Conta todas, vovô
Jorge Vidal

A abençoada natureza vista do La Niña

Irmão gêmeo do Vida, o veleiro La Niña é um Delta 36 pés, construído no estaleiro do Ricardo Weber, em Porto Alegre, com desenho de Nestor Völker. Uma beleza de barco! Muito firme, rápido, bom de mar e muito seguro. Construção sólida e bem projetada, seu cock-pit é espaçoso e o layout de convés muito prático. Seu interior é muito confortável e comporta muito bem cinco tripulantes, em navegação oceânica. Seu proprietário é meu querido amigo Márcio Lima, da Equinautic, de Porto Alegre. Comandante competente e tripulante muito safo, ostenta uma simpatia transbordante de sorrisos e alegria. Bela pessoa!

Pois o Márcio me convidou, junto com Paulo Monte Lopes (Merê), Oscar Raul Nieto e Elton Geraldo Presta, para levar o barco da Marina de Ganchos, em Santa Catarina (dirigida muito eficientemente pelo Marcelo Freitas, um jovem que conheço desde menino, da cidade do Rio Grande, filho de um velho amigo meu), para Angra dos Reis, no Rio de Janeiro, pois o La Niña estava a caminho da regata a Fernando de Noronha, no final do ano. Já estava se preparando.

Saímos de Ganchos no dia 1o de maio de 2003, com uma leve brisa leste e com o mar calmo. Meu filho Alfredo, minha nora Ana e meus netos Anandria e João Alberto foram nos dar uma abraço de despedida, pois estavam em Bombas, Santa Catarina, bem próximo. Meu filho sairia no outro dia com o veleiro Zimbros, também um Delta 36, do meu amigo e comandante Osvaldo Hoffmann, para Paranaguá, também a caminho de Fernando de Noronha.

Navegada tranqüila até o cair da tarde. Já no través de Itajaí, o vento rondou para o sul com bastante intensidade, formando logo muito mar, com ondas de bom tamanho. Estava entrando uma frente fria. Noite dura. O vento chegou a 35 milhas e o mar ficou mais agitado ainda. Afastamo-nos aproximadamente 40 milhas da costa e fomos num bordo direto ao porto de Santos, em São Paulo, onde chegamos no outro dia, por volta das 21 horas. Tudo sob controle a bordo, o barco velejando muito bem, mas muito desconfortável, pois o vento era de popa e o mar crescia bastante. Dormir era quase impossível.

No momento em que adentrávamos o canal de Santos, à noite, saíam do porto três enormes navios porta-contêineres, o que tornou a entrada um pouco dificultada, pois o encontro foi bem no cotovelo do início do canal, onde o mesmo é muito estreito. Mas, graças ao charter plotter (excelente instrumento) e ao velho olhômetro do Dr. Merê, superamos tudo com maestria.

Pernoitamos no Yate Clube de Santos, que, diga-se de passagem, é um dos clubes náuticos mais bonitos e bem equipados que eu conheço por este mundo afora. Que organização! Que atenção com os visitantes dos outros clubes! Suas instalações são comparáveis a um hotel 5 estrelas. Fomos maravilhosamente bem recebidos. Nosso muito obrigado à turma do Yate Clube de Santos.

No outro dia, após reabastecermos, seguimos para Ilha Bela. Saímos com o mesmo vento sul e muita onda. Montamos a Ilha da Moela e rumamos para São Sebastião, onde chegamos por volta de 18 horas, com muito vento e chuva. A entrada pelo canal de São Sebastião no rumo sul-norte é muito bonita. Cercada de montanhas por ambos os lados, ostenta belas casas ao longo do percurso, decorado pelo exuberante tom esverdeado da natureza.
Em Ilha Bela, no Yate Clube, outra recepção de primeira qualidade. Clube belíssimo e de grande tradição marinheira. Fomos recebidos com toda a atenção. Esperamos um dia retribuir ao pessoal de Santos e Ilha Bela aqui em Porto Alegre.

Pela madrugada, já no quarto dia, partimos cedo em direção a Angra dos Reis, passando pela ilha Anchieta, com sua bela enseada e uma calma prainha, e velejando sempre bem pela linda costa norte do Estado de São Paulo. O vento havia diminuído e o mar acalmado um pouco. A navegação até Angra tornou-se mais confortável. Até apareceu um pouco de sol.

A bordo do La Niña, o Elton e o Merê, além de bons marinheiros, preparavam pratos deliciosos para a tripulação. Foram servidas todas as refeições do dia, apesar do mar agitado, durante a totalidade do percurso, coisa rara nessas ocasiões. Passamos muito bem alimentados. Conversávamos muito e as horas passavam sem que percebêssemos. Uma boa e experiente tripulação significa segurança.

No final de uma belíssima tarde, chegamos a Paraty e atracamos na Marina do Engenho, do navegador Amir Klink.
No outro dia pela manhã, visitamos o veleiro Paratii II, do famoso navegador. Fomos recebidos pelo tripulante Flávio Fontes, que nos mostrou todo o barco e a eficiência do seu funcionamento. Bela construção! Trata-se de um magnífico veleiro polar, muito resistente, com interior muito acolhedor.

Nesse mesmo dia, visitamos a atriz Maria Dela Costa, no Hotel Coxixo, de sua propriedade. Em 1973, quando da passagem por Paraty, no veleiro Plâncton, havíamos jantado na companhia dela e de seu marido, o ator Sandro Polônio, já falecido, no mesmo Hotel Coxixo, na época recém inaugurado. Recordamos aqueles inesquecíveis momentos e festejamos a alegria de fazê-lo novamente, após quase 30 anos. Ela, por sinal, continua linda e cativante. Gaúcha de nascimento, pois é de Flores da Cunha, sempre tem muitas e alegres histórias para contar. Havia sido condecorada recentemente pelo ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, em Brasília, pela sua obra em prol da cultura brasileira. Maria Dela Costa vive há muitos anos em Paraty, onde se sente maravilhosamente bem consigo mesma, mas saudosa do seu companheiro, Sandro.

Aquela baía de Ilha Grande, em Angra dos Reis, Paraty e adjacências, é realmente muito linda. Que praias, que ilhas, que enseadas e baías, quanta beleza de verde luxuriante e de azul do mar, cristalino! Sem dúvida, um dos lugares mais bonitos do mundo. Ali a natureza mostra tudo que tem de bonito e agradável aos olhos e ao coração, pois você se sente bem no seu interior. Ali, sim, se confirma que “o Brasil é abençoado por Deus e bonito por natureza”, como diz o canto popular.