Quack!
Danilo Chagas Ribeiro

No fim da tarde estou no barco atracado no trapiche. Reúno meus badulaques em uma sacola de supermercado, pra não esquecer nada: carteira, celular, óculos de véio, essas coisas. Penduro a sacola no mordedor.

Passa um marinheiro gentil: Doutor, quer que eu recolha a mangueira d'água pro senhor? Quero, sim. Muito obrigado.
O cara vai puxando a mangueira, que bate na sacola. E que vai pra água.

A sacola boiava, não sei o porquê. Pelo peso devia ter afundado na hora!
Ta bom, disse pra mim mesmo... Vai cair n'água , ou vai ficar olhando?

Fui descendo por debaixo do guarda-mancebo, me arranhando no trilho do ponto, caindo devagar pra não assustar a sacola.
O pato fez quack e saiu de perto. Há poucos segundos eu calmamente me preparava pra ir embora. Agora tinha água pelo pescoço, uma mão na borda, lá em cima, a outra na sacola, e me alegrava em tê-la agarrado pelo lado certo.

Tento me erguer pela borda. É minha primeira vez. Tenho vontade de rir da ilusão, mas falta humor. Confesso que até me passou pela cabeça fazer alguma alusão à progenitora do rapaz, mas era Dia das Mães...

Dou umas bufadas de nervoso misturado com brabo, e enquanto vou me movimentando com as mãos lá em cima na borda, sinto os braços, de tão estirados. Vou chegando à escada na popa, meu destino. Está amarrada. Lá em cima! O motor está lá em cima também, com a rabeta fora d'água. Mas o marinheiro, todo sem jeito, já está ali no cockpit:

O senhor quer que eu baixe a escada?
Se não for pedir demais...

Decidi uma coisa hoje: a escada será amarrada no púlpito, com uma série de nós-de-correr, tipo croché, daqueles que a gente vai puxando a ponta e vão se desfazendo. E vou deixar a ponta bem comprida. Pro lado de fora!