Uma costa de respeito
Velejando de P. Alegre a Florianópolis
Danilo Chagas Ribeiro
Fev-2007
Velejar as 24 milhas do Rio Guaíba, desde Porto Alegre até Itapuã, é uma meta desafiadora para iniciantes. E de lá seguir adiante, até Rio Grande, descendo as 140 milhas da Lagoa dos Patos, este mar de água doce, pode ser uma grande aventura para outros. Tudo depende do barco, da tripulação e das condições da navegação.
Seguir viagem, velejando de Rio Grande a Florianópolis, vencendo 350 milhas de marzão com raríssimas opções de abrigo é algo impensável para muitos.
Enquanto escrevo estas linhas, o veleiro Victor está navegando para Angra dos Reis, desde Porto Alegre. O veleiro Solaris desatracou do mesmo porto e está no Caribe, algo que a maioria sequer sonha realizar.
Tem ainda os que planejam sair neste ano deste porto nem tão alegre e alcançar a Europa, como o Comandante Gigante, do Entre Pólos. E tem mais, muito mais. Sempre haverá uma volta ao mundo em solitário ainda mais desafiadora, e alguém por realizá-la.
Costa mal afamada
Em janeiro de 2007 naveguei de Porto Alegre a Florianópolis no veleiro Feitiço, na companhia de bons amigos. Foi uma velejada inesquecível.
A costa do litoral gaúcho tem muitas histórias de naufrágios e de sérias dificuldades sofridas pelos navegantes. Com uma única praia de 340 milhas de extensão, desde o Chuí até Torres, a costa do Rio Grande do Sul não tem enseadas nem cabos, nem rios que se possa entrar. Não tem abrigo. Apenas areia com algumas dunas (foto abaixo). Não tem rochas, nem matas, nem nada. É uma praia deserta e ventosa, com arrebentação. Os balneários existentes não oferecem qualquer tipo de abrigo. Os poucos rios que desaguam no mar, como o Tramandaí e o Mampituba, não oferecem condições para um veleiro arribar (abrigar-se).
A corrente marítima (norte-sul) é notável na costa gaúcha. Os ventos são fortes na região, predominando o nordeste e o sudeste, e podem alternar-se em pouco tempo em função das frentes que vêm do pólo. É comum o vento e as ondas estarem em direções diferentes.
Ou vai, ou volta
De tudo, o que traz mais fama a esta costa é a falta de abrigo. Uma vez no mar pela barra de Rio Grande em direção a Florianópolis, o único abrigo disponível é Imbituba, mas já na chegada (25 milhas) de Florianópolis. A arribada em Laguna (foto ao lado), a 40 milhas da Ilha de Santa Catarina, pode ser tentada somente em emergências e se o mar estiver calmo, tal a dificuldade de acesso com vento forte.
Se o nordestão entrar forte, um veleiro subindo a costa até antes de Imbituba, terá que voltar para Rio Grande, 330 milhas atrás. Ou seja, em caso de intempérie, a tripulação deverá saber suportar o que vier. Uma vez no mar, ou vai ou volta, porque não tem onde parar pelo caminho. O trecho (sem abrigo) entre a Barra de Rio Grande e o porto de Imbituba representa 50 horas de navegação contínua a 6 nós.
Perigos do mar
São dificuldades como estas que geram admiração, medo ou desprezo por parte de quem nunca navegou. Geram também o respeito de quem navega.
A moda atual é abalroar contêineres semi-submersos caídos de navios, navegando ao sabor das correntes marítimas. O veleiro Vadyo (foto ao lado) passou por isso no Caribe em maio de 2004 sofrendo sérios danos.
O veleiro Brasil1 abalroou uma baleia dormindo na volta ao mundo (Volvo Ocean Race) do ano passado. Um dos tripulantes quebrou uma costela devido ao impacto.
Tem ainda as panes mecânicas, como leme perdido, como ocorreu no ano passado com um Beneteau novo, de bandeira estrangeira, posteriormente rebocado pela Marinha de alto-mar até Rio Grande, onde eu o conheci.
Rede de pesca é outra preocupação para quem navega: o veleiro Lisard (foto ao lado), de bandeira alemã, enroscou uma rede no hélice de tal forma há uns 3 ou 4 anos, próximo a São Simão (Lagoa dos Patos), que tiveram que rebocá-lo a São Lourenço do Sul para retirar a rede. Algumas redes no mar utilizam cabos de aço.
Não são poucos os velejadores que passaram à noite por barcos pesqueiros sem luz alguma acesa. O veleiro Victor passou por vários juntos. Passaram quase uma hora desviando de pesqueiros apagados (do porte deste na foto abaixo, por quem passamos perto). Um tripulante na proa do Victor ia indicando ao comandante onde os pesqueiros estavam, muitas vezes bem próximos à proa.
Na mesma Volvo em que a baleia foi acordada, um tripulante do barco holandês AMRO2 foi varrido do convés por uma onda, à noite. Ele ainda não havia colocado o cinto de segurança. Infelizmente o resgate ocorreu tarde demais. Mas este tipo de ocorrência é raríssimo.
O "inimigo" pode estar na água, no céu, sob forma de tempestades, nas entranhas do barco, ou nas decisões de quem faz a navegação. Um simples saco de plástico pode fazer um veleiro parar no mar, como veremos mais adiante.
A felicidade nem sempre está a sotavento
Isto posto, o que passa na cabeça de alguém a ponto de entrar voluntariamente mar adentro à noite, como fizemos, sujeitando-se a tantos problemas, e justificando tudo isso simplesmente pela busca de prazer?
No meu entender, a resposta é: a felicidade nem sempre está a sotavento. Transcrevo a seguir alguns trechos da crônica "A Felicidade Nem Sempre Está a Sotavento". Sotavento é o lugar para onde vai o vento. Se deixar um barco solto, ele vai para sotavento, levado pelo vento. As folhas secas na rua vão para sotavento. Um fumante a sotavento da gente não incomoda (tanto).
"As pessoas buscam na aventura uma forma de romper com o tédio. Afinal, o homem era inicialmente caçador, o que não deixava de ser uma aventura compulsória em prol da sobrevivência. Mas aí veio a sociedade e a caça foi suprimida. Como a maioria acaba fazendo tarefas monótonas no cotidiano, aquela necessidade atávica - de produção de adrenalina - o força a buscar no tempo livre atividades que o façam reconhecer-se como animal (evoluído) que somos. Ele quer, enfim, sentir-se vivo.
...
Aceitar o mundo como ele vem? Sim, mas só se vier em forma de um temporal e, estando embarcado, já tiver feito de tudo para melhorar a situação. E nesse caso, mais do que aceitar, apreciar o espetáculo da tempestade ao invés de temê-la. Enquanto isso não acontecer, vamos apontando a proa para onde der vontade, independentemente de onde o vento queira levar-nos. A felicidade nem sempre está a sotavento."
Veleiro Feitiço
O Feitiço é um veleiro fabricado em fibra de vidro pela Delta Yachts de Porto Alegre, com 32 pés (9,6m) de comprimento. Seu projeto original foi radicalmente alterado pelo próprio projetista Néstor Volker. A cabine é bem maior do que nos 32 de série. Tem dois lemes, e velame diferenciado. Em vez de quilha o Feitiço tem bolina retrátil. Tem duplo comando (cockpit e cabine) e vários outros itens inusitados.
Tripulação e turnos
O comandante Jorge Zaduchliver reuniu os tripulantes Luiz Luizinho Ungaretti (tático), Sérgio Cutin (proeiro e fotógrafo), e eu (navegador). No final das contas, todos fizeram um pouco de cada atividade a bordo.
Os turnos de seviço, ou "quartos", não eram fixos. Em geral, nos cursos longos a tripulação reveza-se a cada duas ou quatro horas, dependendo do número de tripulantes. No Feitiço os tripulantes revezavam-se mais livremente, de acordo com a disposição e condição de cada um para as diferentes fainas. Eu, por exemplo, assumi o leme aí pelas duas da madrugada da primeira noite, e entreguei pelas 9h. Foi sensacional, incluindo a observação de diversas constelações de estrelas e depois a visão de um baita temporal lá longe que levou horas para se dissipar. E ainda ver o sol nascer, coisa muito rara para mim. Não me agrada isso de dormir 2h e ir para a faina por outras 2h e assim por diante.
Preparação do cruzeiro
Além da revisão e preparação do barco, o que pode levar algumas semanas, há outros itens a providenciar, como os waypoints (coordenadas da rota) e previsões da meteorologia, dentre outros. O barco recebe uma série de cuidados para o traslado, desde linhas de vida, cintos de segurança, revisões, peças críticas sobressalentes, bombonas de óleo diesel de reserva e outros itens não necessários à navegação habitual no rio. O comandante Zaduchliver, que na foto acima veste seu chapéu Perdigueirus, preparou o barco sozinho. Mas isso não é privilégio dele. Volta e meia é assim mesmo. A tripulação só aparece para embarcar, por vezes atrasada, e embarca perguntando a que horas será servida a próxima refeição.
Mas esta tripulação não teve nada disso. Inclusive ficou de olho nas previsões do tempo durante vários dias...
Apesar de termos 3 receptores de GPS a bordo, as cartas impressas estavam todas lá, como garantia (e por obrigação da Marinha).
A espera pelos ventos favoráveis
Para descer de P. Alegre a Rio Grande, espera-se pelos ventos vindos do quadrante norte nesta época do ano, especialmente do nordeste. O rumo nesta perna (ou trecho) é sudoeste. A continuação da viagem precisa de ventos do quadrante sul já que o rumo é nordeste. Os improváveis leste ou oeste serviriam, claro, mas o mais previsível vem de sudeste.
No Verão as frentes que vêm do sul são de menor duração, tornando crítica a definição da data para entrar no mar. Uma frente curta significa a possibilidade de ter que voltar do meio do caminho. Poderá representar pouco tempo para o veleiro alcançar Florianópolis. Vários são os velejadores que no meio do caminho a Florianópolis, ou mesmo quase lá, tiveram que voltar para Rio Grande devido à mudança do sentido do vento. Com um nordestão forte não é possível subir a costa. Vale o mesmo de lá pra cá, quando o nordestão fica "apocado".
O Comte Augusto Chagas conta que quando tripulava um veleiro rumo a Florianópolis, entrou o Nordeste pra valer. Fizeram um bordo lá fora que levou a noite toda, e outro de volta. Quando chegaram novamente à costa, depois de orçar o dia todo, perceberam que não haviam avançado nada. Quando o nordestão entra forte, diz Chaguinhas, tem que voltar logo para não forçar o barco nem a tripulação.
Porto Alegre - Rio Grande
Saímos do Veleiros do Sul no meio da tarde. À noite fundeamos (ancoramos) na Praia do sítio para a janta. O comandante pizzaiolo caprichou nas pizzas. Em seguida entramos na Lagoa dos Patos, onde navegamos a noite toda, sem parar. Lá no sul da lagoa, 100 milhas depois de Itapuã, há um trecho de mais 40 milhas. É o estreito Canal da Feitoria, onde a navegação à vela é difícil. Os pescadores colocaram postes de um lado e de outro do canal. Creio que sejam milhares, conhecidos por "paliteiro". Navegamos a motor no canal.
Da extremidade sul do canal, em frente a São José do Norte, até o Rio Grande Yacht Club são poucas milhas. Ao todo foram 30 horas navegando sem parar, desde a Praia do Sítio, no Guaíba. O veleiro Raio de Luar, do Comte Cylon Rosa Neto (foto acima) fez o trajeto conosco, tendo na tripulação o casal Sérgio Frey e a esposa Magda (veleiro Mantra).
20 nós pela alheta: balanço incômodo
Luizinho lembra que na saída de P. Alegre pegamos um sudeste de 15 nós obrigando-nos a velejar com a vela grande e o motor. O vento aumentou e as ondas também. Tiramos a grande e logo chegamos ao canal do Junco quando resolvemos parar para jantar tranquilamente abrigados na Praia do Sítio.
Uma hora mais tarde seguimos viagem, entrando na Lagoa à noite. O vento em torno dos 20 nós foi girando para ENE proporcionando uma excelente velejada mesmo com o balanço das ondas altas e curtas. Ao amanhecer o vento diminuiu um pouco e passou para NE, assim abrimos uma asa de pomba e seguimos até a entrada da Feitoria, diz Luizinho. Este vento era vento de alheta, ou seja, o vento que atinge o barco entre popa e través, também chamado vento 3/4.
Rio Grande
Após a chegada em Rio Grande brindamos com uma Freixenet bem gelada oferecida pelo Comte Cylon (ao lado). Valeu, MegaCylon, sempre surpreendendo a gente com alguma coisa extra. A simpatia e a receptividade do pessoal do RGYC é notável. Estavam lá o ex-comodoro Guto e o comodoro Luizinho para dar as boas-vindas.
OFeitiço ficou aos bons cuidados do Yacht Club de Rio Grande (foto abaixo, no pôr-do-sol) até que uma janela de sul, de duração razoável, aparecesse. Vento bom para descer a Lagoa dos Patos é ruim para subir a costa até Florianópolis. Viemos de Rio Grande para Porto Alegre de ônibus. Dois dias depois apareceu o vento bom. Não era exatamente uma frente como queríamos, mas resolveria.
Quando a tempestade é bem-vinda
O padrão para subir a costa gaúcha é entrar no mar pela Barra de Rio Grande quando a frente acabou de passar, sujeitando-se à chuva e a ventos fortes. Quando o sul é previsto como de pouca duração, o veleiro deve sair da barra de Rio Grande antes da frente passar. Quando ela chega, normalmente com tempestade, o barco já está a caminho. É botar a cara para apanhar. É uma doideira. Velejador tem que ser mesmo alguém com algo a mais. Ou a menos. Se não, não encararia essas indiadas de primeira categoria apenas para divertir-se. Bota barlavento nessa felicidade!
À cata de previsões e mais previsões
Quando os velejadores estão em Rio Grande à espera de uma frente vinda do sul, a secretária do RGYC sofre. A todo o momento o pessoal quer imprimir as previsões do tempo de diversas fontes para estudar o momento certo de desatracar e enfrentar o mar.
O Rio Grande Yacht Club é o ponto de encontro de velejadores de todo o mundo, a caminho do sul ou do norte. Encontramos lá a tripulação do Canibal e do Victor. Muita conversa de trapiche, troca de informações e planos para subirmos a costa. O comte Jorge fez as compras dos alimentos perecíveis em R. Grande.
Previsão quase correta
Dessa vez não havia uma frente vinda do sul. Os ventos previstos para o dia 13 e para os consecutivos eram confusos e muito variáveis (veja diagrama abaixo), mas predominariam do quadrante sul a partir do dia 14. Fomos a Rio Grande com o NE na Lagoa nos dias 9 e 10/Jan, e subimos no dia 13 com um SE fraco, às vezes Nordeste fraco também, algo parecido com o previsto, embora atrasado em 1 dia. E também quase conforme a previsão, no dia 14 surfamos com mais de 30 nós, e 40 nas rajadas (75km/h). A surfada dá-se quando o barco aumenta de velocidade repentinamente pela ação das ondas.
Sensação esquisita
Entramos no mar à noite, às 00:30h do dia 13, depois de abastecer o Feitiço em um posto para barcos e de passar pelo porto (foto). O Victor vinha atrás de nós, no visual. Do RGYC até a extremidade dos molhes tem umas 12mn. Ao entrar no mar, a distância da praia é maior que 2mn da beira da praia. O balanço do barco muda com as ondas do mar. Em noite sem lua, não se via nada ao redor, a não ser as luzes dos faroletes piscando e de alguns pesqueiros ao longe. De madrugada a lua apareceu para deixar-nos ver um pouco do mar. É uma sensação esquisita entrar no mar sem vê-lo.
Flotilha do Veleiros do Sul no mar
Éramos 4 veleiros atracados nos trapiches do Rio Grande Yacht Club preparados para subir juntos. O Canibal (Delta36) desatracou de Rio Grande umas 9h na nossa frente. Depois o Surfer3. Depois o Feitiço (Delta32), e atrás de nós o Victor (Fast345), todos do Veleiros do Sul de Porto Alegre, e todos com destino a Santa Catarina, menos o Victor que ia para Angra dos Reis. A distância entre cada 2 barcos era o alcance do rádio VHF (6 a 12 milhas), aproximadamente. Raramente tínhamos contato, por exemplo, com o Canibal que navegava lá na frente. As distâncias entre os barcos variava freqüentemente.
Incomunicáveis
Quando quizemos avisar da tempestade vinda do sul aos barcos dos amigos que iam à nossa frente, não tínhamos contato nem pelo VHF nem pelo celular. De vez em quando conseguíamos um ou outro meio de comunicação, mas ali não tivemos condições. O comandante Paulo Hennig utiliza um equipamento a bordo do Charlie Bravo V, que creio seja um repetidor de sinal do celular. Com isso o sinal recebido pelos celulares a bordo é maior e o alcance na transmissão também.
Tempestade no horizonte: 60 nós de vento na madrugada!
Enquanto navegávamos no rumo nordeste, à noite, com Mostardas no través, víamos no horizonte ao sul/sudoeste uma enorme tempestade.
Era uma encrenca poderosa, de uns 30º de extensão no horizonte, em que não parava de pipocar raios. Muita luz clareando breve e consecutivamente dentro daquelas enormes e extensas nuvens. Com isso, via-se perfeitamente o contorno delas, ora em um lado ora no outro. Era uma tempestade elétrica poderosa. A tripulação estava apreensiva.
A pergunta a bordo era uma só: será que ela vem pra cá?
Do mar para a Lagoa
Pelo rádio VHF o Comandante Plinio Fasolo (foto ao lado) chamou o Feitiço. Ele e o Comandante Augusto Chagas, meus amigos, estavam fundeados no Biru, um abrigo no Pontal de Tapes, Lagoa dos Patos, a bordo do veleiroBumerang. Informou que o tempo estava paradíssimo e que o calor era terrível.
Enquanto isso, o Comandante Geraldo Knippling e a Dona Regina, sua esposa, estavam a bordo do Magana amarrado a uma árvore no Arroio Araçá, afluente do Rio Guaíba. A pressão estava muito baixa, observou o comandante.
Em pouco tempo, o sul começou a roncar grosso na Lagoa dos Patos. Era o temporal que vimos "em concentração". Esses amigos experimentaram 60 nós de vento. O cabo da âncora do Bumerang rompeu-se no meio da madrugada mas os dois tripulantes são veteranos e deram conta da situação.
Stress
Só quem já passou por isso tem noção do stress em uma hora dessas. A comunicação é no grito em meio aos uivos do vento. Os caras sobem ao convés descabelados, vestindo as roupas com que dormiam, sem a droga dos óculos e já com frio causado pelo vento forte. É um choque. Tentando equilibrar-se sobre o convés que balança por causa do ventão, meio acordados e meio dormindo, sem saber bem o que fazer, tentam determinar o risco da encrenca. As adrissas batem no mastro freneticamente. É tudo no escuro.
Pela popa do Magana amarrado a uma árvore passaram aguapés e mais aguapés na corrida. O Mestre Knippling disse que nunca viu nada igual dentro do arroio.
Felizmente este temporal não nos pegou. Mas nos assustou bastante. Era algo local, fora das possibidades das previsões meteorológicas.
Único abrigo da costa
Em um traslado como este, o objetivo principal é chegar o quanto antes ao destino, em vez de ficar curtindo a velejada. São 48h de costa e se o vento virar com força, o único jeito é voltar todo o caminho. Na imagem de satélite ao lado, o único abrigo do percurso: Imbituba, mas já a 25milhas da Ilha de Sta Catarina. Vários velejadores gaúchos que subiram ou tentaram subir esta costa tiveram que voltar um bom pedaço ou quase tudo.
Velocidade de cruzeiro
Quando o vento enfraquece, o motor é ligado para garantir uma velocidade de cruzeiro pré-estabelecida pelo comandante. Quando baixávamos de 6 nós velejando, o motor garantia a velocidade de cruzeiro. Navegávamos com o "espírito de lancheiro", como alguém comentou, o que significa chegar logo.
Concorrem para a determinação da velocidade de cruzeiro fatores como horário para chegar ao destino, e a rotação de maior torque do motor com menor consumo, dentre outras. Para o Feitiço são 2.500 RPM. Para o Victor são 2.000. Estas variações fazem com que os barcos naveguem em velocidades diferentes, quando a motor. Velejando, as diferenças de velocidade podem ser ainda maiores.
Translado
O que fizemos, na verdade, não foi um cruzeiro. Fizemos um translado (traslado, dá no mesmo). Levamos o barco de um lugar para outro, com o objetivo de chegar logo, sem apreciar as (raras) atrações do caminho. Foi um transporte. A alternativa (não usual) seria levar o barco de caminhão. O objetivo foi velejar em Santa Catarina.
Aprendizado
O Comandante Andreas Bernauer, do Canibal, (foto acima) adquiriu experiência no mar navegando há alguns anos em um trawler de 60 pés, principalmente na região de Ilhabela. De muda para o Rio Grande do Sul e "convertido" a velejador por aqui, o ex-lancheiro tornou-se um inveterado da vela.
Andreas resolveu contar com auxílio de skippers para a primeira velejada, ida e volta a Florianópolis. Atualmente faz a subida com a esposa e o filho, sem ajuda de profissionais. De vez em quando ainda leva uns sustos, como na última subida na costa gaúcha, relatada a seguir.
Inesperado mergulho noturno
Com o vento nordeste ainda soprando de leve, o Canibal navegava no nosso rumo, mas bem à frente, com a vela grande e o motor. Subitamente, no meio da noite, e há várias milhas da costa, uma forte vibração tomou conta do barco. O motor foi posto em marcha lenta e a trepidação cessou. Engatado o motor novamente, tornou a vibrar. O diagnóstico não era definitivo, mas muito claro: havia algo de errado com o hélice. O comandante Andreas Bernauer teve que encarar a encrenca. Com snorkel, headlamp à prova d'água e cinto de segurança amarrado ao barco, Andreas mergulhou na popa do Canibal. Logo viu um saco branco grande preso ao hélice. Retirou o saco e voltou ao barco para seguir viagem. A operação pode não ter demorado nem 20 minutos. Mas em outras condições de vento e de mar, a solução poderia ter tido outro preço. Imagine a cena a partir da foto acima, quando o comandante já estava com a missão cumprida, com a headlamp ainda acesa. O vulto amarelo atrás do comandante é o inflável, preso aos turcos.
Monotonia
Navegando-se a 5 ou a 10 mn da costa gaúcha, o horizonte é de água por todos os lados. Nos trechos mais próximos da costa, a paisagem, em geral, é monótona. É só areia e rara vegetação no horizonte. Tudo é plano e deserto (imagem do GEarth acima). O que pode fazer diferença é uma velejada com bom vento e boa parceria a bordo.
Atrações no mar
De vez em quando aparece algo para tirar a monotonia como os golfinhos vistos em volta do Victor e do Canibal (foto ao lado) , ou as noctilucas que vimos brilhar nas marolas do Feitiço à noite. Cruzamos de dia por uma enorme colônia de mães d'água. À noite o céu estrelado é fantástico. Curti muito o céu no meu turno no leme durante a madrugada.
"Navegação Astronômica"
Pra evitar a chatice de ficar de olho na bússola o tempo todo, fiz uma navegação astronômica de araque. Mantinha a proa a uma certa distância de uma constelação de estrelas na proa e só de vez em quando consultava a bússola para corrigir o rumo, já que as estrelas vão para Oeste (15º/h).
Susto desnecessário
O Canibal navegava em silêncio, tendo Torres no través, a mais de 5 milhas da costa (limite entre os estados do RS e SC). Daniela, a Imediata do Canibal, estava no leme, sozinha e contemplativa, com aquela típica sensação ao se navegar no mar, de estar longe de tudo e de todos. Repentinamente, sem que tivesse ouvido qualquer outro ruído que não o marulhar no casco do Canibal, Daniela (foto ao lado) ouviu uma buzina muito forte pela popa. Foi um grande susto. Virou-se rapidamente para trás e viu uma lancha com pintura camuflada e vários tripulantes a bordo, quase rente à popa do Canibal. Os caras identificaram-se no grito, dizendo ser patrulha ambiental ou algo do gênero, e perguntaram a ela se havia visto pescadores arrastando rede pelo caminho. A aproximação correta seria posicionarem-se de forma a serem vistos pelos tripulantes do barco alcançado, a uma distância razoável, e sem buzina alguma, claro. Que gente mais despreparada para navegar.
O despertar do mar e dos ventos
Depois de um marasmo de quase 24h com o mar e os ventos bem sonolentos, no meio da segunda noite, o mar resolveu acordar e mostrar algo do que sabe fazer. O vento nordeste fraco virou para norte por uns minutos, foi para o noroeste, e em seguida veio do sul. E veio firme e forte. A faina para alterar as amuras foi crítica, tendo exigido a participação de toda a tripulação. Apenas a genoa (vela da proa) ficou em uso.
Confiando na previsão da meteorologia
O vento nordeste, mesmo soprando apenas por 6h, incomodou bastante, conta Luizinho. Mesmo com fraca intensidade (15 nós na rajada), formava ondas que faziam o barco bater e quase parar. Foi necessário tirar todos os panos para permanecer no rumo, pois confiávamos na previsão da entrada do vento sul, diz o Comte Escape.
Cortina na popa
No amanhecer vimos um mar azul turquesa, ora verde, ora azul claro. Um mar com ondas de 4 metros e vento de 30 nós (40 nas rajadas). Surfar na descida das montanhas de água é imperdível. Adrenalina bombando com toda a genoa desenrolada. Quando o paredão azulão de 4 metros (na estimativa do Comte surfista Luizinho, foto ao lado) vinha chegando rápido e quieto pela popa, trazia uma boa sensação. Era como uma cortina levantada, impedindo de ver o que estava atrás dela.
Surfando a 16 nós
A sensação da chegada da ondona pela popa não dá pra descrever. Quando a onda atinge o barco, ele sobe com ela e em seguida desce até a cava. É nesta descida que a velocidade aumenta bastante. O aumento da velocidade na descida da onda é conhecida por surfada. O barco ganha propulsão extra e desenvolve velocidades recordes, muito acima do que obteria velejando em águas sem onda. Foi em uma destas surfadas que o Feitiço atingiu a marca dos 16 nós, segundo o Comandante Jorge. Foi uma velocidade maior do que o dobro da de cruzeiro.
Casquinha de nozes
Em uma condição assim, vendo só água no horizonte de 360º por horas e horas, o barco era uma casquinha de nozes. É aí que a gente pára para pensar no que está fazendo. Ou nem pensa porque é melhor nem pensar. Uma pane severa por ali daria o que fazer. A imensidão do mar não pode ser considerada em uma hora dessas. É preciso concentrar-se no pedaço de mar que nos rodeia, no céu, e na navegação pelo mar sem horizontes, a não ser o próprio mar.
Tínhamos ainda em torno de um dia inteiro pela frente neste regime. Apesar do acentuado balanço, ninguém enjoou ou ficou mareado em todo o traslado.
Escalas
O Victor, cuja tripulação estava saindo de férias, vinha algumas milhas atrás de nós. Navegaram próximo à costa de Torres,RS (foto ao lado e a dos molhes, abaixo) para dar um oi de longe aos familiares. Na foto abaixo, os molhes do Rio Mampituba. Depois dos abanos, seguiram para Laguna, já à noite. O Victor passou próximo da costa para apreciar as luzes da cidade, em típico ritmo de férias.
Orion, Escorpião e o Cruzeiro do Sul
Timoneei das 2h da madrugada até aí pelas 9 da manhã da primeira noite. Com o passar do tempo, as nuvens foram embora e o céu ficou cheio de estrelas. Aí pelas 4 ou 5 da manhã via-se Escorpião na proa, o Cruzeiro do Sul quase na alheta de boreste e Orion, quase se pondo, na alheta de bombordo. Este cenário é muito difícil de ser visto na cidade, pela falta de horizonte. O mar estava calmo e dava pra contemplar o céu. O nascer do sol é um espetáculo raro para um notívago como eu. Foi só aí que vimos o mar em que havíamos entrado há quase 12 horas antes.
Concurso
Quando o mar engrossou, o Luizinho e o Jorge revezavam-se no leme, em uma espécie de concurso. Cada um queria anunciar a velocidade recorde das surfadas. O campeão foi o Jorge, com 16 nós.
Os waypoints são de confiança?
Nossa rota foi preparada com os waypoints cedidos pelo Comandante Augusto Chagas. Waypoins são as coordenadas (latitude e logitude) de um ponto de interesse. Antes de partir, os pontos são plotados na carta náutica ou armazenados na memória do GPS, para a criação da rota. Rota é o conjunto de pontos, em seqüência.
Chaguinhas é um navegador veterano, associado ao Veleiros do Sul, de Porto Alegre, que já fez muitas milhas Brasil afora e continua fazendo. Ele navegou esta rota RGR-FLO inúmeras vezes. Faz navegação a bordo tanto usando cartas de papel quanto digitais. O Chaguinhas sabe muito bem o que faz.
Um pouco ao norte de Garopaba começamos a querer identificar o próximo waypoint, batizado de CORALW pelo Chaguinhas (carta ao lado). É um ponto de passagem a oeste da Ilha de Coral, onde há um farol que não se via, mesmo com a luneta de visão noturna (night vision) do comandante.
Que dê a Ilha de Coral?
A falta da referência luminosa prevista, e a forma cônica do morro na Ponta da Guarda, entendida como típica de uma ilha, gerou questionamento a bordo sobre o Ponto do Chaguinhas. A Ilha de Coral não aparecia, simplesmente. Nem a ilha e muito menos o farol. Vai ver está pifado...
Apesar de ser uma navegação noturna, tinha um clarãozinho no horizonte, e isso permitia ver o vulto das ilhas.
Não, porque não pode ser ali por isso e por aquilo... Claro que é ali por essa e por aquela razão. Nessa hora é um perigo danado estar a bordo. Trata-se de comparar informações com impressões. Sim, dados podem conter erros, mas impressões são apenas impressões. Esta discussão não tem fim.
É preciso tomar uma decisão logo e a discussão segue com razões que parecem ter fundamento de um lado e de outro. Afinal, pra que lado nós vamos?
O farol fica ao norte da ilha, atrás de um morro de 50m, e não se vê do sul, embora a carta indique que o farol tenha 81m e seja visível a 14 milhas (veja no detalhe da carta ao lado)
A hora e a vez do Comandante
É em momentos como este que vale alguma coisa o posto de Comandante em uma tripulação de amigos. Na verdade, é a pior hora para o comandante. O bom comandante, como o Comte Jorge Zaduchliver (na foto ao lado), não manda nada o tempo todo, deixando a tripulação à vontade (isso depende da tripulação também, claro). Mas na hora que ninguém sabe o que fazer, ou quando as opiniões a bordo são divergentes, é o comandante que tem que ir para o sacrifício de resolver a parada, sabe-se lá com que convicção.
O comandante, que via de regra é o dono do barco, não tem que ser autoritário. Se for, vai perder a parceria na primeira navegada. Comandante não tem que decidir coisas triviais em nome da tripulação como, por exemplo, qual será o cardápio dentre as opções. A tripulação de uma embarcação de recreio é formada por amigos, e o comandante é um deles. Estão reunidos para se divertir a bordo. A princípio, o único "privilégio" exclusivo do comandante de uma embarcação de recreio é pagar sozinho os danos havidos no barco durante a navegada. Pano rasgado, por exemplo, é do departamento do comandante.
Mas em uma situação como a que nos encontrávamos, o comandante tem que decidir e mandar todos calarem a boca. Nem que a decisão seja tomada em função da opinião de um dos tripulantes. E normalmente é.
Psiquiatras a bordo
Jorge é um comandante democrático e soube conduzir a situação com muita categoria. Todos nós já havíamos navegado com ele no Feitiço, e ele conosco em nossos barcos. Ele não havia mandado nada o tempo todo no traslado, trabalhou muito, e sugeriu algo. Afinal, além de comandante, ainda é psiquiatra. Mas a situação a bordo era ainda mais complicada do que parece: o Sérgio (ao lado) também é. Comandante, não. Psiquiatra, mesmo. Aliás, eu e o Luizinho tentamos arrumar a vida deles ao longo do caminho, mas acho que não deu muito certo (apesar deles dizerem que foi o contrário).
Voltando à questão da Ilha de Coral, a decisão tomada pelo Jorge foi apostar no Chaguinhas. Aliás, sábia decisão que tomou (e sem mandar ninguém calar a boca).
Abandonando a rota
Quando nos aproximávamos da Ponta da Pinheira, resolvemos sair da rota (linha tracejada na imagem abaixo) e fundear na pequena Praia de Cima (linha contínua na carta abaixo), na Enseada da Pinheira. Era algo como meia noite e não havia porque seguir e atracar de madrugada no Veleiros da Ilha, em Florianópolis. Estávamos cansados e com sono.
Para quem não conhece uma região, sair da rota planejada e segura, para navegar em águas desconhecidas significa sujeitar-se a imprevistos. Ninguém vai inventar moda numa hora dessas, quase de madrugada, e sair da rota sem que haja uma boa margem de acerto. Pois nós entendemos que ali havia e todos concordaram em arribar da rota. Era contornar a Ponta da Pinheira, fundear e descansar das 48 horas de faina desde Rio Grande. A carta não mostrava parcel no meio do caminho, nem nada. A profundidade era boa. Pra não dizer que não tinha nada, tinha a Laje da Pinheira, mas lá longe, a quase uma milha. Apesar de toda a tecnologia disponível, e dos rumos pelo GPS, a navegação ocorre, às vezes, na improvisação.
Vulto da Ponta da Pinheira
O Feitiço começou então a guinar para bombordo lentamente. Do rumo quase norte fomos guinando para noroeste, para contornar a Ponta da Pinheira.
Os panos foram enrolados (a grande do Feitiço é enrolada dentro do mastro) e seguimos a motor com velocidade reduzida, talvez uns 5 nós.
Na medida em que nos aproximávamos da ponta, víamos o vulto do morro sobre a Ponta da Pinheira. Era quase meia noite, e a paisagem era algo como o desenho escuro aí ao lado, com o vulto da Ponta aparecendo à bombordo. Se V. não enxergar nada, dê mais brilho no seu monitor de vídeo.
Na verdade, o desenho está com mais contraste do que tínhamos, dependendo do seu monitor de vídeo. Estávamos fazendo navegação noturna pelo visual. Visual?...
Mais adrenalina
Mais adiante, com todos nós de olho na proa, apareceu algo estranho na paisagem. Era o vulto de algo horizontal que aparecia da extremidade da Ponta da Pinheira, para a direita, ou seja, de onde o morrinho terminava à beira do mar, para a direita. Era algo baixinho que se estendia no horizonte. Com aquela escassês de luz, ora parecia estar longe, ora parecia estar junto à Ponta. A velocidade foi reduzida ainda mais e começou a discussão: Ta longe. Não ta, é aqui na ponta. Mas olha ali, pô, não ta vendo que é aqui??? Não é, cara!
Mas credo...
Trinta graus a boreste
Chegou a vez do comandante falar. Este treco está na proa, vamos abrir. Trinta graus a boreste!
Trinta graus a boreste. Não se discute mais. Apenas observa-se atentamente. O Feitiço seguiu navegando a uma distância maior da Ponta da Pinheira até que ultrapassamos o "fantasma" e o vimos melhor.
Pedra da boa
Veja o que havia por ali, na imagem de satélite ao lado. A Ponta da Pinheira tem 900m aproximadamente. Destes, 500 fazem parte do morrinho do desenho acima, e era o que foi por nós identificado como sendo a Ponta da Pinheira. O resto da Ponta, ou seja, a ponta da Ponta, tem mais 400m de pedra. Da boa. Não consideramos essas pedras ao sair da rota e nosso rumo apontava para pouca distância da extremidade real da Ponta.
Custos de uma mudança de rota
Não houve perigo para nossa navegação porque ainda estávamos longe da ponta, conforme percebemos ao contorná-la posteriormente. Mas seria conveniente abrir mais, por segurança. Um erro na decisão poderia ter custado caro. Na verdade, não creio que o barco fosse de encontro às pedras porque caso seguíssemos pelo rumo errado naquela velocidade e com aquela atenção, logo em seguida identificaríamos o "fantasma" como parte da Ponta e alteraríamos o rumo ainda com segurança.
Em todo o caso, esta passagem do percurso está sendo contada e ilustrada aqui com detalhes para mostrar a facilidade com que um desvio de rota em região desconhecida pode trazer maus resultados.
Champagne e noctilucas
Contornada a ponta, fundeamos na Praia de Cima. Havíamos feito o percurso de barra a barra em 48 horas (Barra de Rio Grande - Barra Sul). Hora de fazer duas coisas que não se deve fazer lá fora no mar: pipi agarrado à borda e tomar um traguinho. Pipi pela popa fez aparecer noctilucas. O traguinho foi um brinde pelo sucesso do traslado com Freixenet bem gelado (foto). E bem merecido.
Último trecho
Alvorada cedo, café, e última etapa do percurso. Contornamos a Laje da Pinheira, deixamos a Ilha do Papagaio Pequeno e a Fortaleza de Na Sa da Conceição de Araçatuba por bombordo, e em seguida a Ponta dos Naufragados por boreste. Retornamos à rota planejada. Estávamos a 15 milhas do Veleiros da Ilha, em um trecho com alguns parcéis e ilhas a contornar.
Um cruzeiro Nota 10!
A viagem foi excelente. O tempo esteve ótimo, sem chuva, e com temperatura amena. Bons ventos, de modo geral, mar na medida e, acima de tudo, parceria excelente. O barco esteve perfeito o tempo todo, sem nenhuma pane. A alimentação e a bebida a bordo estavam também muito boas.
O clima alegre e descontraído a bordo teve muito a ver com o relacionamento anterior da tripulação. Velejada sem boa parceria não é velejada.
O planejamento minucioso da viagem (dados, informações, preparação do barco) e o alto espírito de cooperação antes da partida e durante o percurso foram também marcantes na empreitada. Meus parabéns ao Comandante Jorge Zaduchliver a quem cabe o sucesso do traslado e a quem agradeço pelo privilégio de ter participado desta tripulação.
Indo adiante
Fomos o último dos 4 barcos gaúchos a chegar. Atracamos quase ao lado doVictor no Veleiros da Ilha. Ele vinha atrás de nós, e passou pela Pinheira no clarear do dia, indo direto ao clube. A tripulação do Surfer3 foi muito simpática e veio nos cumprimentar. O Canibal estava atracado quase na frente do Feitiço. A foto ao lado mostra a vista do cockpit do Canibal. No momento em que soltei minha bagagem no trapiche, já pensando se a volta para Porto Alegre seria por terra ou pelo ar, recebi um convite para embarcar noCanibal e seguir até Porto Belo. Não preciso dizer qual foi minha decisão. Afinal, a felicidade nem sempre está a sotavento.
Sozinhos
Meu reconhecimento aos assim chamados skippers, estes comandantes que encaram o mar sozinhos, levando barcos de um porto para outro, com sol ou com chuva, com ventão ou na calmaria, dia e noite, velejando sem parar. São ao mesmo tempo comandantes, marinheiros, navegadores, proeiros, taifeiros. São corajosos. São sozinhos. |
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Referências:
A milha referida no texto é a milha náutica. 1 milha náutica (mn) = 1.852m =~2km
1 nó= 1,8km/h =~ 2km/h
Os waypoints plotados sobre as cartas náuticas podem não estar na posição correta por imperfeições de calibragem das cartas.
As fotos acima são de autoria de Magda Cirne Lima Frey, Claudia Barth, Victor Scur Barth, Sérgio Cutin e Danilo Chagas Ribeiro. Legendas nas imagens do Google Earth e nas cartas da Marinha pelo Popa.