Rio Cornélios com a Serra Geral ao fundo

O litoral norte gaúcho tem uma série de lagoas interligadas por rios e canais, entre a Serra Geral e o mar.
Nesta serra encontra-se ainda virgem um dos poucos resquícios da Mata Atlântica, presente em todo o litoral brasileiro até alguns séculos atrás.
Navegar nesta região com a paisagem emoldurada pelas montanhas à oeste é muito bonito.

A existência de várias pontes rodoviárias de pouca altura prejudica os barcos à vela. Alguns veleiros Bruma19 da região têm o estai de popa preparado para baixar o mastro. O assoreamento também limita a navegação, sendo necessário o uso de bolina retrátil.

Colhereiros cor-de-rosa no Rio Cornélios

As lagoas e rios da região têm diversos arroios para explorar. Para quem gosta de navegar "na umidade", a região é muito especial.

A fauna é abundante. Vimos muitos bandos de aves, como os de colhereiros, que já não se vê facilmente hoje em dia. Os campos são bem verdes. A barranca do Cornélios é de argila na maior parte do trecho, mas há partes com areia.

A embarcação ideal parece ser o inflável de casco rígido de 5 metros, ou lanchas de baixo calado, como a Ninpha (17' x 130HP) que utilizamos no sábado, 02out04. Embarcações com menos de 5 metros podem sofrer dificuldades com as ondas nas lagoas: quando o Nordeste sopra forte, as lagoas ficam bem mal humoradas, principalmente a Itapeva.

Rio Cardoso

A paisagem nos rios é bucólica. A região não é industrializada. A água aparenta ser pura. Não há tráfego algum, a não ser de canoas para pesca amadora, a remos, nos rios.

Em caso de pane, é muito pouco provável dispor de socorro. Ao desatracarmos, pedimos o telefone do pescador ribeirinho.

A lancha foi colocada n'água em rampa de concreto ao lado da ponte sobre o Rio Cornélios, na localidade de mesmo nome (uns 300m da foz, na Lagoa dos Quadros). Uma rampa rudimentar junto à ponte da BR-101 sobre o Rio Cardoso, no município de Três Cachoeiras foi usada para tirar a lancha d'água.

O tráfego fluvial na região foi muito importante, interligando Osório a Torres. Da Lagoa da Conceição, em Osório, os vapores subiam pela Lagoa do Peixoto, Canal do Caconde, Lagoa da Pinguela, Lagoa Palmital, Lagoa das Malvas, Canal do João Pedro, Lagoa dos Quadros, Rio Cornélios e Lagoa Itapeva.

As mercadorias trafegavam de Osório para Porto Alegre através de um trenzinho até Palmares do Sul, de onde seguiam pela Lagoa do Casamento, Lagoa dos Patos e Rio Guaíba.

Gesto surpreendente em Três Cachoeiras
Imagine-se em uma situação assim: seu carro não consegue tracionar a carreta com a lancha de dentro d'água. Em breve estará escuro. V. está em terra estranha. Não conhece ninguém no lugar. Um motorista de táxi chama o irmão, agricultor, dono de um jeep 4X4. Ambos dedicam-se por mais de hora tentando tirar o barco d'água, até que conseguem.
Eles nunca o viram na vida, e sabem que certamente nunca mais o verão. V. tem situação econômica aparentemente melhor que a deles e está em atividade de lazer.
Quando V. pergunta quanto deve a eles, ouve:
- Nada!.

Meu irmão, dono da lancha, insistiu em pagar pela ajuda, mas Cláudio e Sadi não queriam saber de cobrar pelo trabalho. Celso insistiu muito querendo pagar, já que nos quebraram um grande galho. Sadi respondeu que já "ficou empenhado" muitas vezes e que sempre foi ajudado. Não houve jeito de aceitarem pagamento.

- Então vamos pelo menos tomar uma cerveja?
O convite também não deu certo: Cláudio lembrou que os bolichos não podiam vender bebida alcoólica (Lei Seca por causa das eleições).

Foi uma atitude surpreendente pra quem vive na cidade, onde tudo tem um preço, em dinheiro. Que belo exemplo deu essa dupla de Três Cachoeiras!

Já quase de saída, desconsolado por não poder recompensar, Celso viu no carro dele aquele cabo elétrico grosso com garras, para fazer ponte entre baterias (a tal da "chupeta"). Era novo, nunca havia usado. Deu de presente ao Sadi.

Depois do passeio, no churrasco, entre os comentários sobre a navegada, a freqüente lembrança e admiração do gesto bonito dos irmãos Cláudio e Sadi, de Três Cachoeiras.