Partida rápida
Levantando âncora ao amanhecer
Danilo Chagas Ribeiro


Alvorada no Canibal

Sepultura, Bombinhas, SC, Fev 2006.
Em um cruzeiro de final de semana acorda-se devagar no domingo, sem vontade de ir embora. Já em um cruzeiro de alguns dias, com rota ainda por navegar, a partida pela manhã é diferente.

À noite já temos planos para o dia seguinte. Com o passar do tempo adaptamo-nos aos horários do nascer e do pôr-do-sol. Vamos dormir cedo, talvez às dez e meia, no máximo à meia-noite, e despertamos no nascer do sol.

Na praia da Sepultura, ao lado de Bombinhas, o galo digital cantou às 7 horas no Canibal. Saí da cabine de proa direto para o cockpit do Delta36, dando uma batidinha na porta da cabine do comandante. Olhei para o céu com os olhos quase fechados. Estava um pouco nublado. O vento entrava ainda do SE, bem fraco.


Passamos pela Ilha do Amendoim preparando o café

Estimei que continuaria assim de SE, e que iria aumentar. Vamos embora, pensei. O Andreas apareceu no cockpit e confirmou minha previsão.
Partida no motor. Instrumentos ligados. O guincho da âncora está acordando definitivamente quem ainda não acordou na cabine de proa...

- A proa ta safa!

Escutei o arranhar típico da caixa engrenando lá na popa. Contornamos a Ponta das Garoupas e a Ponta de Bombas em uns 20 minutos, no visual, e seguimos com o piloto automático no rumo magnético 207 para a passagem da Ilha do Amendoim. Estávamos navegando a motor ainda, mas estávamos navegando. Só então veio a higiene pessoal, troca de roupa, etc. Quando isso estiver pronto, já estaremos lá adiante. Um de nós poderá até voltar a dormir, se quiser.


Café da manhã no Canibal, navegando na Ponta de Zimbros

O Andreas passou o café e eu arrumei a mesa no cockpit. Tomamos o café calmamente, assistindo o sol crescer no horizonte de um mar bem tranqüilo. Navegando. E revendo detalhes do plano de navegação. Este procedimento de partida rápida é muito bom.

Aquilo de acordar e ficar tomando mate e pensando na vida, para só depois do café partir, me deixa mais ansioso que anão em comício.

Covardia gastronômica
Os recursos disponíveis no Canibal para a gastronomia são muito bons. Além do fogão com forno, há micro-onda, churrasqueira e um treco para frituras fora da cozinha, pia com duas cubas e refrigerador. A operação deste equipamento corria por conta de duas cozinheiras inspiradas, com maridos palpiteiros.
Chegaram a fazer um molho para os camarões grandes, que incluía queijo roquefort e outros mimos culinários mais. Que saiba disso quem pensa que culinária a bordo é feita com molhos prontos ou cubinhos de caldo de carne, qualhados de glutamato monossódico (jinomoto) - arghhh!
Com frutos do mar à reveria, e com carne dos pampas pra assar ao maricá, o cruzeiro foi uma covardia gastronômica.

Colesterol a bordo
Valho-me sempre da informação altamente confortante de um experiente médico, velejador e amigo meu, que me garantiu que não há o que se coma ou beba a bordo de um veleiro que possa alterar o colesterol. Isso é que é médico, digo, amigo!

Notas:
1. Na Marinha do Brasil não se fala em "levantar âncora". É "suspender o ferro".
2. O Rumo Magnético considera a declinação magnética. As cartas náuticas são orientadas pelo Norte Verdadeiro. Apesar do GPS poder trabalhar com Rumos Verdadeiros, como os timoneiros utilizam a bússola por praticidade (grande, analógica, em frente à roda de leme), é comum o navegador configurar o GPS também para Rumos Magnéticos. Assim, na hora de passar um rumo ao timoneiro, fala-se na mesma língüa.

 

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