Estrela, Taquari acima

Parte 2 - A eclusa de Bom Retiro do Sul

Barragem e eclusa
O tráfego fluvial na região do Alto Taquari nem sempre era possível. O vapor do início do século passado por vezes não chegava a Estrela por falta de calado.
A viagem terminava em Bom Retiro.
Na foto ao lado a instalação da maxambomba, p/carregar os vapores em Estrela. Era um vagonete que subia e descia pelos trilhos tracionado por burros.


No final dos anos 60 foi construída uma pequena barragem em Bom Retiro do Sul, 22km à jusante de Estrela, elevando a altura do rio em 8 metros. Isso resolveu o problema de calado.
Mas como um barco pode passar por uma represa? Como vencer o desnível?
E os peixes?... Como podem subir o rio para desovar?



Na margem esquerda do Taquari, a represa tem uma passagem para embarcações.
Este tipo de passagem chama-se eclusa. É um poço retangular, de concreto armado, com comportas de aço nas 2 extremidades por onde os barcos entram e, como em um elevador, alcançam o outro nível do rio.
Atrás da comporta que se vê ao fundo, aí ao lado, a água está 8m acima do nível interno da eclusa vazia.
A água entra e sai da eclusa pelo acionamento hidráulico de válvulas. A operação é de responsabilidade de uma concessionária e custeada pelo governo federal.


Marinheiros de primeira "eclusada"
Talvez por causa da pane não tivemos que esperar pelo horário normal da operação da eclusa (a cada 2h). Quando chegamos à barragem a eclusa já estava com as comportas de jusante (rio abaixo) abertas. A luz verde do semáforo autorizava nossa entrada.

No que entramos no poço as comportas foram fechadas. Estávamos encerrados entre aquelas 4 paredes escuras e úmidas que reduzem a luminosidade e favorecem acentuado eco, tornando o ambiente algo estranho. Em seguida o tal cenário começa a ser inundado rapidamente. Em apenas 5 minutos a água já tinha subido 1 metro e meio. A inundação do poço sob pressão torna a água muito revolta. Com apenas um motor funcionando, a lancha estava com dificuldade para manobrar e dançava por causa da agitação da água. Não haviam dois cunhos próximos para a amarração de proa e popa. E caso houvesse, não teríamos atinado da necessidade até a festa começar.

Instalamos as defensas e logo atracamos em um "boneco" como chamam os pontos para atracação (abitas). Em poucos minutos o ponto que utilizávamos estava sendo tapado de água. Passamos a amarra para o ponto imediatamente acima, que logo foi também inundado...

Assim o ponto de amarra foi sendo substituído sucessivamente, sem que se descobrisse maneira mais esperta para imobilizar a lancha. Enquanto isso, tentáva-se a todo o momento evitar que a lancha batesse nas paredes de concreto em meio à agitação da água tão revolta.
Cuidado com a proa. Vai bater na parede!
Olha lá a amarra. Ta quase se soltando...
Cuidado com a popa...
Foi um sufoco de 20 minutos.

Desconfiando que o processo poderia ser algo mais simples, perguntei depois a alguém por ali se nosso procedimento havia sido correto.

- Não, vocês tinham que amarrar na 'bóia flutuante' !

Pouca gramática dele e nenhuma prática nossa. Nas paredes da eclusa há rasgos verticais onde bóias embutidas contendo punho de atracação simplificam a vida dos navegantes. Na volta foi bem mais fácil, até porque a água não se agita no esvaziamento do poço.

Bombas hidráulicas de acionamento elétrico (pela rede, e por geradores próprios em emergências), atuam as válvulas da eclusa nas 24 horas, viabilizando a hidrovia que escoa a produção de grãos da região. Torna-se inoperante somente quando a cota a jusante atinge 8m (desnível da eclusa).

A rede de transporte aquaviário do RGS tem 621km, sendo integrada pela hidrovia do Taquari, Jacuí e Lagoa dos Patos até Rio Grande.



Passagem para peixes
Na extremidade oposta à eclusa, há uma passagem para os peixes que sobem o rio na piracema. Peixes de couro usam uma rampa sinuosa, enquanto que os de escama saltam em uma escada. A pesca é proibida a menos de 200m da barragem onde pescar Dourados seria uma barbada. A PATRAM (Patrulha Ambiental?) tem prendido pescadores com lanchas e caniços, segundo informou o pessoal da operação da barragem. A propósito: não vimos placas alertando a proibição da pesca.