coisa assim como Deus sopra o vento através de um véu...- Eu preferia ter um câncer a ficar assim, disse o pai!- Toque seu coração, o que vê?- Vejo carros, pontes, ruas...- Não, toque com sentimento.- Agora vejo minha família, minha vida, meus amigos, aqueles a quem ajudei!- Agora toque como um espelho. O que Vês?- Apenas a mim mesmo...- É porque você já morreu, mas está tão vivo na memória deles que jamais será esquecido...

- Brody, o negócio foi tão real que despertei.Acordo aqui na barraca, dentro do mato e sinto que tenho que escrever antes que esqueça. Os detalhes foram muitos, mas a essência foi esta.Detalhe: apenas eu ando de moto, mas sonhos são assim.A gente tinha combinado de se encontrar em Foz quando eu lá chegasse.É a primeira vez que eu choro desde o dia em que ele morreu!

Aí pai, está é pra lembrar de ti:

Mudaram as estações, nada mudou,Mas eu sei que alguma coisa aconteceu,Está tudo assim, tão diferente...Se lembra quando a gente, ousou um dia acreditarQue tudo era pra sempre, sem saber ,Que o "prá sempre" sempre acaba!Mas nada vai conseguir mudar o que ficou;Quando eu penso em alguém, só penso em vocêAi então está tudo bem...Mesmo com tantos motivos, prá deixar tudo como está Nem desistir nem tentarAgora tanto faz,Estamos indo de volta pra casa...

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Acordo com um frio dos diabos, perto de dez graus, há um pouco de cerração mas estou melhor da canseira de ontem. Parti só às 10:20h, não consigo sair cedo quando faz frio.Chego no primeiro pontal e vejo pontais a perder de vista, o vento está SW de novo, que saco!Acho que vou perder a elegância e xingar o vento com todo meu repertório de nomes feios. Não muda nada,mas depois dos ataques de fúria galopante eu fico mais calmo.Porra, já está enchendo o saco, remar por 4 dias seguidos contra vento e ondas...Como saí tarde, de castigo, terei de remar por 3 h seguidas. Sigo remando de pontal em pontal, pelo menos cada dia que passa vai ficando mais fraco o vento. Parei às 13:30 e havia pegadas de onça na praia.Quando eu penso que não tem mais perigo, surgem os sinais de que não é bem assim. Passo por outro farol onde tem uma enorme rampa de cimento. Deve ser porto Bragado, estou mais perdido que cusco em procissão!Adiante há uma grande travessia por fazer e vejo um navio balizador com dificuldades para instalar uma bóia de sinalização por causa das ondas, já que o vento contra voltou a aumentar.Resolvo fazer a travessia indo na direção do navio que tem um guindaste na ponta e várias bóias coloridas sobre o convés.- Aonde é que tu vais, seu exibido?- Ué, vou tirar fotos...É que pra mim ficou normal andar nas ondas, não tenho mais medo!Chego perto do navio, os caras conseguiram colocar a bóia e uns 10 funcionários se voltam para ver o caiaque nas ondas há uns 199 m. Passo mais tres pontas e depois de seis horas remadas chego noutro pontal à reversa do vento. Levo quase trinta minutos para abrir uma clareira e limpar o terreno para a barraca. ?Não é dos melhores, tem galhos buracos e muitas folhas, mas meu curso intensivo de faquir me permite dormir sobre fundo de pedras, raízes a mostra galhos e assemelhados.

12/08/05 Sexta dia 56Parto às 9:40h, rumo ao primeiro pontal.Aleluia! Sopra um vento do quadrante norte, isto muda tudo, aprôo o barco para o último pontal que vejo no horizonte. Aqui é uma margem cheia de reentrâncias no sentido NE-SW.Dia bonito, viajo sem a capa e navego por 3h até parar para almoçar. aproveito para tomar banho nesta água gelada. ao fundo desta enseada há um farol tradicional, pintade de listras horizontais brancas e vermelhas. Vejo uma balsa carregada de caminhões vir do Paraguai. Ela passa por trás de uma ilha que eu não havia visto.Sigo em frente, o tempo passa e remo muito forte para chegar em uma ilha, mas ela é ruim para dormir, pequena e mato alto, remo mais forte ainda até chegar em outra onde tenho que abrir uma clareira no capim alto. Nesta só vejo pegadas de capevara e graxaim, se visse uma de onça daria no pé. Foram 6:30h de remo hoje, tem uma placa na ilha diz:Rio São Francisco - km 2001

Há uns barranquinhos de barro vermelho que gruda mais que durepoxi e que mancha asté a pele, parece uma tinta.

13/08/05 SábadoAcordo às 4h faco o kinojo para esquentar o ar gelado da barraca.Agora são 7:40 h, dia bonito e com um pouco de cerração. Achei a carcaça de um graxaim na beira e parto às 8:40h.Fui em frente quase sem vento, chego num pontal, olho para afrente e tudo parece se fundir no horizonte. Hoje estou possuido pelo Demo e sigo na direção da bruma, onde mal vejo um pontal. São tres longas horas e meia olhando o mesmo ponto de referência, alvo, como dizem na marinha de guerra ou azimute. Tu entras em alfa pensa no que quiser, família, amigos viaja no tempo tipo assim:- Agora vou lembrar de quando eu tinha 12 anos e a mãe levou toda a turma da rua para o sítio da vó e lá encontramos as primas de Caxias.É impressionante, tu vais aonde queres, lembra de detalhes, ri, fica brabo e quando volta para o corpo está remando sem parar e reinando com o caiaque porque o corno saiu da rota...Chego no pontal, almoço e sigo em frente, passo mais dois e vejo algo no horizonte, pela bochecha de boreste, são torres de alta tensão, consigo distinguir os guindastes centrais, estão maisw próximos do lado paraguaio. Estou me aproximando da maior represa do mundo...Cara, é muito emocionante estar me aproximando dela no meu caiaque depois de 57 dias d loucuras...Dou um grito de Tarzã ali no meio do nada, não deixa de ser uma vitória!Resolvo encostar na margem para filmar a represa e surprendo um bando de quatis, cerca de vinte, fuçando na areia da praia. Eles não me vêem e vou filmando quase ao lado deles quando o caiaque encosta na areia e faz barulho.Sigo em frente, paro em outro pontal onde tem uma placa caida mas não consigo identificar a placa. Vejo uma praia mais para o fundo, remo até lá. Tem rampa, jet-skis na beira e lanchas. É a praia de Santa Terezinha de Itaipu, o homem dali diz que já passei da cidade e que tem outr mais próximo da represa. Pergunto quantos kms faltam ele não sabe e pergunta pra um dos caras de jet, ele responde quase sem olhar para nós:- Uns dois quilômetros...Olho pro relógio, são 17:20h, dá tempo.Pego o caiaque, lá terá bombeiros que poderão me transportar até a capitania.Sigo em frente, cada vez mais próximo da represa, desta vez não poderei usar a tática kamikaze de chegar e pedir para me largarem ao lado das turbinas... É ultra violento.Afora isto, tem a parte burocrática que tenho que resolver em foz e cambiar plata, pois só retorno para o Brasil daqui há 3 meses, se Deus deixar!O sol se põem, pasaso a primeira ponta, nada, a segunda, nada!Estou remando há mais de uma hora, Que cara filho da santa!É mata virgem, não dá para encostar, está cheio de troncos submersos.- Desgraçado! Estou louco de raiva, se pudesse voltava lá e dava umas porradas no cara irresponsável. Agora estou em fria nos dois sentidos, pois está frio e escurece.Eu nunca volto, então sigo em frente. Filmo a represa ali do meio mesmo, está linda toda iluminada, estou há uns 10 km no máximo dela, mas vi uma lancha passar para o interior de uma enseada.Vejo luzes, mas deve ser do pessoal da represa e acho que serei executado sumariamente se chegar lá.Então vou seguindo no escuro, pego a lanterna para o caso de alguma lancha vir por cima. Tenho que me afastar da margem, estou me chocando com troncos submersos e levando sustos enormes. Finalmente vejo luzes e sigo para lá. Está muito longe, mas que remédio.Xingando a mãe do boyzinho, vou seguindo em frente, usando o reflexo das luzes para ver os obstáculos no caminho.Finalmente chego, são 19:30 h remei mais de 8h, é um clube.É o Iate Clube Lago de Itaipu.Falo com Carlão e Carmo, Depois chega seu Florêncio, estou tremendo, aqui já é foz do Igaçú.Falamos com seu Adauto depois de ligar para a capitania, mas sábado a noite...Eles resolvem me alojar no clube, tomo um delicioso banho e tiro uma barba que não é deste corpo, quer ficar branca...Da próxima vez passarei aquele barro vermelho nela.

O pessoal é bom demais, fui muito bem recebido por todos e só tenho a agradecer.

14/08/05 Domingo Dia 58

Hoje conheci o Sr. Claudio que já viajou de moto e coloco~-se a disposição inclusive o translado do caiaque. Fiquei super feliz. Acordei cedo, organizei as coisas no caiaque, conheci o Sr. Rolim e os garotos que fazem parte da flotilha do clube, entre eles o Alan (campeão sul-americano, Jorge e Wilian "Popó" que me emprestou um sabonete. Tomei café com eles e peguei um ônibus e vim até o bairro 3 lagoas para escrever para meus amigos.Agora são quase 22 h, escrevo desde as 12h. Aqui foi mais um pouco de aventuras, espero que estejam gostando e que continuem viajando comigo, pois é muito bom dividir as emoções com aqueles que gosto. Um baita abraço, agora serão 3 m3ses fora do Brasil e, se Deus permitir, I Will Be Back, Baby!

Um baita abraço para todos e escrevam, é muito bom saber notícias de voces.

14/08/05 Domingo dia 58Acordo cedo, conheco o sr. Claudio, diretor de esportes e ele conversara com o sr, Adauto para transportar o caiaque abaixo da represa. Ele ja fez uma baita viagem de moto, Tomo cafe com a gurizada da vela, lembrei dos tempos do remo em Porto Alegre com o seu Pineda que fazia o mesmo com a gente, voltei no tempo.

Fiquei quase 10 h na internet e volto a noite para o clube.

15/08/05 Segunda dia 59Fui fazer compras no centro, correios e capitania dos portos

Conheci Nuri, uma menina super simpatica na secretaria de turismo e que me ajudou muito.

16/08/05 Terca dia 60Passei a manha arrumando o barco e a tarde fui ao centro conversar com Adriana que queria fazer uma materia sobre a viagem, no dia que cheguei no ICLI, ela la estava.Ela e Mauricio foram super legais, pena que estavam muito ocupados na Camara Municipal, fui conversar com Daniela e Nei que escaneou algumas fotos de viagens anteriores. Eles farao materia para o jornal.

Ficou combinado que no dia seguinte o pessoal da tv Cataratas iria ao clube fazer uma materia.

17/08/05 Quarta dia 61O reporter Caio e o cameramen, Mariano fizeram a materia por cerca de 2 h enquanto eu remava para la e para ca, Adauto os levou na lancha,De tarde fui de moto-taxi ate a Argentina, na prefectura naval, depois Aduana, policia federal,Cara, na receita e muita frescura, querem a nota fiscal de3 tudo, inclusive da maquina fotografica velha... Da um tempo!Decidi que vou atravessar a fronteira por agua, assim no mais; sem burocracia.Serei obrigado a ir ate Puerto Iguazu, na Argentina para receber instrucciones e exame da embarcacao.Quando retornei ao clube fiquei conhecendo o comodoro do ICLI, senhor Ademir que estava em reuniao com os demais membros da diretoria, Ele e super simpatico e diz que posso ficar o tempo que quiser, ressalta que o clube ajuda a todos os que viajam e nao tenho como agradecer a tanta gentileza, amizade e hospitalidade, Meu muito obrigado aos amigos de Foz!

18/08/05 Quinta dia 62Hoje faz dois meses que sai de Brasilia, foi em 18 de Junho.O sr. Adauto mostra o projeto que estao desenvolvendo no clube junto as criancas carentes no sentido de conscientizacao ecologica e iniciacao no mundo da vela.Paralelamente a isto, estao substituindo o bosque de leucenas por arvores frutiferas, E muito bonito, mas ele ressalta que nao e ideia dele, mas de um grupo.A reportagem saiu no jornal, a Daniela mostrou as coisa por outro angulo, ela captou como eu sinto tudo, o que penso em relacao ao que isto tudo significa e nao so a viagem em si, ficou lindo! Daniela, muito obrigado, adorei!A reportagem saiu no jornal A Gazeta do Igacu, no segundo caderno.Uma baita foto da bike ao por do sol nos pampas argentinos em metade da capa e materia de duas paginas com fotos de viagens anteriores e trechos dos diarios... Para mim foi a mais linda de todas as reportagens de outras viagens, e mais ou menos isto que ela captou, varias vidas...Cada viagem foi uma vida!Despeco-me de todos, seu Florencio chega; ele vai me levar ate o Iate Clube Cataratas, que fica uns 4 km abaixo da ponte da amizade.Adriana liga pedindo para Adauto tirar umas fotos para o informativo do clube, quero despedir-me de todos e fico atucanado.Vamos embora e, depois de enviar a reportagem pelo correio, quase chegando no Cataratas, lembro que o remo ficou num canto e nao veio... Que mico! Que vergonha, ligo para Adauto e peco que envie o remo por um moto-boy!Seu Florencio vai embora, despeco-me do meu amigao.Fico no clube conversando com seu Valdir e depois almoco no restaurante dali. O moto-boy demora, resolvo ir no centro e so partir no dia seguinte, pois ja passa das 16 h e nao dara tempo de cruzar a fronteira, burocracia e ainda encontrar local para dormir.Volto mais tarde e sou apresentado ao sr. Luis Carlos, presidente do clube e que permite que eu passe a noite aqui.Falo com Adriana, ela foi legal demais, queria vir despedir-se mas sua vida e agitada demais, eu compreendo, um beijao, muito obrigado por tudo!Iria dormir na rede de Valdir, mas Guilherme deixa eu dormir no assoalho de uma lancha entre dois bancos que esta sob um telhado de zinco com o caiaque ao lado.Isso e para eu recuperar o ritmo depois de cinco dias de moleza.Dormi tri bem, ate tirei fotos da minha °cama°!

!9/08/05 Sexta dia 63Seu Valdir chega cedo e eu ja estou com tudo pronto, o dia esta bom e eu estou louco por mais aventuras!D. Leoni, esposa de Valdir me da um envelope com santinhos, muito amavel!Descemos com o jipe a ladeira do clube ate a rampa. Eles se vao, arrumo tudo e entro no caiaque na forte correnteza, sao 8:30 h. Aceno para Dona Leoni no alto da barranca e sigo em frente, antes fiz o sinal da cruz, e uma nova etapa!Estou euforico demais, parece que a viagem esta iniciando hoje!Barrancas de uns 50 m, vou seguindo ate que vejo o que parece ser uma falha na barranca da esquerda(Brasil). Ja se passou meia hora, e o rio Iguacu esta ali. Para boreste o marco do paraguai, na proa tenho como alvo o marco argentina e na °esquina° de bombordo uma construcao circular, e o Brasil que so vou rever daqui ha tres meses...Triplice fronteira! Eu estou vendo pela primeira vez, remando pelo rio Parana em um caiaque desde Brasilia...Cara! Custa a cair a ficha, que loucura!Encosto ali para filmar e fotografar, estou emocionado!Como e bom ser assim, um aventureiro!Simplesmente estou °voando alto°, quantos que nao sao daqui fizeram isto, vendo as tres fronteiras por agua?Os caras da receita disseram que a policia federal iria me interceptar se eu cruzasse a fronteira sem autorizacao, vamos ver!Subo o Iguacu e cruzo para o lado argentino e cerca de 2 km para cima chego em Puerto Iguazu, 8:50 h. Aqui cruzei de bike vindo de Porto Alegre. Antes passei uma noite inesquecivel no mirante da Garganta do Diabo com bicicleta e tudo; foi noite de lua cheia e fiquei olhando as cataratas iluminadas pela lua e tocando minha gaitinha de boca...Repeti isto na alto da montanha em Machu Pichu, Peru...Vi as geleiras desabando no sul, noites de lua em plena selva no Rio Amazonas, o Deserto de Atacama, os canyons gauchos, trilhei atraves de sonhos, ate onde fui eu nao sei, mas tenho a certeza de que fiz minha vida ter valido a pena, como tenho esta certeza agora, aconteca o que acontecer!Uma senhora paraguaia fala que ano passado uma onca devorou um turista nas passarelas onde dormi, deve ter sido uma loira, assim ate eu!Diz que so encontraram um pe dentro da bota, mais uma para eu me preocupar!Vou no quartel da prefectura naval e falo com o comandante. Ele solicita que eu informe todos os dias quando chego, quando saio, para nao cruzar para o Paraguai, dormir em destacamentos navais e nao dormir em praias ou matos polis e muito perigoso pelos ladroes e pelos °tigres° (oncas).Se nao encontro destacamento tenho que ligar pelo telefone 106 ou vhf canal 12 ou 16: caso contrario eles sairao de lancha para me encontrar.Isto vai contra meu jeito de viajar, mas e como nos tempos de Marinha, o recruta so pode falar tres coisas;- Sim senhor, nao senhor, quero morrer!Ou seja terei de informa-los diariamente para evitar gastos para eles.Isto praticamente me proibe de dormir no Paraguai.A Argentina e como uma namorada ciumenta e possessiva, nao quer nem que eu olhe para os lados, para a outra...So se eu colocar pregos nos olhos e ainda assim creio que vao rasgar...Essa namorada nao passara de dois meses...Sou levado de carro ao porto e liberad, sao 10:40 h. Finalmente posso navegar. Show!Aposto corrida com a balsa que vai para o Paraguai e ganho, desci o Rio Iguacu em 10 min e dobro a esquerda (km 1927), olhando mais uma vez as 3 fronteiras.Estou num estado de euforia que so aumenta enquanto o caiaque gira sem parar pela correnteza forte que forma redemoinhos, esta dificil para manter uma rota em linha reta.-Soldado, mantenha o curso!- Impossivel senhor, estamos sem leme, a correnteza e forte e vem de todos os lados. Surgem emergencias de aguas que vem do fundo quando a correnteza bate nas pedras do fundo e sobe, fora as rochas que quase afloram...- Entao mantenha uma linha torta!O chefe sempre quer dar uma ordem, nao pode demonstrar inseguranca...Passa uma hora, a velocidade e boa e vou me acostumando.As vezes a superficie esta lisa e de repente surge uma emergencia de aguas que faz barulho e assusta, parece um chafariz submerso!As barrancas estao cobertas de selva e tem uns 50 m.Tche, e muito louco, quase assusta. Pego a filmadora e deixo o caiaque correr solto e vou filmando enquanto ele desce girando nos redemoinhos, estou maravilhado!Viajar assim entre dois paises...Cruzo com um velho navio paraguaio, casas na selva, botes a remo e lanchas de pescadores.Ha inumeras saidas de pequenos riachos e varias cachoeiras aos lados, e lindo demais!Selva, selva, selva...E barra pesada dormir ai, pelas oncas e pelos assaltos que a marinha alertou.Tenho que chegar no destacamento daqui ha 55 km, mas eu levei tres dias para fazer 50 em Guaira contra o vento e agora so tenho 5 h: acho que nao vou conseguir...Aqui e tudo estranho, onca e tigre, sucuri e anaconda, escuto galinhas cacarejando em guarani, caes latindo em espanhol...Apos duas horas vejo uma linda cascata do lado argentino e faco a volta, quero comer algo. O caiaque nao avanca contra a forte correnteza, tento 3 vezes e descubro que junto a margem e melhor para subir.Encosto e entro no riacho da cascata.Lindissimas borboletas multicoloridas pousavam em mim e no caiaque. Sento no caiaque para comer:- Sai dai, tem sucuri!Subo no barranco:- Sai dai, tem onca!Mas que saco, tenho quecomer em pe, de lado para o rio e de lado para a mata.Se uma onca me atacar o plano e facil: dou uma °gravata° nela e me atiro no rio para afogar a desgraciada: se for sucuri e so usar o punhal.- E tao facil e eficiente a teoria.Sigo em frente, ora pelo Paraguai, ora pela Argentina. Passo por Puerto libertad e aviso que vou em frente ate P. Wanda (km 1873) onde chego as 16:30, apenas 3:45 h e fiz 55 km, nao acredito!Os caras sao super legais, arrumam um trailer e levam o caiaque ate o alto do destacamento, 50 m acima. A vista dali e linda.E incrivel a preocupacao deles comigo, todos os postos ja sabem que vou passar e se comunicam por radio.Tomo banho e durmo no alojamento, tratamento nota 10!

20/08/05 Sabado dia 64Amanhece com neblina nao querem que eu siga. Seguranca e bom, acontece que eu nao gosto disso, ser monitorado, avisar ate quando peido...Que saco!Eles contam a estoria da onca, na verdade ela devorou uma crianca.Estou impaciente peco que me liberem com neblinaa mesmo, queria fazer 100 km em um dia agora o maximo que posso tentar e 84 km...Parto as 9:15 h, nem tomei cafe, nao almocei ontem e a janta foi aquela sopa...Sem cafe. pois as coisas estavam no caiaque.E vou em frente, deslizando entre belissimas paisagens, como e bom ser assim:- Sou vagabundo eu confesso, curto um rio e as garotas a beira mar...Este e um trecho de uma musica da Guarda do Embau; e uma das praias mais lindas do Brasil, nao so pelo rio, pelo morro do urubu, costoes com piscina e a praia do maco, mas tambem pela gente jovem, pelo astral de liberdade que rola por ali, e a praia do regae, hip-hop, etcMuita °fumaca° rola por ali, mas eu nao sou assistente social, nem padre ou medico: nao dou conselhos, cada um que viva sua vida e nao atrapalhe a dos outros, so!Duas horas depois vejo os silos do lado Paraguaio, ali comeca o °passo fantasma° uma serie de perigosos redemoinhos com centro de 1 m. O perigo e de virar o barco. E uma curva com fortes correntes de varias direcoes que formam corredeiras e redemoinhos.Entro por ali, evitando os maiores: pego a filmadora e deixo o caiaque girando enquanto vou filmando os menores. Sem eu perceber, fui levado de encontro a regiao dos maiores e nao podia remar pois estava com a filmadora na mao:- Senhor, estamos cercados!Surgiram dois enormes remolinos: um por bombordo e outro por boreste.- Seremos sugados!- Calma, preparem as boleadeiras!- Boleadeiras, senhor?- Sim, arremessem contra essas criaturas em sentido anti-horario!Cara! O caiaque girava sem parar e a mim so restava filmar e fotografar de cima rezando para que nao virasse.Agora, que aperta o cutuco, aperta!Depois de quase 2000 km surge coisas inusitadas, nada se repete!Cruzo com um enorme navio, aceno para os caras, sao tres lado a lado empurrados por um rebocador contra essa correnteza, nao da para acreditar!Pior, depois que ele passou o rio ficou cheio de ondas... que nao saem do lugar!Que loucura!Almoco a bordo, nao posso parar se quero fazer 84 km. Deixo o caiaque correndo ao sabor da correnteza enquanto como e descanso um pouco.Coloquei o colete salva vidas nas costas e ficou mais confortavel, pena que esqueci o chocolate na popa. Estou muito mal alimentado.- Senhor, nao vamos baixar terra?- Nrgativo, ficamos 5 dias em Foz, temos que recuperar o ritmo.Apos 3:30 h passo por Puerto Mado(36 km) e sigo reto. Aposto corridea com um bote, passo por lindos lugares no Paraguai, converso com uma turma que toma terere nas pedras onde ha uma lindissima praia de areia. Umas paraguaias lindas perguntam de onde venho enquanto me vou, perturbaram minha alma de pecador.Finalmente as 17:30 h chego em P. Monte Carlo e os caras da prefectura mandam eu seguir ate um clube de pesca, uns 1000 m para baixo.Foram 8:15 h direto !85 Km! Esta bom!Na marinha nao dizemos esta bom, dizemos:- Podia ser melhor.Converso com o pessoal e durmo la embaixo, na praia ao lado do caiaque.

21/08/05 DomingoNoite de lua cheia e manha de neblina. Estou vendo a altissima ilha de Caraguatay onde tem outro enorme redemoinho no lado argentino.Depois dela tem as ruinas da casa onde nasceu um tal de Ernesto °Che° Guevara.Aviso a prefectura que estou saindo e vou com vento contra e chuva. Nao demora muito e vou °aprontar° para este monitoramento, eu me conheco e sei que isto ainda vai dar mierda! He, he!Depois para e sigo xingando a mae e os filhos do vento em espanhol ate parar para almocar no paraguai.Longas retas e muitos redemoinhos. Cheguei em Puerto Rico as 16:30 h, deu 4:30 h remadas para fazer 45 km com vento contra. Deixei o caiaque ao lado do barco deles, levei as coisas para uma casa que sera demolida e onde vou passar a noite na barraca. Caminhei ate aqui no centro da City que e muito bonita e tem um cassino com uma replica da torre Eifel na frente. Nem descansei, agora sao quase meia noite, tenho que caminhar 2 km e partir amanha de manha,Deu 5 h de internet.

Parto da bela cidade em meio a um tempo esquisito e sem vento, sao 8:50 h e a bussola marca W direto, deveria estar seguindo para o sul.Os barrancos estao cada vez mais baixos, agora estao com uma media entre 10 e 20 m de altura. Predominam os bambuzais ao longo da margem e florestas mais ao fundo. Vejo muitas partes desmatadas, fabricas e plantaçoes de pinus. O lado paraguaio é mais bonito, possui areais que parecem ser rampas de concreto quando vistos de longe. No meio da mata sempre tem gente morando, navegando em pequenos botes ou mesmo pescando, sao pessoas simpáticas e simples que acenam quando passo.Deu uma doideira e resolvi passar o dia a bordo, nao vou baixar terra de novo.Está um dia agradável, corrente favorável, rio lisinho e só meu, dá gosto navegar assim, é um silencio só, escutando o murmúrio das águas, o canto dos pássaros e o remo empurrando a água para trás.Minha alegria dura pouco, um enorme rebocador sobe o rio empurrando duas enormes chatas, é incrível a força que tem, pois a corrente é poderosa.Nao desviei muito dele e fiquei admirando a luta dele contra a correntesa, é admirável! O problema é que ele passa com muita velocidade e percebo que forma ondas com mais de um metro. Estou sem a capa e elas vem muito próximas uma da outra, viro rápido o caiaque na direçao delas, de outra forma vou virar.Elas vem como touros ferozes e sinto que a barra vai pesar. Segura peao!O Maktub sobe a primeira, a segunda lambe o bico, a terceira bate nas mochilas que estao no convés de proa e que funcionam como um "castelo de proa" como diziamos nos barcos de competiçao no Guaiba. a quarta invade o cockpit e tomo um banho de água gelada. Pronto, estragaram o "meu" rio. Ele fica cheio de ondas que nao saem do lugar no meio, pois ficam lutando contra as corredeiras e outras vao para as margens, batem nos barrancos, voltam batem nos barrancos do outero lado, parece um jogo de ping-pong onde eu faço o papel de rede pois viajo pelo meio do rio e vou chacoalhando naquela barafunda de ondas e correntes, fora as corredeiras.Até que o rio ficasse calmo de novo, passou uma hora.Tenho que seguir pelo meio do rio onde a corrente é mais forte, mas tem o inconveniente de nao ver os bichos.O pessoal do Paraguy parece mais alegre, vejo casinhas na selva, acho que aqui só falam o guarani, onde andará meu amigo Franca "Karai"? Ele já deve ser um cacique a esta hora, trabalha no projeto Rondon e faz belos trabalhos com a comunidade Guarani no sul do País.Ele sempre aparece nos jogos de futebol fumando cachimbo ou charuto e cospe na "mae Terra", índio adora fumaça.Vejo crianças peladas tomando banho de rio, gritam de felicidade enquanto as mulheres parecem bater com um pau em alguma coisa, nao sei o que é, estarao lavando roupas?Às 12:40 h, quatro horas depois, deixo o caiaque correr ao sabor da correnteza e almoço uns paes que comprei na city acompanhado de salamito, queijo e chocolate, minha raçao básica.Faço alongamentos e prossigo, tenho que fazer 70 km até o próximo posto de la prefectura. O ritmo nestes tres últimos dias tem sido forte.Para acabar com a monotonia, resolvo salvar abelhas que estao se afogando, mas algumas picam a luva. Mal agradecidasSinto uma auréola pelas boas açoes; é bonito ver um inseto que iria morrer secando-se e tendo uma nova chance. Sempre que alçam voo, sinto-me bem e pego outra para vê-la secando as asas e depois partir. Assim me distraio enquanto vou seguindo meu caminho.Nao me sinto responsável pelas que salvei, elas que cuidem da própria vida, é cada um por si, de repente estou devolvendo a ajuda que recebo pelo caminho, é meio parecido.Já estou há seis horas dentro do caiaque, para variar nao sei onde estou, mas às 17:30 h avisto um belo gramado, lá deve ser San Pipo, mas ali nao tem mais prefectura, devo seguir mais adiante. Como ali nao tem telefone sou obrigado a seguir em frente... Saco!Parece haver uma neblina no ar, o sol está se pondo contra o rio que está liso agora e forma desenhos incríveis ao colorir as nuvens de vermelho e dourado. Para completar o quadro, bandos de pássaros cortam o horizonte e vao gravando imagens inesquecíveis na minha memória.Bueno, depois eu vi algo inusitado; o sol refletiu sua imagem na superfície do rio sem distorçoes, era como se estivesse diante de um espelho. Há dois sóis, um no céu e outro no rio.É simplesmente incrível! Tchê, sem palavrasObrigado Senhor por estar presenciando tanta beleza! Fotografo e filmo sem parar, contando ninguém acredita.Às 18:20 h chego em Puerto Corbo, fiquei exatamente 9:30 h dentro do caiaque, estou quebrado, quase com caimbras nas pernas, ombro esquerdo extremamente dolorido, mas já se foram 77 ou 80 km.Castro diz que posso dormir dentro da lancha deles, sobre um estreito banco de madeira. Ela é toda envidraçada e posso ver as estrelas enquanto durmo. Fede a diesel, mas é melhor que armar a barraca, assim saio mais cedo amanha. Comi minha granola e parto para um sono recuperadr.

Às 21:30 h sou despertado, devo desembarcar pois eles tem que atender uma ocorrencia.Coloco tudo sob o banco da lancha e vou sentar no gramado, junto a uns tonéis. Coloco um grande saco plástico sobre a cabeça para proteger do sereno e juntar ar quente com minha respiraçao. Sento na grama, apoiado nos tonéis e cochilo por ali até que eles voltam e passo o resto da noite na lancha.

22/08/05 Terça dia 66Agora já sao 8:30 h, fiz o kinojo aqui dentro da lancha e vou partir assim que terminar de escrever o diàrio.Parto às 8:50 h com o tempo meio esquisito.Os gaudérios sabem o que significa um "cavalo passarinheiro", é aquele cavalo que se assusta com qualquer coisa.Eu tenho um caiaque "passarinheiro", ele tem a irritante mania de virar o curso assim que um mínimo vento lhe atringe por través, sempre se volta para barlavento e isto revolta nosso comandante:- Te pára, animal!- Soldado dê-lhe uns tapas na orelha desse bicho!- Senhor, o Maktub é só um barco...- Barco nao tem "bochecha"?- Entao dê-lhe uns tapas nas bochechas...O céu fica azulado, parece que vem temporal.Na curva do rio, do lado paraguaio, vejo um terminal de graos, o estranho é que os condutos para os barcos atravessam o paredao de uns 30 m de altura e saem bem pelo meio deste. Aproximo para fotografar aquilo antes de fazer a curva do rio. Os caras lá de cima fazem sinais, dizem que está soprando um vento fortíssimo que nao posso sentir pois estou protegido pelo paredao, é o temporeal que se aproxima.Encosto em uma vegetaçao para colocar a capa e o casaco de plástico com capuz e o quepe por baixo, assim protege o nariz, he, he!Brody, a coisa estava feia, podia ver as rajadas formando carneirinhos e ondas fortes que lutavam contra a correnteza, uma visao desagradável mas que nao estava me alcançando. Sao rajadas muito fortes, fico ali, agarrado nos galhos da margem e tentando filmar aquilo enquanto nao chove. Acontece que o corno do vento e as ondas me descobriram escondido ali e quase viraram o caiaque antes de eu proteger a filmadora.- Cara, sai daí, o bicho pegou, estamos na "onça"!- Ir para onde?- Nao sei, te vira!É um vento tao forte que é capaz de virar o caiaque na marra!Subo contra a correnteza, tentando encontrar local mais protegido, imagina se estivesse direto no vento.Enfio o caiaque entre uma fresta no barranco de lama e o amarro com dificuldade numa raiz. Jogo o remo para cima e escalo o barranco pelas raízes de uma árvore que está para cair no rio.Lá em cima tem um bambuzal paraguaio que abriga muito bem do vento que dobra as árvores e que quebra alguns galhos. Estou só de calçao e os primeiros pingos já dizem o que vai ser.Chove forte, penetro ainda mais na mata e nem sinto o vento. Ficou muito frio.Fico ali no bambuzal, feito uma vaca esperando que o vento diminua:- E aí seu bunda mole, vai ficar aí parado, contando quantos espinhos tem em cada galho do bambuzal?- Senhor, olha o vento e as ondas...- E o que nós somos?- um pelotao, senhor.- MAIS ALTO!- NÓS SOMOS UM PELOTAO, SENHOR!- Será que eu tenho que dizer o que fazer? - NAO, SENHOR!Chega de moleza, o pelotao farroupilha desce resoluto o barranco, esvazia o caiaque que foi invadido pelas águas, coloca a capa e vai para a peleia.- Agora sim, é aqui o lugar de voces, no sagrado campo de batalha.Tchê, que loucura, o caiaque mergulha nas ondas revoltas que se formaram nas corredeiras e que passam por cima, tentando derrubar nossos heróis do cavalo, mas o que elas nao sabiam e que estes tauras já estiveram no mundo dos mortos e voltaram; agora nao tem mais medo de morrer, só de sucuri...Sigo entre trovoadas, raios e muita chuva.- Alguém da tripulaçao é casado ou tem namorada?- Nao senhor!- Ainda bem, pois correiria o sério risco de levar um raio nos chifres...- Todos olham temerosos para o céu...Brody, ondas nervosas, piores ainda em zonas de corredeiras, estaria áté divertido se nao corresse o risco de virar. Ora sigo pela Argentina, ora pelo Paraguai, assim vou seguindo por mais 2 h, nao vou almoçar, pois chove demais.Nao é que vejo duas enormes cavernas no lado paraguaio?Sigo para lá, estao bem na margem, uma ao lado da outra.Uma delas é mais escura mas protege inclusive a beira e a praia é de areia.Brody, é incrível, até o Maktub na praia está livre da chuva.Fico ali na beira, pulando de alegria e fazendo figa para a chuva que aumentou mais ainda.Um violento raio explode perto do destacamento Santanna, do outro lado do rio, chegou a doer o ouvido.Penetro mais na caverna e paro de provocar os elementos, deve haver mesmo um santo me protegendo. Até entrei numas meio que tipo assim... Bah!Tiro fotos dali, vejo fezes de morcego, tem inscriçoes que devem ser de povos indígenas, outras de vândalos com datas desde 1956... Para chegar nessa aqui, só de barco.Está tudo meio esquisito hoje, parece que estou numa regiao mística, cavernas, povos indígenas, muitas missoes jesuíticas, os conquistadores, esse tempo doido, super estranho!- Irado brody!- Senhor, este nao é o Caminho de Santiago de Compostela?Sigo em frente, parece que vai clarear, atravesso para a Argentina para ver enormes paredoes avermelhados de calcáreo, show de bola!Tem uma caverna no alto de um deles!Vamos em frente e depois de um tempo vejo nuvens ameaçadoras, é a terceira tempestade no mesmo dia, isto aqui está ficando mucho loco, qual é que é? Quer me deixar pinel?- Senhor, estamos cercados, o inimigo é tao numeroso que suas lanças e flechas cobrem o sol...- Entao lutaremos à sombra!Sigo pelas corredeiras e quando vejo o caiaque ficou posicionado entre dois enormes redemoinhos.Era para dormir em P. Santanna, mas estou de saco cheio de rotina, vou forçar uma situaçao de perigo, só para ver o que vou fazerVejo um barco paraguaio, acelero o ritmo para alcançá-los e saber onde estou. A mulher diz que nao da mais tempo de chegar em Candelaria, que devo atravessar para a Argentina que o lado paraguaio é muitro perigoso... Pô, até ela?Dizem que os caras chegam de lancha e armados, saco!Como estou há 30 km de Candelária, só chegarei lá no escuro...- Agora te rala!- Nao querias mudar a rotina?Pelo menos nao tem mais sucuri, era só delas que eu tinha medo, uma onça nao vai me pegar na traiçao e vai levar um bom punhado de punhaladas, quero ver uma chifruda destas me pegar sem levar o troco, embora eu ache que elas querem mais é distância de gente.Para "melhorar" minha situaçao, outro ruidoso temporal se aproxima1Carajo!Desenvolvi uma técnica indu para nao me apavorar ao navegar sob uma tempestade de relâmpagos. - Tudo é uma questao de manter: a mente quieta, a espinha ereta e o coraçao tranquílo!Se eu escutar o som, é porque nao me atingiu, se ele me atingir, nao sentirei nada: prá quê ter medo entao?Só nao quero que venha aquele vento de rajadas contra, aí sim nao chegarei em lugar nenhum e terei de dar um jeito de dormir.Gozado, até fico contente de estar enfrentando situaçoes diferentes, a rotina é dose!Quando entro em fria fico curioso para ver o que vou fazer...Tenho certeza de que há uma força positiva vindo de minha família e de meus amigos, pois é incrível a maneira que as coisas acontecem quando estou em perigo, sempre consigo escapar.O essencial é nao entrar em pânico!Como chove forte agora, decidi que vou remar pela noite até chegar na prefectura, nao tivesse que avisá-los já teria acampado, mas aí eles sairiam para me procurar e isto eu nao quero, daria despesas para eles.... Saco!Ao mesmo tempo estou feliz de seguir em frente, hoje passei dos 2000 km, estou contente.Agora só faltam 3000 km...E aí "tio" Aldo? Dissestes para todos que eu só iria durar 5 dias....Qui, qui, ri, qui, qui!Vejo luzes ao passar por um pontal, está muito longe, mas pelo menos eu tenho uma referência. A tempestade está passando e o céu parece ter ficado mais claro, faço sinais com a lanterna, nao quero que ninguém venha atrás de mim. Os caras viram meus sinais e respondem.Entre ver e chegar nas luzes muito tempo se passa. Chego lá às 16:40 h, lá está Benitez é o km 1601( distância que falta para B. Aires), estou há cerca de 10 km de Posadas, capital de Misiones.Sou muito bem recebido por todos, tomo um delicioso banho quente, estava congelado.Fiz mais de 70 km em sete ou oito horas, nao esta nada mal para um dia de tempestades, nem eu esperava vir ate aquí.Hector me invita para comer um “reviro”, uma farofa feita com ovos, farinha e azeite. O interessante e que devo comë-la colocando em uma colher e mergulhando a colher numa xicara de mate cozido bem quente. Fica delicioso, esquenta o corpo e alimenta.Janto com ele, Jose e Carlos, gente muito boa.

Ser monitorado tem os pros e os contras, e muito bom chegar “podre”e ter alojamento, banho quente e comida, ás vezes.

24/08/05 Quinta dia 67 Agora sao 7:45 h, aquí e o km 1601,dormi super bem no alojamento enquanto chega o frio de novo. Tudo bem, ja e final de Agosto, acho que o frio so dura ate Setembro. Entro no mar entre Setembro e Outubro, entao nao terei tanto frio. Espero que nao tenha muito vento, e disto que tenho medo; nunca atravessei uma rebentacao com este caiaque, ele carregado entao, nao sei como sera!Gordillo faz um mate para mim, e hora de seguir, esta muito frio teria me ferrado9 na barraca com o vento que fez, pois nao tenho mais as roupas de la que deixei com o Aldo em Brasilia (por falta de espaco), muito menos a roupa de neoprene..Antes de sair escuto no radio deles um aviso de Posadas que esta fazendo ventos de 45 km/h ou nos, nao importa eu vou igual. - Tiene muchas olas!- Que avisem al raidista!- Assim finalizam o comunicado.Encolho os ombros e vou embora ás 9:15 h. Sigo para o meio do rio onde tem a correnteza mais forte, ali nao tem abrigo contra o vento e as ondas de traves:- Senhor, estamos sendo invadidos pelas alheta e bochecha de bombordo, as ondas estao varrendo as cobertas de proa e popa.- - Mande toda a tripulacao assumir os postos de combate por bombordo, temos que compensar o ataque por ali.Uma delas pega em cheio no costado e me atinge no rosto. Tomo um banho gelado!- Mierda!- Atingiram o Tenente, saiam de perto, agora ele tera um ataque de furia galopante e jogara o primeiro que estiver na frente pela prancha!- Cara, banho gelado de manha cedo… GRRRR!Meu irmao, quando fica brabinho, enrola a lingua entre os dentes…a Lembrei dele e comecei a sorrir! Sigo em frente, vejo uma gruta enorme do lado paraguayo e sigo para la fotografar, justo onde tem correnteza e ondas bem fortes. Cara, o caiaque pulando como cavalo xucro, que coisa mais doida!Tirei a foto da santa e sigo na direcao da ponte que liga Posadas a Encarnación.Esta ponte cruzei em 1986, com uma Agrale Elefant 125 em uma viagem rumo ao deserto de Arizaro e Atacama, norte da Argentina e Chile. Uma vez mais estou cruzando com meu passado de aventuras aquí no R. Parana. Ainda cruzarei com ele varias vezes.Enormes torres de alta tensao estao sobre o rio, baseadas em estacas de concreto. Passo perto para fotografar e sigo para a ponte onde a correnteza e forte e onde as ondas estao mais picadas.Dali sigo para o lado argentino que esta mais protegido do vento.Encosto em um navio afundado para filmar e fotografar a cidade de Posadas.Foram duas horas ate aquí, sigo costeando a cidade com altos barrancos ate chegar em um belo gramado ao nivel da agua, sao 12:15 h, tres horas de remo. Aproveito para comer uma milaneza enquanto seco um pouco ao sol e converso com Carlos. Ele me conta a estoria dos indios que fugiram dos espanhois com uma imagen da virgen Maria pelo rio Parana. Chegaram em um local chamado Itati onde enterraram a imagen da santa na praia. Hoje Itati tem uma basílica que e meca de procissoes de piraguas, caiaques, bicicletas e assemelhados. Ele segue com uma turma com mais de 20 caiaques de Posadas a Itati. Este ano fecharao mais quatro comportas da represa de Yacireta e o nivel da agua subira mais 4 metros, o camping dele deixara de existir…Parto ás 13 h e sigo cruzando por belissimas mansoes, parecem clubes nauticos.Acaba a city, paro uma hora depois entre a vegetacao da margem para descansar. E um capinzal e ali protege bem do vento contra que nao da tregua e que aliado com as ondas esta me detonando aos poucos. Aquí ja e um lago, muitas arvores submersas e outras que ficarao assim ate o final do ano. Da pena de ver arvores gigantes que irao morrer. E muito ruim ser uma arvore a beira de um barranco, sabendo que um dia caira no rio…Elas nao podem fugir, mas como todos iremos morrer um dia…Li um livro que se chamava “Minha Canoa Rosinha”, era sobre uma arvore que um dia cairia no rio e acabou tendo a “sorte” de ser escolhida para ser uma canoa.Vi um gigantesco ninho de cocotas em uma enorme arvore submersa, este impressionou, deveria ser varios ninhos agregados, um condominio.Vou em frente, teria so 38 km depois de Posadas mas com este forte vento contra e ondas nao estou passando de 5 km/h e isto pode levar 8 h de remo ou mais…Acho que entrei em fria, o sol esta no horizonte, ja sao 18;15 h, nuvens se tingem de vermelho e dourado, a pesar de tudo sou obrigado a filmar e fotografar.Brody, nao te apavora, vamos viajar durante a noite.Estou nervoso, tentando calcular quantos kms andei e quantos faltam. Andar durante a noite com este vento e as ondas sera muito difícil. Ao mesmo tempo que tenho medo, estou na expectativa de como sera e o que farei para sair dessa situacao.E uma mistura de medo e prazer por desfrutar de uma aventura dentro de outra; parece um jogo e que nao sou eu que esta ali, se ferrando aos poucos.Finalmente sai dessa rotina.- E agora tchë?- Vamos a luta!O problema e esse frio, os dedos congelam e os bracos formigam e dao choque sempre que faco um movimento diferente: nem consigo fechar directo o compartimento da filmadora. Para NW ainda esta claro (e a direcao para onde o sol se poem), olhando para tras ate da medo, esta escuro como breu!Retiro a lanterna, deixo-a a mao, como um pao e me preparo psicológicamente para enfrentar isto tudo durante a noite. Ha uma ponta para a frente, quando la cegar deverei estar ha uns 2 km de Ombu, estas sao minhas contas. Perto de 19 h, ja escuro, chego na ponta e, surpresa!Ate onde vejo para adiante no horizonte nao tem luz nenhuma… Brody, estamos ferrados!Com a noite vejo uma outra coisa incrivel, o planeta Marte esta muito proximo da Terra, dia 26 sera o auge e isto so ira se repetir daqui ha 5000 anos. Ele esta tao forte no horizonte que esta dando reflexo na agua, mesmo com ondas, parece uma mini lua.Que loucura! Meu Deus, sera que um dia vou cansar de ver tanta beleza?Vejo varias estrelas cadentes, o Cruzeiro do Sul parece se sobrepor a Via Lactea.O caiaque sobe e desce em ondas que ja nao vejo, se virar agora, neste frio, a coisa beira ao risco de vida pela hipotermia.Estou nervoso, e bonito ver tudo, mas altamente perigoso.- Te acalma brody! Te hembras quando cruzastes a Lagoa dos Patos na parte mais larga? Foi com o caiaque velho, entre 60 e 70 km de noite, aquele temporal incrivel, nao dormia ha tres dias, tive alucinacoes, o caiaque virou as 3 h da madrugada, quase o perdi no escuro e tive hipotermia.- Eu consegui sobreviver e fiz a travessia em 24 h. Foi incrivel!- E quase morrer e voltar ao mesmo tempo, pavor e euforia simultáneamente, isto vicia!Entao segura a barra, tenta manter a calma! Ja nao vejo mais nada, nao tem lua. Sigo ate a proxima ponta e finalmente vejo luzes, estao tao longe que chega a desanimar!Sigo na direcao delas, afastando-me da costa.- Cara nao faz isto, vai piorar a nossa situacao. As luzes estao para W e a costa segue para N-NW. Mais um pouco e nao vejo a ligacao da costa com as luzes. Sera que para la e o Paraguai? Agora nao tenho certeza mais de nada; e melhor seguir a costa que nao vejo direito . Ha troncos submersos e o barulho das ondas quebrando na praia asusta um pouco ao mesmo tempo que me orienta pelo som. As horas passam, o vento castiga, nao e agradavel seguir no escuro, tenho medo de virar. Estou congelando mas vou me acostumando com a escuridao,ate parece que ao avancar a noite estou vendo melhor.- Faco sinais com a lanterna na direcao das luzes, nao quero que venham me buscar.Vou seguindo sem saber se estou entrando em um rio, cruzando para o Paraguai ou em direcao da costa onde estao as luzes. Muito, muito tempo depois chego na costa das luzes que acabam sumindo; deve haver um pontal ao fundo da baia que entrei, devo estar dando uma volta grande mas nao tenho certeza de nada, entao tenho que costear. Comeco a cantar musicas em voz alta para espantar o nervosismo: estrela Dalva, hino farroupilha, etc...Estou podre e congelado; encosto nas arvores da beira, agora estou abrigado do vento e posso filmar com infra-vermelho para registrar o momento, acabo molhando a filmadora que desliga. Olho para o relogio, sao 21h, estou andando desde as 9:15 h da manha...Cara, onde estou? Sera que passei de Ombu? Ja estou nessa luta por mais de 12 h, e um dia depois do outro no sufoco brody. Ontem foram 70 km no sufoco, abaixo de temporais, trovoes; hoje no vendaval o dia inteiro e agora no escuro... Tu ta pedindo cara!- Pelo menos tenho o que contar se sobreviver!- Vamos “queimar esta vida” ate a “ultima ponta”!- Ta ligado?-Sim... e como!As luzes aparecem de novo, era um pontal mesmo.Estou irritado, ver as luzes e uma coisa, chegar nelas e outra, ainda mais com essa m de vento e ondas contra.O caiaque desvia da rota pelas ondas e pelo vento. Xingo o “boludo” em voz alta, estou estressado.Cara, que raiva, e dor pelo corpo todo e essa m de luz que nao chega nunca!As 22:15 h finalmente eu chego, nao tem ninguem, vejo uma placa numa arvore...- Ombu km 1539...-P.. q.. Pariu!-So andei 62 km depois de me ferrar por mais de 13 h...,- Vai se ....-MERDA!Aproximo da praia, bato nas pedras, desco do caiaque e o arrasto sobre as raizes de uma arvore para fora da agua. Um rapaz se aproxima, e Marcos. Ele diz que avisou o pessoal da prefectura. Logo chega mais gente, eles me ajudam a tirar o caiaque mais para cima.Chega a viatura da prefectura eles vieram me buscar e tentam levar o caiaque. Nao cabe, Marcos levara para seu patio e eu sigo com Lopez e Martinez para o destacamento. Amanha sera outro dia, estou encharcado e congelado. Tomo um longo banho quente ate descongelar. O destacamento se chama Rincon del Ombu e fica no alto de um morro. Tomo mate com eles e assisto tv. Faz uns 5 graus centigrados e a previsao e de que chegue a 3 graus esta noite.Fico acordado ate as 1:39 da madrugada, acho que perdi o sono. Vou dormir la no mirante, sobre um colchao enquanto la fora o frio esta de gelar os ossos.

23/08/05 Quinta dia 68Parti so as 10:56 h, a grama ficou branca da geada e eu tenho que seguir o meu caminho. No caminho vimos um veadinho campeiro que cruzou na frente do carro. Ondas e vento mais fraco que ontem, antes de sair de Ombu escutei os caras de Garatë dizendo que eu deveria parar no destacamento deles e dali ser transportado por 35 km por terra ate Ituzaingo, depois da represa de Yacerita. Nao gosto disto, queria chegar mais perto da represa, mas eles podem impedir a continuacao da viagem.- Sim senhor, nao senhor, quero morrer!Sigo ate um pontal e o atravesso direto, so de raiva, pois ontem devo ter feito quase 10 km a mais por nao poder ver para onde ia. Levo 2 h para cruzar ate uma praia onde descansei entre as arvores. Aproveito para lagartear ao sol, ainda esta frio.Sigo ate outro pontal e vejo outra baia maior aindo, vejo um gramado ao fundo e toco direto para la. Duas horas depois vejo uma casa branca para bombordo, fica a mais de uma hora fora da rota., tento ver com o binoculo, mas irritantes ondas nao deixam eu ver direito, sou obrigado a seguir naquela direcao, furioso, pois se nao for ali terei remado 2 h por nada.Para meu alivio era ali mesmo. E uma praia linda, um belo gramado, abrigado do vento e o som dos pica-paus, da para dizer que e um local bucolico!Chego la as 16:30 h, deu quatro horas e meia para fazer uns 24 km (km 1515). Martinez vem me receber. Deixo o caiaque la embaixo e vou ate o destacamento la em cima. Vou olhar a casa de um fora da lei, Gato Moreno, que construiu a casa com furos nas paredes para atirar em quem aparecesse. Depois fico assistindo Tv, esperando o pessoal de Ituzaingo vir me buscar. Acosta prepara um pao caseiro com mumu e mate que tomo com Rojas, Nunez e outro, fui muito bem tratado, como posso ficar brabo com pessoas que se preocupam comigo?O Pessoall chega so as 22:30 h, engatam o reboque com o caiaque na camionete isuzu e vamos por terra 35 km ate ituzaingo.- Capit-ao Kirk!-Sim, senhor!- Avise todos os tripulantes da Enterprise que seremos tele transportados para o Planeta Ituzaingo!- Onde fica isto?- Ninguem sabe! Parece que e o km 1454!

Sou alojado na garagem dos barcos sobre um colchao.

26/08/05 Sexta Dia 69Parto as 8:20 com fumaca saindo da boca. Cruzo para o lado paraguaio, daqui para a frente nao terei mais barragens, foram nove ate aqui. Deixem o rio correr!Passo por bancos de areia, a agua esta limpida.- Senhor oito torpedos cruzaram sob o Maktub, ha mais...Vejo cardumes de peixes de 30 a 40 cm, estao em aguas rasas para se aquecer, devem ser piavas. Ha muitos cascudos tb.O mato e lindo, parece os nossos “capoes” la do sul, deve ter 10 a 15 m de altura, e sao lindos.Escuto sabias larangeiras, corruiras, pombas, aqui nao tem mais sucuri, foi dificil tirar esta “neura” da cabeca. Vejo saracuras e cocotas, o amanecer e lindo e com pouco vento. Fui deslizando assim por 4 h alternando lado argentino e paraguaio ate parar para descansar e arrumar as coisas na popa, para variar nao jantei e nem tomei cafe da manha, resolvi abrir atras e comer uma granola. Aproveito para escrever o diario sentado no caiaque aqui neste pontal abrigado do vento. Escrevo com os pes dentro dágua enquanto os lambaris ficam em roda esperando eu matar as mutucas e maruins e jogar para eles. E uma corrida para ver quem chega primeiro. É incrível, eles ficam olhando para cima e veem a mutuca pousar, alguns tentam peg{a-las antes mesmo de as matar. Devo fazer 70 km ate o proximo destacamento e acho que estou fazendo 10 km/h, entao allez!Parto as 14:30 h e sigo pelo corredor que se forma entre a margem e a ilha, nao tem mais que 100 m e é lindíssimo, vou cruzando sobre bancos de areia e ouvindo o ronco dos bugios que habitam as ilhas, é muito forte.Duas horas depois encontro uma lancha da prefectura, so andei 54 km, foram 6 h de remo, ainda faltam 24 km para Itaibaté, nñ km 1380. Senti o drama, terei de viajar durante a noite de novo, mas é bem mais tranquilo que Ombu!Final de tarde, 18 h sou obrigado a parar e filmar um casal de Tarras sobre um banco de areia.. Preparo para navegar a noite, hoje nao ha vento e verei o planeta Marte refletir no rio, é o dia em que ele estará mais próximo da terra.Escurece de vez, vejo luzes para bombordo e me dirijo para lá. Era um camping, perdi mais de 1 h de remo, pe co para o assustado homem que avise a prefectura que estou indo. Já sao 20 h. Sigo na direcao da mata onde fico abrigado do vento, ali esta lisinho, vejo estrelas cadentes e Marte refletido nas águas.Sabem, ás vezes eu fico extremamente deprimido; sao em momentos como este em que sou “obrigado” a assistir o céu e as nuvens serem tingidos de vermelho e dourado enquanto bandos de pássaros cruzam sobre as {aguas na direcao do horizonte, procurando refúgio para passar a noite . Talvez seja quando fico na dúvida entre ver as estrelas cadentes, Marte e o cruzeiro do sul diretamente ou pelo reflexo delas sobre as águas lisas do rio...Chego em Itaibaté ( km 1380)só as 21 h...Gozado! No dia 69 andei 69 km...Este destacamento tem uma cadeia, tomo um banho quente e vou dormir num colchao que eles me arrumaram, estou ficando mal acostumado!

27/08/05 Sábado dia 70Nao jantei de novo e parto sem café, apenas um mate antes de sair. Tiro uma foto da cadeia e parto em seguida, as 9:25 h.Vento de traves pela bochecha de bombordo, vou cruzando por varias lanchas de pescadores, aqui é regiao de dourado, tem imensos esteros (alagados) e o tempo etá estranho, parece haver uma névoa no ar. Paro numa ilha para comer e descansarEstou bolando outra aventura dentro desta, a idéia está me comichando e vai aumentar a viagem em 400 km, uns 10 dias ou mais. Na viagem de bici para Machu Pichu, o plano era ir até lá e voltar de aviao; acabei indo na direcao do Canadá até encontrar um suico que falou que dava para voltar para o Brasil pelo R. Amazonas desde o R Ucayali, seu formador. Foram 6000 km por rio, polícia, traficantes, Sendero Luminoso, mulheres levando cocaina dentro do corpo, a ilha dos leprosos que passou no filme de Che Guevara (Diário de motocicleta), a cordilheira, ladroes que foram conduzidos pelas Valkyeias para o reino de Hades, era eu ou eles...Na viagem de moto era só até a Terra do Fogo, acabou alterada para cinco meses e 37000 km por toda a América, vi geleiras, vulcoes, fiordes chilenos neve, e o Brasil inteiro. Mais uma namorada se foi, faria tudo de novo...Aventuras sem fim, o que meus olhos viram só eu sei, até onde fui... minha alma aventureira me levou muito além.Entao se eu conseguir vou nessa brody, além de terras e através do sempre!Vejo 4 ilhas adiante, dirijo-me para lá. Preciso descansar. Escuto o ronco dos bugios, nao os posso ver, mas gravo na filmadora o som deles. Estao noutra ilha, atravesso para lá, pego o facao, a maq fotográfica e a filmadora e vou abrindo uma picada pela mata. Tenho medo de cobras venenosas mas preciso ver estes bichos. Quase desisto várias vezes até que consigo ver um ntre os galhos. As mutucas desgraciadas me torturam, pois tenho que ficar quieto para nao espantá-los. Resolvo me aproximar, sao dois machos enormes, estou extasiado vendo os bichos me observando como eu a eles, é outro momento mágico nessa viagem maluca!Aproximo mais ainda, o resto do bando vem me olhar enquanto eu os filmo e fotografo. Eles se cocam, bocejam e botam a língua para fora, acho que estao me gozando!Que espetáculo, deve ter uns 15, as femeas ficam mais afastadas mas todos estao curiosos. Parece que estou na montanha dos gorilas!Vou me aproximar mais, mas eles defecam; dizem que os bugios defecam na mao e atiram nos intrusos.

Lembrei do meu irmao, o Paulo:Lá estávamos nós, no sítio da vó lá no Caí.Meu irmao estava na “privada”, uma casinha perdida entre os pés de bergamota.Eu fui juntando um monte de laranjas podres enquanto ele fazia as necessidades...Devia estar lendo revistinhas (eróticas, eu acho), a casinha balancava... Mas nao tinha vento!Sobre a porta havia uma fresta, era o alvo das laranjas podres.Meus primos entraram na farra, quase fiquei com pena!De repente a porta se abre, ele sai banhado de laranja podre e corre como um cavalo doido na minha direcao. Cada um tenta salvar sua pele, mas o alvo sou eu!Deus me salvou, pois quase quebro o pé ao tropecar numa raiz e me esborrachar no chao. Ao mesmo tempo uma meleca marrom passou sobre mim e se esborrachou no tronco de uma pobre laranjeira! Mesmo assim fui atingido por alguns respingos.Ele fez “aquilo” na própria mao e jogou em mim...Hoje esse cara é Ginecologista,,,Mulheres, exijam que ele use luvas!

Bueno, ganhei o dia, ver os bugios me observando sem medo, fazendo caretas e botando a língua de fora foi algo assim como um momento muito especial em minha vida, obrigado Senhor!Pö, a essa hora eu deveria estar assistndo a um Programa do Leao, nao calouros no Raul Gil, nao, Caldeirao do Hulk...Arg! Obrigado senhor por me livrar desses programas sofríveis das tardes de Sábado!Andei mais uma hora e chego em Yhape ( i-ja-rrapé) km 1345, 35 km em 4 h. O guarda vacilou por nao ter lugar e u, rapidinh, disse que dormiria adiante e chegaria em Itati no dia seguinte. Fui embora feliz da vida enquanto ele dizia:- Es muy peligroso!Eu ri e disse:- No se preocupe, tengo un buen cutillo!Parti as 16:15 h e remei por mais 2 h, custando encontrar um local que pudesse armar a barraca e esconder o caiaque. Muitos alagados onde os dourados davam chapoletacos ao atacar outros peixes, lembrei muito dos meus amigos pescadores de Floripa, o Rojas, o Salcicha, o Fred e o Favaretto, iriam enlouquecer aqui!O tio Laerte e o Milico andaram por aqui faz poucos dias, nao sei exatamente onde.

Hordas de mutucas maruins e mosquitos infernizam enquanto armo a barraca e arrasto o caiaque aqui para cima. Ainda bem que tenho bone com veu. Noite ultra silenciosa, dava para ouvir as folhas caindo, batendo nos galhos até tocar o solo, Dormi com o punhal ao lado mas foi tranquilo. Andei cerca de 50 km hoje.

28/08/05 Domingo dia 71Parti só as 10:50 h, demorei para arrumar tudo, estou me sentindo muito fraco, este vento quente e contra está me detonando, além do que tem sido dias duros e sucessivos, a comida que tenho já nao é suficiente, tenho fome! Já baixei mais de 8 kg!- Cara,nao me faz te pegar nojo!- Deixa de frescura e toca em frente!- Sim senhor!Sigo em frente, mas apenas uma hora depois paro em uma ilha para descansar e abrigar deste vento quente e contra. Há uma duna alta subo para olhar em volta e sigo adiante, entre a ilha e a Argentina, tenho duvidas se nao estou penetrando em um Estero.Passo por um estero chamado Riachuelo.- Senhor, chegamos tarde, acho que a batalha do Riachuelo ja aconteceu!- Soldados! Estou com um plano secreto!Vamos invadir Assunción!A tropa urra de felicidade, novas aventuras esperam nossos heróis no rio Paraguay.- Avisem a tripulacao, reuniao no portaló!- Senhores, o plano é o seguinte: Seguiremos até a cidade de Resistencia (Argentina), na foz do rio Paraguay e dali seguiremos ate a cidade de Clorinda, uns 400 km ao norte. Atravessaremos o Rio até Assunción, passamos uma noite com as paraguaias e depois descemos o rio Até Resistencia de novo onde seguiremos para B. Aires. Serao mais uns 12 dias, mas assim visitarei todas as capitais do mercosul banhadas por agua.- O que é um copo de cerveja para quem está embriagado?- Esse é o nosso comandante!Só tenho que ver os custos e se consigo quem me leve.Ao final do dia chego em Itati, que tem uma descomunal Basílica km 1274, as 19 h. Estou podre. Peco para ficar mais um dia, preciso ir na internet e sei que vou mofar na cadeira. Tomo banho, durmo no alojamento.

Foram dez dias desde Foz e 653 km...

29/08/05 Segunda dia 72 Acordo cedo visito a basilica e faco dois turnos na internet: 9;30 – 13 h e 15 h -23 h, é mole?Agora vou enviar para voces, desculpem os nomes, as vezes eu me empolgo. Chove forte, amanha sigo a batalha, um baita abraco e continuem torcendo por mim, eu tenho certeza de que está ajudando muito. Muito obrigado e um baita abra}o para todos.

Olá amigos, estou na capital do Paraguay e amanha ou domingo inicio outra aventura descendo uns 425 km pelo rio Paraguay até sua foz no rio Parana. Farei um trecho de 32 km pelo rio Parana que já havia feito até Corrientes mas nao importa, assim terei visitado as Capitais do Mercosul por água.Quando chegar em Buenos Aires, terei "fechado a conta" em mais de 4000 km. Gostaram das fotos? Se eu conto ninguém acredita, só peco que ninguém se entusasme, he, he! Este teclado espanhol é ruim de acento e cecedilha, perdoem a falta de acentuacao.

Bueno, vou ao diário desde o último dia que narrei:

30/08/05 Terca dia 73Brody, o que choveu e fez frio nesta noite foi muito cruel, foi um violento temporal, outra frente fria que fez a temperatura cair para 10 graus ou menos.Que coisa boa estar na cama quentinha enquanto lá fora desaba o temporal, chego a encolher-me e a rir de satisfacao, mas tenho que partir daqui há pouco.Arrumo tudo e Gonzalez pede para tentar baixar as fotos, ninguém conseguiu. Nao é que ele e Benitez conseguem? Eles nao tem gravador de cd, mas baixam 6 em um disquete para eu poder enviar para os amigos.Conversei com o comandante Koplin e o sub, señor Nuñes e eles dizem que eu posso ficar o quanto quiser, mas nao quero abusar da hospitalidade, apenas peco mais um tempo para ir no centro enviar as fotos para os amigos e depois partir.Aproveito para almocar um delicioso tallarin con pollo e uma taca de vinho.Que frio dos diabos! É um vento cortante e eu balanco para nao sair quando eles dizem para eu ficar mais um dia, já sao quase 14 h....- Negativo, te manda!- Quer moleza?- Está bem, está bem, já estou saindo!Äs 14:10 h estou partindo, nem que seja para ir até o próximo destacamento; pelo menos o sol apareceu entre as nuvens que correm rápidas vindas do sul.Vou remando por 2:40 h até chegar em Puerto Gonzalez, onde passaria a noite, eles dizem que se eu quiser seguir em frente nao tem problema. Show!Posso andar o quanto quiser e dormir nas belas praias que vejo.Sigo em frente, já sao 16:30 h, dá para andar mais um pouco.Paro adiante para comer duas laranjas, observando uns kalangos nas pedras enquanto maruins atacam sem dó nem piedade, eta bicho irritante!Tomo o rumo w tendo o vento sw pela bochecha de bombordo e comeco a procurar local para dormir, mas justo agora nao encontro. Vou em frente ate encalhar num banco de areia, estou irritado, pois estou com os dedos congelados e tenho que descer na água fria e procurar local mais profundo.Como estou de calcao, fica gelado ao vento, com a capa até dá para encarar.Os pescadores dizem que nao estou tao longe de Passo de La Pátria, o próximo destino, já posso ver as antenas, mas com certeza só chegaria lá já noite. Que faco? As margens tem um barro cinza e grudento e o mato fica mais para trás, além do que tem muitas pedras, melhor seguir em frente.O sol se pos as 18:40 h e eu já estou congelado.Escureceu bem rápido e eu sigo pelo escuro com uma correnteza muito forte.É claro que fico estressado e grito de raiva no meio do rio, no escuro, ao encalhar em outro banco de areia; já nao vejo mais nada e vou reinando enquanto puxo o caiaque com raiva pela água gelada até encontrar águas mais profundas.Resolvo seguir na direcao de umas luzes, pode ser o destacamento. Nao é, converso com um rapaz que diz que está longe ainda. Peco que ele avise , por telefone, que eu estou a caminho, pois foram avisados de que eu nao chegaria hoje.Já está ficando comum andar de noite e com frio. Para piorar, o rapaz diz para eu ter cuidado, pois a correnteza está forte e tem muitas pedras sobre a superfície. Pronto, só falta bater em uma delas e virar, com esta correnteza, frio e escuro fica difícil de chegar na margem e o perigo é a hipotermia.Finalmente chego em Paso de la Pátria, sao 20:30 h um marinheiro está de vigia me esperando, peco que ele puxe as luvas para mim, pois meus dedos congelados estao imprestáveis. Levamos o caiaque mais para cima e depois sigo para a central. O pessoal aperta a minha mao congelada e pergunta se tenho frio.- Frio? Eso no es nadie, estoy acostumbrado con cosas muy peores...Gaucho morre seco mas nao se entrega, nao podemos demonstrar fraqueza, ainda mais que estamos na Argentina, brasileiro tambem tem garra.Sou alojado e tomo um demorado banho quente para descongelar. Assim fica fácil, na Lagoa dos Patos e Mirim, no inverno, eu nao tinha esta moleza. Algumas vezes fui obrigado a esquentar água pois estava perigosamente congelado em temperaturas que beiravam o zero grau.Agora sao 21:57 h, termino de escrever o diário. Estou no km 1240, andei cerca de 39 km, bom para quem iria ficar dormindo em Itati

31/08/05 Quarta dia 74Despeco-me de todos e vou arrumando tudo na beira. Um frio gelado e cortante fazia o nariz pingar como uma torneira enquanto eu tirava o abrigo e ficava só de calcao. Está fazendo 3.9 graus em B. Aires, houve uma violenta tempestade em Montevideo, imagino como nao estará o mar...Descobri duas coisas: Que a foz do rio Paraguay está quase aqui em frente, atrás da ilha que vejo. Se for até Corrientes ou Resistencia, terei de fazer este trecho de novo, pois descerei o rio Paraguay até o rio Paraná e dali passarei de novo por Corrientes, terei feito 32 km duas vezes...- Bem feito, tu nao fostes transportado por 35 km para passar a barragem de yaciretá? Agora paga!E a segunda coisa é que para chegar em Resistencia tem que subir o R Negro por 20 km contra a correnteza.Se eu quero realizar o sonho de Asuncion, tenho que tentar isto em Corrientes, daqui há 32 km...Parti as 10:25, sem pressa pois o objetivo do dia é apenas 32 km.Um vento fortíssimo e de rajadas, vindo de SW obriga a seguir junto da margem onde está mais abrigado.Vejo um cavalo atado a uma canga, andando em círculos enquanto uma menina lhe segue a pé, com uma varinha, para que ele nao pare.Interrompo a viagem e vou ver o que é aquilo.Tem um tronco central que gira como um eixo dentro de um tonel. Neste tonel, o pessoal que está no centro do círculo vai jogando, com pá, aquele barro visguento da margem. Na base do tonel tem uma abertura por onde sai o barro moido pelo eixo que o cavalo faz girar.Quem cuida de tudo é uma senhora que enche o carrinho e leva o barro moido para um menino que o poem dentro de formas com as maos e depois tira das formas. É uma rústica ladrilleria (olaria), ou seja, ladrillo = tijolo.- Tengo 13 hijos para sustener!- Pero este trabajo le toma tiempo, como encontró tiempo para hacer tantos hijos?Ela sorri e as criancas tambem!- Eso es un trabajo muy duro y con este frio...- Asi es mejor para hacer ladrillos...- Y qué le pone al barro? Paja (palha)?- No bosta de caballo!Desatei a rir, dava para ver a meleca verde ali no meio. Claro, o cavalo come grama...Eles fazem cerca de 1500 tijolos por dia!Agradeco por deixarem filmar e sigo meu caminho com este vento irritante e congelante. A senhora disse que hoje esta sendo o dia mais frio do ano por aqui, sorte a minha... Deve estar uns 10 graus, mas a sensacao termica...Paro para almocar um pao com salamito, esqueci o queijo e o chocolate no compartimento de popa. O local é abrigado do vento, mas basta eu passar o pontal( 13 - 13:50 h) e o vento está muito pior, rajadas fortíssimas que quase me levam a loucura de tanto xingar o desgraciado com nomes em espanhol, como Boludo hijo de una Santa Madre y otrosCara, um ódio terrível pois as ondas geladas estavam escorrendo e molhando os paises baixos. Nem vou mais no banheiro, dá medo de nao encontrar mais nada... He, he!Passo entre várias ilhas e avisto Corrientes e a ponte que a liga a Resistëncia.Já é normal ter as ondas, mas em pontos de corredeiras as ondas ficam mais altas e picadas, o pessoal fica olhando eu passar pelo meio daquilo, mas já estou tao acostumado que aproveito para tirar fotos ali no meio. Filmar nao dá!Sigo paralelo a uma longa praia e vejo muita gente retirando aquele barro melequento e levando em velhos caminhoes ou em várias carrocas, cada uma delas puxada por tres cavalos alinhados lado a lado.Eu me distrai olhando aquilo e uma rajada fortíssima pegou na pá do remo e quase virei... GRRR! X$%%&&Vou pelo porto até entrar numa pequena marina (16 h) e colocar o caiaque sob uma construcao feita sobre o rio. O señor Gaúna e outro rapaz ajudam a subir o caiaque pelas escadas para o primeiro piso. Vamos, a pé, até a central da prefectura. Aqui é o km 1208, levei 4:40 h para fazer 32 km.Chegando lá, falo do plano que tenho e da alteracao do raid original.Os caras piraram, teriam de passar rádio, avisar os outros destacamentos, fazer novos papéis e, o pior:-Iria trair a ciumenta Argentina indo dormir 2 ou 3 dias com as paraguaias...Briga certa!- No puedes...- Puedo si, y me voy!- Escucha querida, sólo te pido un tiempo...Vou parar, está virando novela mexicana!Outro problema, o transporte. Eles conhecem um cara da própria prefectura que tem uma mini van (kia) que pode me levar. Conseguem falar com ele, é Miguel.Ele fala comigo e diz que vem para acertar os custos.Brody, o sonho está se tornando realidade!Ele chega, acertamos em us$ 120,00. Assino vários documentos, eles se espantam com a foto da sucuri que envio para eles.Tudo certo.O nome dele é Miguel, de cara simpatizei com ele, dá para ver que é gente boa.- Quando queres irte?- Che, si puedes, vamonos ahora mismo!É tudo muito louco, ainda estou molhado e gelado, recém cheguei e já estou seguindo para o norte...Adrenalina brody, sem ela nao dá para viver.Vamos até o porto, tiramos a carga e o caiaque é colocado sobre o teto da van igual a do tio LaerteEle passa em vários lugars, troca os dólares, compra coisas, diz que se separou faz 10 dias...Convida um amigo para nao voltar sozinho, pois ida e volta por terra dará 700 km. Conheco Alfredo, gente boa demais. Ele foi da aeronáutica e atuou na Guerra das Malvinas como operador de radar. Falo para ele que o grande erro da argentina foi nao ter afundado aquele transatlantico cheio de soldados, ele concorda. O chile cedeu suas bases para os ingleses.Ele me conta que os submarinos russos ajudaram os argentinos com informacoes, assim como os americanos fizeram para os ingleses...Miguel tambem é cantor, o cara faz de tudo.Já noite, cruzamos a ponte e Vemos Corrientes de cima, é muito bonito!Eu me emociono ao entrar na estrada que passei com a bicicleta 25 anos antes.Seguimos pela noite ventosa e congelante tomando mate, conversando e formando uma bela amizade...Quando, naquela vidinha rotineira eu iria fazer tantos novos amigos? Por que nao arriscar? Mal nao faz!Quando cai a ficha eu fico meio que delirando, estou seguindo para Asunción antes mesmo de secar das águas do Rio Paraná...Loucura brother!Que coisa maravilhosa ser assim, muitos amigos o destino mudando a cada instante. Que deliciosa sensacao de liberdade!Cochilo um pouco, pois sei que amanha de manha estarei navegando pelo rio Paraguay, parece que estou sonhando!Chegamos em Puerto Pilcomayo só de madrugada, um vento enregelante, pensei que seguindo para o norte fugiria dele...Foi muito bom ter vindo com Miguel, muitos postos de Gendarmeria que pedem ate certidao de nascimento da mae do caiaque e que liberavam assim que Miguel dizia ser da prefectura:- Sigue, sigue...Os caras arrumam um colchao e dormirei no salao que tem ali. Despeco-me de meus novos amigos e vou dormir já passando das 3 h da manha.Que dia!

01/09/05 Quinta dia 75Os sonhos existem para serem realizados e aqui estou. Tres dias antes nem sonhava em fazer este trajeto, deu uma loucura galopante e estou despertando ao lado do rio Paraguay, frente a Ita Enramada, onde cruzei de bicicleta para aqui, vindo de Asunción.Aqui é o km 1219, tem 411 km até Corrientes, mais 30 km que tenho que fazer indo até o centro de Asunción e vindo até aqui, aumenta a viagem em 440 km mas nao importa.Passo a manha toda assinando papéis, eles deixam eu acessar rapidamente a internet para mandar-lhes as fotos da sucuri (está rendendo) e assim aviso onde estou, quem iria imaginar?Parto só as 10:40 h pelo meio do rio com o vento sul ajudando um pouco. É dose remar contra a correnteza, sao só 15 km mas está me detonando.Após 1:30 h paro para comer 2 paes com salamito. Queria filmar mas vejo dois caras num barquinho de madeira se aproximando e resolvo nao mostrar a filmadora. Converso com eles, está difícil de avancar, entao resolvo seguir pela beira, puxando o maktub com uma corda. A margem está tomada de lixo plástico e outras melecas. Um pouco adiante tenho que remar de novo, pois virou um porto de grandes e velhos navios enferrujados. É tudo tao velho..- Senhor o que vamos tomar em Asunción? Aqui parece ser tao pobre...- Elementar, meu caro Watson!- A guerra deixou muitas viúvas...As paraguaias sao lindas e simpáticas, vao em frente!Depois eu passo por vários navios de guerra, tudo velho pintado de cinza.Lixo, lixo e mais lixo. Porcos no lixo. Favelas quase despencando nos barrancos, saidas de esgoto e um tempo feio com este viento de mierda.Estou irritado, pois o vento aliado a correnteza contra faz o caiaque trocar de rumo direto e eu tenho ataques de fúria e fico xingando o caiaque em voz alta enquanto o pessoal da margem pensa que é com eles.Ainda vou arrumar confusao.Esta mierda de Aduana que nao chega, nao vejo lugar onde deixar o caiaque.Como é que vou na city se nao tem onde deixar o barco?Primeiro vamos na aduana e depois tu pensas em algo.Depois de cinco irritantes horas eu chego na Aduana, um lindo predio na margem do rio. É alto pra caramba, nao tem onde desembarcar, apenas uma rampa ao longe, como vou deixar o caiaque, ali está cheio de pivetes. Tem um cara olhando da varanda da Aduana, falo com ele e o boludo nao responde...Sabe de uma coisa? Que se danem estes burocratas de mierda!Vou entrar no Paraguay e pronto, onde já se viu um conquistador pedir licenca para invadir?Entrei e pronto!Eu estou me autorizando. Sigo em frente, tenho que achar um clube náutico.Já no fim da baia vejo um galpao onde está escrito: REMO!Sigo para lá, é o Clube Náutico Asunción. Fica entre uma favela mas converso com o sr Ido e o Sr Mino. Ido é o encarregado e diz que posso ficar. Levamos o caiaque para a sede e ali tomo um delicioso banho quente.Impressionante a maneira como sou tratado por eles, o pessoal do Paraguay é muito amigo, já tinha sido assim na viagem de bicicleta. Depois sigo com o sr Felix para asede do jornal Ultima Hora, vejo o congresso o palácio do governo, o museu da independencia, telefone, internet e depois volto para o clube ja noite, por dentro da favela. O pessoal ficou preocupado, ali é perigoso de noite. O mais incrível é que achei o local, nao tinha guardado nem o nome da rua.Ido colocou o caiaque numa garagem de lanchas, e fiquei ali junto com uma lancha americana. Dormi dentro dela em um colchonete.

02/09/05 Sexta dia 76Acordo tarde, estava cansado de ontem e por ter dormido só 4 h.Ido é gente boa, vim no centro e escrevo até agora,sao 17:05 h. Devo retornar antes que escureca. Espero a reportagem sair, mando pelo correio e me vou, iniciando uma nova aventura pelo rio Paraguay.É isso aí meus amigos, espero que estejam gostando de compartilhar estas aventuras, vamos ver o que será, nao tenho mapa do rio Paraguay, muitas ilhas e riachos fechados por aguapes.Até um novo despertar.Um baita abraco do amigoAndre!

De Foz do Iguaçú a Puerto Rico

 

De Puerto Rico a Itati
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Mapas por cortesia do Comte. Rodrigo Beheregaray Asterix
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Índice da viagem de Brasília a Porto Alegre

Vídeo com a chegada de André a Porto Alegre

 

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