Navegando com medo
Lendas e crenças da Idade Média
Danilo Chagas Ribeiro


Um homem espia o abismo, da beira do prato do mundo

Imagine-se navegando mar adentro, à noite, em águas desconhecidas, sem cartas nem instrumentos. E com a crença de que estas águas estão sobre um prato. E ainda, que se a beira do prato for alcançada, o barco cairá no abismo. Leve em conta também que o barco não pode orçar. Se chegar empopado na beira do prato, não tem como voltar...
Esta era a crença dos navegadores da época do Descobrimento.

No século XV os europeus não tinham nem noção do mapa mundi. Acreditavam nas idéias do filósofo grego Aristóteles (séc. IV AC) e do astrônomo também grego Ptolomeu (séc. II DC), segundo quem a Terra era o centro do universo.

Olho no meio da testa
Da ignorância nasce o medo. Os marinheiros poderiam ser atacados por terríveis monstros "com orelhas maiores que as de burro, nariz com quatro ventas e um só olho no meio da testa", diz o relato do português Francisco Correia ao relatar o naufrágio da nau Nossa Senhora da Candelária, na ilha Incógnita, no séc. XVII.

Homens-sereias
Colombo relatou sobre sereias que encontrou na América. E o padre jesuíta Henry Enriquez chegou a ver além das serias, os tritões, que eram homens-sereias. Isso foi em Manor. Já Eusébio de Nuremberg, outro jesuíta, garantia que os marinheiros da Galícia "descendem de um tritão e de uma moça (bastante avoada) das redondezas" (História Natural, séc. XVI).

Sereia trabalhadora
A história conta que uma sereia foi exibida em 1.548 pelo arquiduque Filipe da Áustria a exibiu. "Ela viveu longos anos em um convento. Ela não falava, mas trabalhava e tecia. Só que não podia corrigir seu amor pela água e fazia todos os esforços para a ela voltar".

Seios de mulher, gosto de vaca
O francês Ganeau classificou as sereias entre os moluscos:
"Entre os moluscos há um peixe com rosto e seios de mulher, do tamanho de um novilho, cuja carne tem gosto de vaca. Dizem que seus dentes são um bom remédio para a desinteria" (Ganeau, Tratado de História Natural, séc. XVII).

O Cacique e o padre
A crença nos monstros marinhos e em outras "verdades" da época dava tanta certeza quanto a crença religiosa nas diversas religiões até hoje. Quem crê, não precisa de provas. Imagine portanto o que era navegar em águas tão aterrorizantes.
E falando em crenças, cito relatos, de 1.568, sobre a atitude motivada pela crença religiosa, ou fé, dos mesmos homens que acreditavam nos monstros marinhos.

Diálogo entre um cacique inca e um padre espanhol:
"Atahualpa disse quanto à religião, que a sua era muito boa e que se dava muito bem com ela. Ele dizia além disso que Jesus Cristo tinha morrido, mas que o Sol e a Lua nunca morriam, e perguntou ao frade como é que ele sabia que o Deus dos cristãos tinha criado o mundo. Frei Vicente respondeu-lhe que aquele livro o dizia, e ao dizê-lo deu-lhe seu breviário. Atahualpa tomou-o, abriu-o, olhou-o de todos os lados, folheou-o e atirou-o ao chão. Frei Vicente apanhou o seu breviário e foi ter com Pizarro, gritando: "Ele atirou ao chão os Evangelhos! Vingança, Cristãos! Carreguem sobre eles!" (F. Lopez de Gomara, Histórias das Índias, 1568).

"...Depois de terem deixado a capela, esses homens (indígenas) jogaram as imagens (cristãs) ao solo, cobriram-nas com um punhado de terra e urinaram sobre elas; vendo isto, Bartolomeu, irmão de Colombo, decidiu puni-los de modo bem cristão ... levou alguns homens maus à justiça e, uma vez definido o crime, fez com que fossem queimados em público. (F. Colombo, historiador espanhol, séc. XVI).

Fonte consultada: "Navegar é Preciso - Grandes Descobrimentos Marítimos Europeus", de Janaína Amado e Ledonias F Garcia (1989).

 

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