05 Jun 2005
Breves
discursos e continência.
Apitos e bandeiras. Reverência.
Diante do pôr-do-sol, foram as cinzas ao rio.
Início de longa viagem ao mar, sem navio.
Um pouco de pompa e circunstância...
Sim, mas não em abundância.
Foi assim a despedida ao velejador querido e irreverente,
que não era cinza, nem morno. Que era como a gente.
A cerimônia
não teve liturgia,
bem como o László queria.
Foi uma linda confraternização
com o chopp deixado pelo glutão.
Tudo como ele gostava.
Até com o tríplice hip hip... hurra,
que ele fazia até quando velejava.
Apito arrepiante
A assim chamada cerimônia de espargimento das cinzas do László
Böhm ocorreu no final da tarde de 1º de junho de 2005, primeira
quarta-feira do mês, dia do jantar dos Cruzeiristas do Veleiros
do Sul.
László foi Comodoro do clube. E Presidente do Conselho,
também. Nos cruzeiristas, era "o mãe", o que
coordena as reuniões. E foi também Netuno, nos batismos.
Escreveu um livro sobre a história do clube. Além disso
foi diretor do departamento de águas de Porto Alegre e professor
da Escola de Engenharia.
Velejou
bastante, fez muitos amigos. Deixou muitas saudades.
Sob o apito arrepiante do marinheiro,
arriaram as bandeiras no pôr-do-sol. Em seguida, o embarque da
família com as cinzas no veleiro álibi. Navegada
derradeira. E como se precisasse, o pôr-do-sol lá no horizonte
contribuía com ainda mais emoção e melancolia.
Foi muito difícil assistir aquilo quieto.
Lenta viagem ao Mar
O álibi estava todo embandeirado. É "um barco
de pau, e não de plástico", como o László
dizia. O Comandante Átila e a Ilona, filhos dele, como também
a viúva, Athene, estavam lá com as cinzas. Próximo
ao farolete do clube as cinzas juntaram-se às águas do
Guaíba, "que se encarregarão do resto: uma lenta
viagem ao Mar onde mais cedo ou mais tarde todos seguiremos", dizia
a mensagem trazida pelo György, irmão do László.
Alguns amigos preferiram dar o adeus a bordo de seus barcos. Outros,
de terra, junto ao busto do Tamandaré.
250
litros de chope
Diz ainda o texto: "Não fiquem tristes, porque não
há motivos para isto, tudo é natural. Se quiserem, lembrem-se
de mim como eu era: alegre e rabugento, amistoso e irado, tantas vezes
extremado, nunca cinza, morno, ou mais ou menos; talvez com as únicas
virtudes de ser espontâneo e sincero.
Adeus a todos, sigo minha grande viagem ao Mar e não esqueçam
de testemunhar o cumprimento da minha promessa: 250 litros de chope
estão a vossa espera".
Gosto
pelas coisas simples da vida
László foi meu professor nos anos 70. Era daqueles professores
que no início do período letivo, ainda desconhecido dos
alunos, não gerava muito entusiasmo na turma. Ainda mais de uma
cadeira indigesta, como geometria analítica. Mas aquele semblante
fechado e o sotaque carregado guardavam uma ótima surpresa para
quem convivia com ele. Acabava muito querido pelos alunos ao longo do
curso.
O jeito solto e a irreverência, a inteligência e o gosto
pelas coisas simples da vida me faziam admirar muito o László.
Ele tinha uma memória de elefante. Volta e meia conversávamos
no clube ou por telefone. Vez por outra o Mestre, como o chamava, me
passava dicas e conselhos. Às vezes era curto e grosso: "Te
cuida com esse cara. É um filho da...".
"História é
um conjunto de mentiras sobre as quais se chegou a um acordo" (Napoleão).
No retorno do veleiro do comodoro foi servido o chopp do László
na varanda do clube, onde ele tanto gostava de estar. Um audiovisual
com o László contando a história "Porto Alegre
bombardeada por equívoco" foi apresentado. Era a história
gravada com o conhecimento dele para posterior edição
da matéria que publiquei em Fevereiro de 2005. Quem ouvir a gravação
verá que é bem diferente do que escrevi.
Omiti muita coisa. Não porque
o László me tivesse pedido, mas porque pelo tom do livro
dele, era óbvio que não concordaria em publicar aquilo.
Eu me orgulhava muito da confiança que ele tinha em mim.
E eu que sempre fiquei indignado
com a peneira passada nos fatos antes de tornarem-se história,
acabei no rumo de tantos outros. Certamente, ouvindo o László,
vocês compreenderão o porquê.
Protocolo e circunstância
Parabéns ao Comodoro Manfred Flöricke pelo protocolo da
cerimônia, e muito obrigado ao Comte Nelson, Delegado da Delegacia
da Capitania dos Portos em Porto Alegre, por participar e prestigiar
a solenidade.
Levando o László
pra navegar
Já
sem condições de saúde pra velejar por conta própria
e com dificuldade para caminhar, László era levado pelos
amigos para o rio, num gesto muito bonito. Embarcar um amigo que não
pode mais navegar é uma atitude exemplar! Testemunhei pelo menos
3 amigos do László fazendo isso: o Comandante Paulo Hennig
(foto ao lado), no Charlie Bravo V, o Comandante Niels Rump,
no Haithabu, e o Comandante Reneu Ries, todos amigos e companheiros
do László no Veleiros do Sul.
Danilo.
Áudio
Ouçam a história
contada pelo László
Para ouvirem a história original "Porto Alegre bombardeada
por equívoco" em um português maravilhosamente errado
e desbocado, cliquem COM
A TECLA DIREITA do mouse, e optem por "Salvar Destino Como".
A qualidade do áudio é bem boa, mas a das imagens não,
devido à compactação para publicar na Internet.
São 5MBytes.
Video
Cenas
da cerimônia
Aqui vai um vídeo de 6 minutos com passagens da cerimônia.
As cenas do álibi com os familiares e amigos levando as
cinzas do László, contra o pôr-do-sol, são
as mais bonitas. E também as mais tristes. Cliquem COM
A TECLA DIREITA do mouse, e optem por "Salvar Destino Como".
São 12MB.
Adeus,
amigos Leia isto!
László,
por Vidal, Jorge Vidal
László,
o homem que "somava"!, Astélio J Bloise dos Santos
László:
histórias de varanda, Carlos Altmayer Gonçalves
Vendo
a lua nascer quadrada, László Böhm
Não
foi lavrada a ata!, László Böhm
Porto
Alegre bombardeada por equívoco, László Böhm
A
família do László concordou com a divulgação
deste material, sem o que jamais seria publicado.
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