O Farol Cristóvão Pereira
Em obras de manutenção
Danilo Chagas Ribeiro

11 Jul 2004
L
ocalizado na costa leste da Lagoa dos Patos, a meio caminho entre Porto Alegre e Rio Grande, o Farol Cristóvão Pereira está em manutenção.
É o mais importante, o mais alto e o mais antigo da Lagoa dos Patos.

Lampejo de alívio
Quem já navegou à noite sabe da importância de um farol. O navegante vai seguindo na escuridão, orientado por instrumentos, cartas náuticas e outras informações.

Nada se vê adiante da proa. Quem nunca navegou à noite não faz idéia do que seja isso. É preciso saber confiar nos dados que se tem. Embarcações não usam faróis para iluminar o caminho. Mantém-se acesas as coloridas luzinhas de navegação para que se possa ser visto por outros barcos (verde à dir, encarnada à esq, e branca à ré).

Saindo fora do tema relembro que o Gerd, um velejador alemão, me contou que na travessia da europa pra cá ouvia ruídos à noite como se fosse alguém atirando beijos da escuridão. Depois de achar que havia enlouquecido, descobriu que haviam golfinhos acompanhando o veleiro.

Ao determinar-se que o barco está aproximando-se da área de alcance do farol, fica-se de olho na direção em que se presume que esteja, esperando-se a qualquer momento ver a piscada da luz na escuridão. O primeiro lampejo nem sempre nos convence. É preciso ver mais alguns para ter a certeza de que não se está vendo apenas o que se deseja ver.

Mesmo com todos os atuais apetrechos tecnológicos, a luz de um farol é a confirmação mais segura do rumo seguido. É a que traz mais alívio. Não há tela de radar nem GPS que proporcione a enorme satisfação de se enxergar a primeira tênue piscada do farol ainda lá longe. É algo real. Está ali, indiscutivelmente, isto é, não tem bits nem bytes no meio, nem regulagem de ganho de radar, nem a geometria dos satélites do GPS a considerar.
Tá lá ele!!! Ali ó... Espera... Ali!

"84 moirôes de ley"
O mal estado de conservação do farol Cristóvão Pereira vinha sendo objeto da preocupação do meio náutico gaúcho, especialmente de navegadores da Lagoa dos Patos, como Emílio Opitz, de Tapes, que enviou ao site essas photographias do farol, do ano de 1.950.

O Farol Cristóvão Pereira foi construído na mesma época que o da Ponta Alegre, na L. Mirim, e Bujuru, na L. Patos. Segundo o Comandante Carlos Altmayer Gonçalves, o Manotaço, do Veleiros do Sul, o ano de início das obras do farol é 1858. "Em 1859 a torre já estava pronta, e tudo indica que tenha começado a operar em 1886", diz Manotaço, um pesquisador da história da navegação por estas bandas.
Vejam só a pérola que este comandante deu-se ao trabalho de enviar aos visitantes do popa:

"....escavou-se o terreno à uma profundidade a encontrar bastante água, estacou-se com 84 moirôes de lay toda a superfície, sobre os quaes engradou-se com vigas de ley na distância de tres palmos de uma a outra, e depois de incavilhadas encheu-se os entrevallos de pedra secca bem calcada: sobre este engradamento levantou-se a sapata de pedra e cal até 10 palmos, e sobre esta levantarão se as paredes da torre e as das meios águas seguindo sempre com a planta em vista. Acha-se presente esta obra com os arcos fechados do 2º pavimento e a receber o respectivo madeiramento, e a 45 palmos de altura acima do terreno...."
(Correspondência do intendente do estado para o vice-rei no Rio de Janeiro, no seu relatório de atividades de 9/março/1859; 1 palmo = 21cm)

Abrigo seguro
Conforme o Cmte Geraldo Knippling (VDS), autor de livros sobre a navegação no Guaíba e Lagoa dos Patos, em 1.992 o farol sofreu reforma que o desfigurou. Janelas foram fechadas com alvenaria e seus 30m de altura foram caiados de fora a fora. "Uma viagem de Rio Grande a Porto Alegre levava dias, muitos deles parados, à espera de ventos favoráveis. Os fundeadouros de Bojuru e Cristóvão Pereira eram um abrigo seguro..." escreveu o autor de "O Guaíba e a Lagoa dos Patos". O livro fornece carta para acesso e preciosas informações sobre ventos, e para fundeio nas cercanias do farol.

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A casa do faroleiro não existe mais, tendo a operação sido automatizada. As embarcações à vela que transportavam mercadorias e se refugiavam junto ao farol também se foram, mas o farol não deixou de ser importante para a navegação, nem tampouco para a história da navegação no Rio Grande do Sul.

 


Características do lampejo do Cristóvão Pereira: Lp.B.10s 30m 13M
Os faróis e faroletes têm freqüências de lampejo (pisca-pisca) diferentes. Isto ajuda a confirmar que a luz que se vê é mesmo a do farol considerado.

As cartas náuticas mostram as características de identificação de cada farol e farolete, seguindo abreviaturas e simbologia padronizadas. Observe na carta abaixo a notação do Cristóvão Pereira e veja o significado no quadro.
Depois tente identificar as características do farolete mostrado mais ao norte (uma dica: para a Marinha não existe a cor vermelha, e sim a encarnada).



Abreviatura
Significado
Lp. Lampejo curto
B. Luz Branca
10s Período do lampejo (luz e eclipse), em segundos
30m Altitude da luz do farol, em metros
13M Alcance luminoso, em milhas náuticas
(SG) Sem guarnição (sem faroleiro)
Para interpretar símbolos e abreviaturas utilizadas nas cartas náuticas
consulte a carta 12000 da Marinha do Brasil

Em Obras
Manotaço (foto) foi conferir o andamento das obras no farol em 17 de abril de 2004 e escreveu:

Olá pessoal, estive no Cristóvão ontem, Sábado 17/04/2004. Iniciaram as obras de construção do dique de pedras que circundará o farol. O empreiteiro é o com. Ivan, sócio antigo do Rio Grande Yacht Club que empreita diversos serviços para a Marinha. Anexo fotos. As pedras virão das cercanias de Osório, no caminhão que aparece na foto. Será uma carga por dia, total de 90 cargas. Estarei aconpanhando a obra, pelo menos uma vez por mes.
O ruim é que estamos entrando no inverno, estação bem ruim naquelas paragens, ainda mais para uma obra à beira d'água.
Sempre bons ventos,
Manotaço


 


Foto de Geraldo Knippling (23-12-1998), enviada pelo Manotaço

 

Em visita que fez em 10 Julho de 2004, Manotaço relata que o empreiteiro está trabalhando com dificuldade, devido ao inverno e lhe disse novamente que não sabe se haverá verba para fechar os quatro lados.
"Isso seria uma lástima, provavelmente perderia-se o que foi feito, em pouco tempo. Ontem teve uma turma da marinha visitando-o", disse o comandante.

 

 

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