Encalhando nas pedras. Ou, rasgando o balão na chuva.
Velejar não é só navegar empopado sob céu azul
Claudia Barth

Velejar é uma atividade que envolve sacrifícios e desafios. Mesmo passando por situações difíceis, a gente não desiste e continua velejando ainda mais. Há dias em que a gente pensa: "Era melhor ter ficado em casa!" (só pensa!). Esta é uma história sobre um dia desses, em que tudo parece ter dado errado.

No ano passado (2004), nós, a tripulação do VICTOR, resolvemos participar de um velejaço promovido pelo Clube Náutico Itapuã.

Era um dia chuvoso e o Guaíba estava bem abaixo do seu nível normal. A largada, como sempre, era no farolete da Piava. Fomos os primeiros a nos dirigir ao local. Ficamos circulando naquela área, esperando a chegada dos outros veleiros. Soprava um vento do quadrante norte de fraca intensidade. Decidimos, então, trocar a genoa, substituir a genoa 2 pela genoa 1 , mais adequada para aquele vento.

Estávamos aproximadamente a uns 300 metros abaixo do farolete da Piava, quando o comandante mandou aproar o barco para a troca das velas. De repente, ouvimos um barulhão e o barco parou, ficou preso. Tínhamos, literalmente, encalhado nas pedras da Piava.


A Pedra da Piava, sempre completamente submersa

Num primeiro momento, assustados, não sabíamos o que tinha acontecido. Como é que nós, que temos tradição marinheira, conseguimos encalhar naquelas pedras? Sabíamos da existência delas, mas não da sua localização exata. Além de não termos o hábito de navegar naquele local (sempre navegamos junto à Ponta do Dionísio), se o fizemos, foi com águas mais altas. Aproveitei para marcar o local no GPS. Para nossa sorte, o barco da comissão de regatas estava chegando naquele momento e nos rebocou. Que mico!

Ficamos todos muito chateados e preocupados com o barco. Procuramos por alguma possível avaria. Felizmente, não encontramos nada. Mesmo com a moral baixa e desanimados, não desistimos do velejaço. Com a confusão toda, não trocamos a genoa.

Largamos junto com os outros veleiros e resolvemos subir o balão, para aproveitar o vento de popa. A vela subiu torcida, tinha sido guardada de maneira errada. Como estava chovendo, o balão torcido praticamente colou na genoa, que tinha sido recentemente recolhida. Quanto mais tentávamos desenrolá-lo, mais ele torcia e colava na genoa, até que começou a rasgar. Acabou rasgando de cima a baixo.

O comandante, que estava no timão, na tentativa de desarmar o balão com a sombra da grande, acabou perdendo o alinhamento do canalete (Ponta do Dionísio com a chaminé do gasômetro), e encalhamos várias vezes. Na última encalhada, fomos obrigados a ligar o motor, ou teríamos de ser rebocados novamente. Com o motor ligado, desistimos da regata e conseguimos recolher o que sobrou do nosso balão - uma porção de fiapos coloridos. Que tristeza!

Como não queríamos voltar para casa, decidimos ir até o Sítio, em Itapuã. Quando passamos pela Ilha Francisco Manoel, o motor começou a fazer um barulho estranho. Desligamos rapidamente o motor. Resolvemos, então, retornar e atracar na Chico, o que acabou sendo uma ótima opção. Nós éramos os únicos na ilha, curtindo aquela chuvarada.

Naquela mesma semana, retiramos o barco da água. O único defeito encontrado foi um arranhão na quilha. O motor voltou a funcionar normalmente e o balão foi consertado. As partes rasgadas foram substituídas, não foi necessário comprar uma vela nova. Até que o estrago não foi tão grande.

Velejar, às vezes, é assim, uma sucessão de trapalhadas a bordo, e sabemos que passaremos por muitas mais. Enfrentar situações difíceis é nosso grande desafio.

Claudia Barth é Capitão Am, associada ao Veleiros do Sul, Porto Alegre
Outro artigo de Claudia: Hipotermia a bordo
Saiba sobre o mapeamento da Pedra da Piava.

 

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