Navegando na Argentina
Descendo o Rio Paraná de caiaque
(De Foz do Iguaçu a Puerto Rico, ARG)
André Issi

André Issi já realizou várias aventuras notáveis. Dentre elas, navegou da Lagoa Mirim a Porto Alegre, de caiaque e windsurf. Agora André está descendo por via fluvial desde Brasília até Buenos Aires, de onde pretende vir pelo mar até Florianópolis. De caiaque.
Segue o Diário, de Foz do Iguaçu a Puerto Rico (Argentina).



14/08/05 Domingo dia 58
Acordo cedo, conheco o sr. Claudio, diretor de esportes e ele conversara com o sr, Adauto para transportar o caiaque abaixo da represa. Ele ja fez uma baita viagem de moto, Tomo cafe com a gurizada da vela, lembrei dos tempos do remo em Porto Alegre com o seu Pineda que fazia o mesmo com a gente, voltei no tempo.
Fiquei quase 10 h na internet e volto a noite para o clube.

15/08/05 Segunda dia 59
Fui fazer compras no centro, correios e capitania dos portos
Conheci Nuri, uma menina super simpatica na secretaria de turismo e que me ajudou muito.

16/08/05 Terca dia 60
Passei a manha arrumando o barco e a tarde fui ao centro conversar com Adriana que queria fazer uma materia sobre a viagem, no dia que cheguei no ICLI, ela la estava.
Ela e Mauricio foram super legais, pena que estavam muito ocupados na Camara Municipal, fui conversar com Daniela e Nei que escaneou algumas fotos de viagens anteriores. Eles farao materia para o jornal.
Ficou combinado que no dia seguinte o pessoal da tv Cataratas iria ao clube fazer uma materia.

17/08/05 Quarta dia 61
O reporter Caio e o cameramen, Mariano fizeram a materia por cerca de 2 h enquanto eu remava para la e para ca, Adauto os levou na lancha,
De tarde fui de moto-taxi ate a Argentina, na prefectura naval, depois Aduana, policia federal,
Cara, na receita e muita frescura, querem a nota fiscal de3 tudo, inclusive da maquina fotografica velha... Da um tempo!
Decidi que vou atravessar a fronteira por agua, assim no mais; sem burocracia.
Serei obrigado a ir ate Puerto Iguazu, na Argentina para receber instrucciones e exame da embarcacao.
Quando retornei ao clube fiquei conhecendo o comodoro do ICLI, senhor Ademir que estava em reuniao com os demais membros da diretoria, Ele e super simpatico e diz que posso ficar o tempo que quiser, ressalta que o clube ajuda a todos os que viajam e nao tenho como agradecer a tanta gentileza, amizade e hospitalidade, Meu muito obrigado aos amigos de Foz!

18/08/05 Quinta dia 62
Hoje faz dois meses que sai de Brasilia, foi em 18 de Junho.
O sr. Adauto mostra o projeto que estao desenvolvendo no clube junto as criancas carentes no sentido de conscientizacao ecologica e iniciacao no mundo da vela.
Paralelamente a isto, estao substituindo o bosque de leucenas por arvores frutiferas, E muito bonito, mas ele ressalta que nao e ideia dele, mas de um grupo.
A reportagem saiu no jornal, a Daniela mostrou as coisa por outro angulo, ela captou como eu sinto tudo, o que penso em relacao ao que isto tudo significa e nao so a viagem em si, ficou lindo! Daniela, muito obrigado, adorei!
A reportagem saiu no jornal A Gazeta do Igacu, no segundo caderno.
Uma baita foto da bike ao por do sol nos pampas argentinos em metade da capa e materia de duas paginas com fotos de viagens anteriores e trechos dos diarios... Para mim foi a mais linda de todas as reportagens de outras viagens, e mais ou menos isto que ela captou, varias vidas...
Cada viagem foi uma vida!
Despeco-me de todos, seu Florencio chega; ele vai me levar ate o Iate Clube Cataratas, que fica uns 4 km abaixo da ponte da amizade.
Adriana liga pedindo para Adauto tirar umas fotos para o informativo do clube, quero despedir-me de todos e fico atucanado.
Vamos embora e, depois de enviar a reportagem pelo correio, quase chegando no Cataratas, lembro que o remo ficou num canto e nao veio... Que mico! Que vergonha, ligo para Adauto e peco que envie o remo por um moto-boy!
Seu Florencio vai embora, despeco-me do meu amigao.
Fico no clube conversando com seu Valdir e depois almoco no restaurante dali. O moto-boy demora, resolvo ir no centro e so partir no dia seguinte, pois ja passa das 16 h e nao dara tempo de cruzar a fronteira, burocracia e ainda encontrar local para dormir.
Volto mais tarde e sou apresentado ao sr. Luis Carlos, presidente do clube e que permite que eu passe a noite aqui.
Falo com Adriana, ela foi legal demais, queria vir despedir-se mas sua vida e agitada demais, eu compreendo, um beijao, muito obrigado por tudo!
Iria dormir na rede de Valdir, mas Guilherme deixa eu dormir no assoalho de uma lancha entre dois bancos que esta sob um telhado de zinco com o caiaque ao lado.
Isso e para eu recuperar o ritmo depois de cinco dias de moleza.
Dormi tri bem, ate tirei fotos da minha °cama°!

!9/08/05 Sexta dia 63
Seu Valdir chega cedo e eu ja estou com tudo pronto, o dia esta bom e eu estou louco por mais aventuras!
D. Leoni, esposa de Valdir me da um envelope com santinhos, muito amavel!
Descemos com o jipe a ladeira do clube ate a rampa. Eles se vao, arrumo tudo e entro no caiaque na forte correnteza, sao 8:30 h. Aceno para Dona Leoni no alto da barranca e sigo em frente, antes fiz o sinal da cruz, e uma nova etapa!
Estou euforico demais, parece que a viagem esta iniciando hoje!
Barrancas de uns 50 m, vou seguindo ate que vejo o que parece ser uma falha na barranca da esquerda(Brasil). Ja se passou meia hora, e o rio Iguacu esta ali. Para boreste o marco do paraguai, na proa tenho como alvo o marco argentina e na °esquina° de bombordo uma construcao circular, e o Brasil que so vou rever daqui ha tres meses...
Triplice fronteira! Eu estou vendo pela primeira vez, remando pelo rio Parana em um caiaque desde Brasilia...
Cara! Custa a cair a ficha, que loucura!
Encosto ali para filmar e fotografar, estou emocionado!
Como e bom ser assim, um aventureiro!
Simplesmente estou °voando alto°, quantos que nao sao daqui fizeram isto, vendo as tres fronteiras por agua?
Os caras da receita disseram que a policia federal iria me interceptar se eu cruzasse a fronteira sem autorizacao, vamos ver!
Subo o Iguacu e cruzo para o lado argentino e cerca de 2 km para cima chego em Puerto Iguazu, 8:50 h. Aqui cruzei de bike vindo de Porto Alegre. Antes passei uma noite inesquecivel no mirante da Garganta do Diabo com bicicleta e tudo; foi noite de lua cheia e fiquei olhando as cataratas iluminadas pela lua e tocando minha gaitinha de boca...
Repeti isto na alto da montanha em Machu Pichu, Peru...
Vi as geleiras desabando no sul, noites de lua em plena selva no Rio Amazonas, o Deserto de Atacama, os canyons gauchos, trilhei atraves de sonhos, ate onde fui eu nao sei, mas tenho a certeza de que fiz minha vida ter valido a pena, como tenho esta certeza agora, aconteca o que acontecer!
Uma senhora paraguaia fala que ano passado uma onca devorou um turista nas passarelas onde dormi, deve ter sido uma loira, assim ate eu!
Diz que so encontraram um pe dentro da bota, mais uma para eu me preocupar!
Vou no quartel da prefectura naval e falo com o comandante. Ele solicita que eu informe todos os dias quando chego, quando saio, para nao cruzar para o Paraguai, dormir em destacamentos navais e nao dormir em praias ou matos polis e muito perigoso pelos ladroes e pelos °tigres° (oncas).
Se nao encontro destacamento tenho que ligar pelo telefone 106 ou vhf canal 12 ou 16: caso contrario eles sairao de lancha para me encontrar.
Isto vai contra meu jeito de viajar, mas e como nos tempos de Marinha, o recruta so pode falar tres coisas;
- Sim senhor, nao senhor, quero morrer!
Ou seja terei de informa-los diariamente para evitar gastos para eles.
Isto praticamente me proibe de dormir no Paraguai.
A Argentina e como uma namorada ciumenta e possessiva, nao quer nem que eu olhe para os lados, para a outra...
So se eu colocar pregos nos olhos e ainda assim creio que vao rasgar...
Essa namorada nao passara de dois meses...
Sou levado de carro ao porto e liberad, sao 10:40 h. Finalmente posso navegar. Show!
Aposto corrida com a balsa que vai para o Paraguai e ganho, desci o Rio Iguacu em 10 min e dobro a esquerda (km 1927), olhando mais uma vez as 3 fronteiras.
Estou num estado de euforia que so aumenta enquanto o caiaque gira sem parar pela correnteza forte que forma redemoinhos, esta dificil para manter uma rota em linha reta.
-Soldado, mantenha o curso!
- Impossivel senhor, estamos sem leme, a correnteza e forte e vem de todos os lados. Surgem emergencias de aguas que vem do fundo quando a correnteza bate nas pedras do fundo e sobe, fora as rochas que quase afloram...
- Entao mantenha uma linha torta!
O chefe sempre quer dar uma ordem, nao pode demonstrar inseguranca...
Passa uma hora, a velocidade e boa e vou me acostumando.
As vezes a superficie esta lisa e de repente surge uma emergencia de aguas que faz barulho e assusta, parece um chafariz submerso!
As barrancas estao cobertas de selva e tem uns 50 m.
Tche, e muito louco, quase assusta. Pego a filmadora e deixo o caiaque correr solto e vou filmando enquanto ele desce girando nos redemoinhos, estou maravilhado!
Viajar assim entre dois paises...
Cruzo com um velho navio paraguaio, casas na selva, botes a remo e lanchas de pescadores.
Ha inumeras saidas de pequenos riachos e varias cachoeiras aos lados, e lindo demais!
Selva, selva, selva...
E barra pesada dormir ai, pelas oncas e pelos assaltos que a marinha alertou.
Tenho que chegar no destacamento daqui ha 55 km, mas eu levei tres dias para fazer 50 em Guaira contra o vento e agora so tenho 5 h: acho que nao vou conseguir...
Aqui e tudo estranho, onca e tigre, sucuri e anaconda, escuto galinhas cacarejando em guarani, caes latindo em espanhol...
Apos duas horas vejo uma linda cascata do lado argentino e faco a volta, quero comer algo. O caiaque nao avanca contra a forte correnteza, tento 3 vezes e descubro que junto a margem e melhor para subir.
Encosto e entro no riacho da cascata.
Lindissimas borboletas multicoloridas pousavam em mim e no caiaque. Sento no caiaque para comer:
- Sai dai, tem sucuri!
Subo no barranco:
- Sai dai, tem onca!
Mas que saco, tenho quecomer em pe, de lado para o rio e de lado para a mata.
Se uma onca me atacar o plano e facil: dou uma °gravata° nela e me atiro no rio para afogar a desgraciada: se for sucuri e so usar o punhal.
- E tao facil e eficiente a teoria.
Sigo em frente, ora pelo Paraguai, ora pela Argentina. Passo por Puerto libertad e aviso que vou em frente ate P. Wanda (km 1873) onde chego as 16:30, apenas 3:45 h e fiz 55 km, nao acredito!
Os caras sao super legais, arrumam um trailer e levam o caiaque ate o alto do destacamento, 50 m acima. A vista dali e linda.
E incrivel a preocupacao deles comigo, todos os postos ja sabem que vou passar e se comunicam por radio.
Tomo banho e durmo no alojamento, tratamento nota 10!

20/08/05 Sabado dia 64
Amanhece com neblina nao querem que eu siga. Seguranca e bom, acontece que eu nao gosto disso, ser monitorado, avisar ate quando peido...
Que saco!
Eles contam a estoria da onca, na verdade ela devorou uma crianca.
Estou impaciente peco que me liberem com neblinaa mesmo, queria fazer 100 km em um dia agora o maximo que posso tentar e 84 km...
Parto as 9:15 h, nem tomei cafe, nao almocei ontem e a janta foi aquela sopa...
Sem cafe. pois as coisas estavam no caiaque.
E vou em frente, deslizando entre belissimas paisagens, como e bom ser assim:
- Sou vagabundo eu confesso, curto um rio e as garotas a beira mar...
Este e um trecho de uma musica da Guarda do Embau; e uma das praias mais lindas do Brasil, nao so pelo rio, pelo morro do urubu, costoes com piscina e a praia do maco, mas tambem pela gente jovem, pelo astral de liberdade que rola por ali, e a praia do regae, hip-hop, etc
Muita °fumaca° rola por ali, mas eu nao sou assistente social, nem padre ou medico: nao dou conselhos, cada um que viva sua vida e nao atrapalhe a dos outros, so!
Duas horas depois vejo os silos do lado Paraguaio, ali comeca o °passo fantasma° uma serie de perigosos redemoinhos com centro de 1 m. O perigo e de virar o barco. E uma curva com fortes correntes de varias direcoes que formam corredeiras e redemoinhos.
Entro por ali, evitando os maiores: pego a filmadora e deixo o caiaque girando enquanto vou filmando os menores. Sem eu perceber, fui levado de encontro a regiao dos maiores e nao podia remar pois estava com a filmadora na mao:
- Senhor, estamos cercados!
Surgiram dois enormes remolinos: um por bombordo e outro por boreste.
- Seremos sugados!
- Calma, preparem as boleadeiras!
- Boleadeiras, senhor?
- Sim, arremessem contra essas criaturas em sentido anti-horario!
Cara! O caiaque girava sem parar e a mim so restava filmar e fotografar de cima rezando para que nao virasse.
Agora, que aperta o cutuco, aperta!
Depois de quase 2000 km surge coisas inusitadas, nada se repete!
Cruzo com um enorme navio, aceno para os caras, sao tres lado a lado empurrados por um rebocador contra essa correnteza, nao da para acreditar!
Pior, depois que ele passou o rio ficou cheio de ondas... que nao saem do lugar!
Que loucura!
Almoco a bordo, nao posso parar se quero fazer 84 km. Deixo o caiaque correndo ao sabor da correnteza enquanto como e descanso um pouco.
Coloquei o colete salva vidas nas costas e ficou mais confortavel, pena que esqueci o chocolate na popa. Estou muito mal alimentado.
- Senhor, nao vamos baixar terra?
- Nrgativo, ficamos 5 dias em Foz, temos que recuperar o ritmo.
Apos 3:30 h passo por Puerto Mado(36 km) e sigo reto. Aposto corridea com um bote, passo por lindos lugares no Paraguai, converso com uma turma que toma terere nas pedras onde ha uma lindissima praia de areia. Umas paraguaias lindas perguntam de onde venho enquanto me vou, perturbaram minha alma de pecador.
Finalmente as 17:30 h chego em P. Monte Carlo e os caras da prefectura mandam eu seguir ate um clube de pesca, uns 1000 m para baixo.
Foram 8:15 h direto !
85 Km! Esta bom!
Na marinha nao dizemos esta bom, dizemos:
- Podia ser melhor.
Converso com o pessoal e durmo la embaixo, na praia ao lado do caiaque.

21/08/05 Domingo
Noite de lua cheia e manha de neblina. Estou vendo a altissima ilha de Caraguatay onde tem outro enorme redemoinho no lado argentino.
Depois dela tem as ruinas da casa onde nasceu um tal de Ernesto °Che° Guevara.
Aviso a prefectura que estou saindo e vou com vento contra e chuva.
Nao demora muito e vou °aprontar° para este monitoramento, eu me conheco e sei que isto ainda vai dar mierda! He, he!
Depois para e sigo xingando a mae e os filhos do vento em espanhol ate parar para almocar no paraguai.
Longas retas e muitos redemoinhos. Cheguei em Puerto Rico as 16:30 h, deu 4:30 h remadas para fazer 45 km com vento contra. Deixei o caiaque ao lado do barco deles, levei as coisas para uma casa que sera demolida e onde vou passar a noite na barraca. Caminhei ate aqui no centro da City que e muito bonita e tem um cassino com uma replica da torre Eiffel na frente. Nem descansei, agora sao quase meia noite, tenho que caminhar 2 km e partir amanha de manha,
Deu 5 h de internet.
Um baita abraco amigos!

-o-

24 Ago 2005 Rodrigo Beheregaray
Toca ficha, André!!!
Estamos acompanhando as suas linhas e torcendo por ti!
Fuerza!
Rodrigo - Veleiro Asterix

Trecho Guaíra - Foz do Iguaçu

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