Belmonte, Bahia
Onde o mar recuou e o tempo parou
Texto e fotos: Danilo Chagas Ribeiro

Ago 2004
Poderia-se imaginar que uma pacata e pequena cidade litorânea no sul da Bahia, a apenas 72km ao norte de Porto Seguro, pudesse ter pelo menos parte do enorme afluxo de turistas que esta cidade tem o ano todo. Afinal, Porto Seguro tem até aeroporto internacional.

Mas a vida em Belmonte nada tem a ver com a da vizinha rica. Seu auge ocorreu lá por 1940, por conta do sucesso na produção de cacau. O sucesso se foi, a exemplo do mar, que recuou 1.500m há um século, deixando o farol no centro da cidade.

Isolamento
Alguns casarões coloniais testemunham os bons tempos de Belmonte, assim batizada em alusão à cidade natal do navegante Pedro Álvares Cabral. A cidade é pobre e isolada.

Há até quatro anos atrás a única ligação com o resto do Brasil ocorria por um acesso de chão batido à BR-101. Em épocas de alagamento, aviões da Força Aérea socorriam a cidade levando gêneros alimentícios à população isolada. Somente em 2000 foi construída a ligação asfaltada com Porto Seguro, via Cabrália.

Andando-se pela cidadezinha não há quem não olhe para a gente. Forasteiros por lá são raros. É como se andássemos fantasiados na rua. O pessoal fica encarando, admirado.

Rio Jequitinhonha
O Rio Jequitinhonha, de origem mineira, banha Belmonte com águas barrentas que turvam o mar, 2km ao norte da cidade.

As praias são desertas, à exceção de duas casas de veranistas de outros estados. O rio vem meandrando entre coqueirais sem fim. O côco sai dali a R$0,30 a unidade para ser vendido a R$1,30 nas praias de Salvador.

O êxodo rural é acentuado e a mão de obra farta e barata pela falta de demanda. Não há indústria na cidade a não ser uma recente beneficiadora de madeira que embarca o produto em terminal próprio construído mar adentro (investimento de grande porte).

Forasteiros e comilança
Em Belmonte moram também alguns paulistas e estrangeiros de situação econômica estável, em busca de tranqüilidade. Essa comunidade de forasteiros acaba vivendo com baianas bem jovens e muito bonitas, com aquela cor saudável e um jeito de ser cativante.

O pessoal de fora cultiva um relacionamento estreito. Reunem-se ora na casa de um, ora de outro, com manjares dos deuses e muita prosa.

Camarões imensos grelhados, deliciosas moquecas de pitu (uma cruza de camarão com lagosta), sashimi de robalo, lagosta, e muito peixe fresco. Azeite de dendê e leite de côco em tudo.

À exceção da bebida, tudo isso é fornecido a preços muito mais baixos do que nas grandes cidades.

Estilo baiano
Por todas estas características a vida lá é muito interessante para quem procura sossego.

O conhecido estilo de vida baiano é por ali ainda mais marcante. Pelo jeito, a palavra estresse ainda não é conhecida na cidade: vínhamos pela avenida principal de Belmonte quando um caminhão-caçamba a uns 50m adiante de nós, parou. Parou no meio da rua, interrompendo o tráfego. O motorista desceu e foi para a calçada. Demos ré até o vão no canteiro central, e seguimos pela contra-mão. Quando passamos pelo caminhão, vimos o motorista bebendo com amigos em frente ao bar onde parou. E isso é comum por lá, disse-nos o funcionário do meu amigo anfitrião.

Um empreiteiro de irrigação da região fez questão de dizer que trabalha para viver, e não para morrer trabalhando. Isso parece ser igual em todo o mundo, mas com tempero e sotaque baiano, tem outra dimensão. Quem já foi à Bahia, sabe.

Contou um paulista de meia-idade que, ao reclamar do marceneiro a má qualidade do móvel fornecido, ouviu dele:

- Vacilei, dotor...

E ficou assim.

Um Mar Indisciplinado
Encomendado em 1.892 à mesma empresa que construiu a Torre Eiffel, o farol de Belmonte teve que ser removido em 1907 porque o avanço do mar terra adentro fez com que ele ficasse dentro d'água. Anos depois, novamente o farol estava ilhado e mais uma vez foi transferido para nova posição, onde está até hoje.

Ocorre que com o passar dos anos o mar resolveu recuar, devolvendo 1.500m de terra à cidade. Isto significa que o farol hoje está a esta distância da praia, no centro da cidade. Como os baianos, o mar da Bahia parece também não se importar muito com disciplina, regras e afins.
Construído em ferro, é fixado por 8 parafusos chumbados ao solo. Tem 35m de altura e alcance de 18 milhas náuticas.

Acesso
Belmonte situa-se na região sul da Bahia (aproximadamente S15º 52' , W38º 52'). A cidade com mais recursos nas proximidades é Porto Seguro, de onde se roda 22km em direção ao norte por estrada em bom estado até Cabrália, onde uma balsa atravessa o rio em horários pré-determinados. Daí em diante são mais 50km de asfalto em meio a coqueirais.

Clima
A temperatura na Bahia, mesmo quando cai, é mais alta do que aqui no extremo sul do Brasil. Isso me faz lembrar de meu primo Duca que veleja na Suécia, regozijando-se de que no Mar Báltico (Latitude 60º), a água a 15º no Verão é muito mais agradável do que no Atlântico Norte... (Ah, então ta.) De qualquer maneira, consolo-me em saber que, mesmo ainda no inverno, os sabiás já começaram a cantar por aqui, anunciando que logo logo vêm aí os tempos de Primavera.

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Assuntos relacionados
(links acrescentados após a publicação original desta crônica)

Petista confessa como infectou o cacau no sul da Bahia
Cacau - Terror biológico pode explicar praga na lavoura baiana
. (Revista Veja, edição 1961, de 21 de junho de 2006, por Policarpo Junior)
“Petistas são acusados de disseminar a praga que destruiu a lavoura de cacau no sul da Bahia”

Transgressão e regressão do mar
Em 2008~2009 houve nova transgressão do mar no sul da Bahia. As casas junto à praia de Belmonte foram tomadas pelas águas. Além das casas, as benfeitorias e tudo o que se possa imaginar que houvesse por ali, incluindo o mangue, sucumbiu ao avanço do mar.

Imagens de Belmonte e região.

Pesqueiros de lagosta em Cabrália

 

 

 

 

 

Prosa de frente pro mar, em Belmonte

Ampliação desta imagem em Navegadores 86


 

 

Belmonte

 

 

 

Navegando no mangue

 

Belmonte

 

Telhas "feitas nas coxas"
Diz-se que a expressão vem do tempo em que os escravos moldavam as telhas sobre as coxas

 

 

Preparando comida portuguesa na Bahia

 

Porto Seguro
Um rio com um recife na foz - tudo que Pedro Álvares Cabral tinha direito ao atracar por aqui.

 

 

Vendedora de adereços em Porto Seguro

E foi por ali forjada a já habitual pergunta...


02 Set 2005 Leidiran Fonsêca
Quero lhe parabenizar Danilo pela belíssima matéria sobre minha terra Belmonte. Revê-la em seus click's me alegrou e me deixou na saudade daqueles dias que aproveitava o rio, a praia, a cidade e os atrativos que só eu conhecia em minha infância e juventude.
Embora meus 22 anos não pareçam tão distantes daqueles tempos, mas, saber que um lugar tão gostoso não me oferece opções de trabalho, me entristece por matar a saudade por aqui, por isso lhe agradeço por me proporcionar estas imagens e histórias!
Leidiran Fonsêca

30 Set 2005 Silvio Reis
Ótimo rever Belmonte, onde morei por 6 anos e encontrei minha outra metade. Onde construi meu barco "ILKA", fundamos a cooperativa de pesca com ajuda do Raimundo, do Zézo, Maré Alta, e toda a Colônia de Pescadores Z-21 no Bairro da Biela em 1984.
Me orgulho de um dia ter sido um forasteiro paulista, como você bem narra, e que um dia pensou que faria um Belmontense trabalhar de segunda a domingo, sem necessariamente ficar rico lógico, mas nunca esperar acabar o peixe para voltar ao alto mar. Na Av. Rio Mar (foto acima) andar descanso, sem camisa (alias só usava camisa para entrar no Banco do Brasil), parar no posto do falecido Carlinhos e beber um boa cachaça de Dr. Custódio com tira gosto de camarão seco.
Danilo Obrigado.
Bons ventos.
Silvio Reis

15 Mai 2007
Bel tam lindo
Danilo, parabéns pela mateira, também sou Belmontense e muito me orgulho de ter nascido no distrito de Boca do Codrrego exatamente em 19 de julho de 1954, dia de São Vicente, o qual os meus pais me deram o nome de Adelmo " Vicente " em referência ao Santo padroeiro dos pobres.
Obrigado
Adelmo


20 Mai 2008
Será que alguém de vocês se lembra de mim?
Trabalhei em Belmonte, nas fazendas de Da. Abiah Reuter, de 1956 a 1958. Tirei, com o amigo Raimundo Filomeno dos Santos, piaçava das matas, com o nosso trator "UNIMOG" e carreta. Viajei de mula, chamada "Novela", de Belmonte para Porto Seguro, passande em Mojiquiçaba, depois subindo para o Segredo, e entrando a esquerda. Para a direita ficava a estrada para as fazendas no "Rio Grande de Belmonte", descrito pelo Principe de Wied-Neuwied em 1831. O meu primeiro namoro no Brasil começou na praça, onde a gente rodava, no lindo luar do Sul da Bahia, as moças e os rapazes no sentido contrário.
Será que alguém de vocês se lembra de mim? Então escrevam. Tenho 70 anos e vivo em Florianópolis, com minha esposa Mineira e minhas cachorras, as únicas que falam comigo na minha lingua materna, o alemão. Mas, nos sonhos escuto, às vezes, este ruido metálico e suave dos coqueiros de Belmonte.
Christian (heimpel@uol.com.br)

23 Out 2009
que deus de muita saude e alegria pra maria dajuda de belmonte

11 Nov 2009
Oi
Estive em belmonte e guardo lembranças muito gostosa, trabalhei na estrada para a Veracel, fiquei uns 8 meses, deixei muitos amigos ai, Sonia(soninha) do Acarajé, muito gostoso, o peixe Peroá com aquele pepinozinho verde, a radialista que mora perto do Farol, os peixes de Curió, fiquei até devendo uma grana para ele, espero voltar uma dia para paga-lo. O dono do Posto de Gasolina, Pousada Galapagos, outra q fica em frente ao rio, o mercado, etc.

11 Nov 2009
Marcos Costa

Que delicia e Belmonte , creio que lá é um pequeno pedaço do paraiso , não vejo o dia de poder voltae a viver lá  , espero logo que tudo fique mas facil mas emprego pois lá sim é viver ,muito verde e natureza por onde olharmos ,qualidade de vida maravilhosa ,que bom seria viver em Belmonte. Saudações ao meu amigo pescador Pilú.

19 Nov 2009
Adelino Magnavita

Me emociono ao ler e rever imagens de onde vivi os melhores dias de minha vida. So quem viveu e conviveu, sabe literalmente a verdeira expressão da palavra ´´HOSPITALIDADE´´ sinto-me envaidecido por ter feito parte desta bonita comunidade. aAte breve!!!    
´´Boa Sorte a T o d o s´´

27 Nov 2009
ADRIANA MENEZES

OLA AMIGOS DE BELMONTE SOU ADRIANA MENEZES SALES
FILHA DO BILISCA LUA ,SE ALGUEM SOUBER DO PARADEIRO DE MINHA MAE , QUE PROVAVELMENTE MORA ,EM BELMONTE OU NAS PROXIMIDADES POR FAVOR ME AVISEM , ESTOU MORANDO EM SAO PAULO;

02 Dez 2009
andre pereira brito

gostei de ver essas  imagem sou nacido no vale do jequitinha e nunca tive a pocibilidade de ver o encotro do rio com o ma naci e criei em salto da divisa gostaria de receber mais imajens eu ao minha terra

14 Jan 2010
Winston Silva Fischer
Danilo, boa tarde sou nascido em Belmonte,e ainda tenho parentes lá,sou primo de Marly espôsa do Antonio Elias, revendo fotos antigas encontrei uma foto muito interessante, trata-se de um CACHALOTE que apareceu morto nas praias de Belmonte em 03-11-1941.
Winston Silva Fischer

20 Out 2010
Gaetano Cavallaro, Trento - Italia
Complimenti per il bellissimo sito, mi viene il desiderio di venire  e vedere di persona la bellezza della vostra regione, mi piacerebbe saperne di piu sulla vostra citta:


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