Ilikai - o relato do tripulante
Pablo Gatto conta sobre o resgate
Danilo Chagas Ribeiro
27 Jun 2008
Em mensagem acompanhada de boa dose de emoção, Pablo Gatto, o velejador que tripulava o veleiro Ilikai abandonado em 30 de maio passado na costa gaúcha, contou ao Popa como ele viu a situação e as dificuldades da operação de resgate em decorrência do acidente que deixou o comandante fora da faina.
Leia abaixo as informações passadas por Pablo, em tradução livre.
Estado do mar
40 nós de vento e ondas de 4 metros.
Estado do barco
Genoa rasgada e as duas escotas cortadas; trinqueta a ponto de rasgar-se, com uma escota a ponto de romper-se. Adriça da vela grande enredada na cruzeta e adriça sobressalente cortada; catraca e cunhos de bombordo arrancados; piloto automático em pane; eletrônica funcionava toda; bomba de porão expulsando água que entrou pela escotilha.
Estado da tripulação
Os tripulantes estavam exaustos e sem dormir há mais de um dia, molhados e mal alimentados.
Comandante Miguel Del Río teve duas costelas fissuradas às 5 da manhã de 30 de maio, estava molhado e prostrado no piso, gritando de dor nas sacudidas do veleiro. Havia risco de perfurar um pulmão, artéria ou outro órgão. Princípio de hipotermia. Pablo Gatto estava muito bem, sem nenhum dano físico.
"Si mes ves bien en la foto (ao lado) es por la alegría de haber salvado a Miguel, luego de haber llorado un rato de tristeza por haber tenido que dejar solo al ILIKAI".
Some-se a isso um grau de excitação e adrenalina pela tensão de ter timoneado por mais de 6 horas e ter que atracar a um navio de 160m com vento e ondas, como se vê no vídeo.
Pablo havia embarcado no Ilikai há 5 dias e não conhecia todos os detalhes do barco. Era necessário "maña e fuerza" para realizar a faina sozinho, como para dar conta das velas com 40 nós de vento.
Experiência de Pablo
Navega desde os 12 anos. Timoneiro e comandante do veleiro Vela y Motor há 8 anos. Velejou em mais de 20 veleiros, de Laser a 49pés. Conhece todos os portos uruguaios e vários de Buenos Aires. Navega em lancha no Delta do Rio de la Plata (navegação de recreio). Tripulante de regatas no Rio de la Plata. Quatro travessias BsAs - La Paloma (Uruguai). Viagem em um 43 pés de San Isidro à Terra do Fogo (1800mn com ondas de 8m e ventos com mais de 50nós). Agora em Maio veio de BsAs a Rio Grande no veleiro Tequila e de lá seguiu no Ilikai.
"Como te darás cuenta sé lo que es un velero y lo que es navegar con tiempos duros, muchos peores que los vividos el 30 de mayo. Manejo bien toda la electrónica, GPS, OzzyExplorer, radar, vhf y muy poco BLU, timón automático y timones de vientos varios", disse ainda Pablo.
A manobra
Pablo disparou o mayday a pedido do comandante. A comunicação por rádio com o navio Kickapoo Belle se deu em inglês, combinando velocidade e rumo. "Te imaginas como estaba Miguel a los gritos de dolor dentro del velero.". Durante a manobra de atracação, um cabo de aço jogado do navio enganchou-se em Pablo que foi arrastado pelo convés. Um dedo da luva foi rasgado. O VHF portátil foi perdido nessa manobra. "Todo esto ocurría a una tremenda velocidad de maniobra".
O veleiro ficou a meia-máquina (5 nós) para que Pablo pudesse pular para a escada do navio (foto ao lado). O timão estava livre e o barco foi abandonado depois de consulta ao dono. Foi avaliada a possibilidade de rebocar o Ilikai, mas foi considerada impossível e julgaram que o barco afundaria. Segundo Pablo, não havia onde fixar uma amarra no veleiro para o reboque até Rio Grande a mais de 10 nós, como navegam habitualmente os navios mercantes.
"O mar não é para sermos heróis"
"Soy franco contigo, yo no me sentía con ánimo de continuar solo en esas condiciones de mar, cansado, mal comido y estresado al límite, con el barco dañado en su maniobra. Temía que algo peor me podría pasar, ya te lo digo: el mar no es para que nosotros seamos héroes, lo hacemos por placer y deporte. Si las cosas salen mal hay que aceptarlas, de los errores propios aprendemos; y podemos contarlo".
Queda todo aclarado y manda un saludo mío a los navegantes del Sur de Brasil.
Algún año intentaré nuevamente alcanzar Florianópolis y quizás llegar a la soñada Rio de Janeiro desde mis latitudes.
un abrazo desde Buenos Aires
Ing. Pablo F. GATTO
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Fotos: Glenn Escalera
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